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14.4.23

Tráfico de pessoas em Portugal ligado ao trabalho agrícola sazonal no Alentejo e Oeste

Por Lusa, in Rádio Pax



O tráfico de pessoas em Portugal, que está a aumentar, está ligado ao trabalho em campanhas sazonais agrícolas em locais de difícil acesso no interior alentejano e na zona oeste, o que dificulta a fiscalização, segundo um relatório.


A caracterização do tráfico de pessoas em Portugal consta do Relatório Anual de Segurança (RASI) de 2022, que dá conta de um aumento do número de presumíveis vítimas sinalizadas para 378, mais 60 do que em 2021.

O documento, aprovado pelo Conselho Superior de Segurança Interna e entregue na Assembleia da República, refere que o tráfico de pessoas continua a estar “muito ligado a angariação e recrutamento para trabalho em campanhas sazonais, como apanha da azeitona, castanha, frutos ou produtos hortícolas” e as vítimas são levadas para os locais das explorações agrícolas, onde passam a trabalhar e a residir e a depender “totalmente da vontade dos empregadores”.

As vítimas, que possuem “escassos recursos económicos” e se encontram “em estado de vulnerabilidade”, são colocadas a trabalhar geralmente em locais situados no interior alentejano ou na zona oeste do país, “com difíceis condições de acesso, dificultando a fiscalização”.

O RASI sublinha que tem vindo a ser exposto um esquema de exploração laboral relacionada com cidadãos moldavos, uma vez que os titulares de passaporte biométrico estão isentos de obrigatoriedade de vistos para fins de turismo.

O documento relembra também o caso dos cidadãos de Timor-Leste que chegaram ao país na segunda metade de 2022 para encontrarem trabalho em Portugal ou conseguirem entrar no Reino Unido, mas grande parte dos timorenses não conseguiu alcançar aqueles objetivos, acabando por ficar em situações de “extrema vulnerabilidade e com a necessidade urgente de apoio por diversas instituições nacionais de solidariedade social”.

De acordo com o RASI, no ano passado foram sinalizados 378 presumíveis vítimas de tráfico de seres humanos, mais 60 do que em 2021, continuando Portugal a manter-se como país de destino.

Apesar de não existirem vítimas confirmadas no contexto da guerra na Ucrânia, tendo em conta o risco global de um possível acréscimo de presumíveis vítimas de tráfico de seres humanos, encontram-se registadas nove sinalizações que se reportam a presumíveis vítimas, maioritariamente ucranianas, em alegada exploração laboral.

A maioria das presumíveis vítimas de tráfico de seres humanos sinalizadas em 2022 era para fins de exploração laboral, principalmente no setor agrícola, mas também no futebol e em servidão doméstica.

O documento refere ainda que no ano passado foram sinalizados 26 menores, valor igual ao registado em 2021, e 329 adultos, mais 56 do que em 2021, além de 11 portugueses identificados no estrangeiro que alegadamente foram vítimas de tráfico de pessoas.

A maioria das presumíveis vítimas sinalizadas em Portugal são homens, com uma média de idades de 32 anos, oriundos do Nepal, Índia, Marrocos, Argélia, Brasil e Roménia.

Rádio Pax / Lusa

6.4.23

O missionário que trava “uma guerra” contra a pobreza em Loures

Luciano Alvarez (Texto) e Maria Abranches (Fotografia), in Público


No seio de uma miséria atroz em pleno século XXI e numa altura em que os bairros de barracas se voltam a mostrar em força, há quem dedique a vida a ajudar os mais pobres entre os pobres.


Celebrou-se há pouco mais de uma semana os 30 anos do Programa Especial de Realojamento (PER), que muitos dizem ter acabado com as barracas em Portugal. Na verdade, nunca acabou totalmente com elas. Com a pandemia e com a actual crise financeira, os bairros de “casas” de zinco, madeira e plásticos voltaram a estar à vista dos portugueses em vários pontos do país e cada vez em maior número. Uma demolição de barracas no início deste mês na freguesia de Camarate, no concelho de Loures, trouxe mais uma vez esta realidade para a actualidade noticiosa.

Em Dezembro de 2021, o programa 1.º Direito, para acesso à habitação por pessoas carenciadas que vivem em condições consideradas indignas, revelava que já existiam mais de 38 mil famílias identificadas por 124 autarquias, segundo dados do Ministério da Habitação.


Segundo a Câmara Municipal de Loures (CML) revelou ao PÚBLICO, “estão identificadas no concelho aproximadamente 500 construções abarracadas”. Em 2022, a autarquia mandou demolir 21 e já este ano 20. O património municipal habitacional é actualmente composto por 2447 fogos e nos últimos três anos foram submetidos 1100 pedidos de apoio habitacional.

Nestas “construções abarracadas” vivem os mais pobres entre os pobres, famílias inteiras que, mesmo tendo emprego, não têm dinheiro para sequer arrendar um pequeno quarto. Mas há uma boa notícia: no meio desta terrível miséria, há quem dedique a sua vida a ajudar os que nada têm.


José Duarte, 57 anos, ficou conhecido quando, no início deste mês, a CML ordenou a demolição de três barracas no Bairro do Talude. No meio de gritos e choros de revolta, ele foi a voz calma que falou para diversos órgãos de comunicação social a pedir que se respeitasse as pessoas e que sejam encontradas soluções que as tirem das miseráveis “casas” de chapa e zinco que não param de crescer no concelho.


Dar todo o tipo de apoios aos que mais precisam tem sido a sua vida, e com tarefas muito difíceis. Em 1995 foi em missão para a Colômbia. Regressou em 2002, mas pouco tempo depois voltou. Ficou no país sul-americano, que viveu anos de intensa guerrilha, até 2016.


Ao longo de todos esses anos apoiou pequenos e pobres agricultores que eram obrigados pelos cartéis da droga a plantar as papoilas para a produção de cocaína. “Eu próprio as plantei, e raspei muita coca. O trabalho era esse, não havia outro remédio”, conta, mostrando um sorriso parecido ao de uma criança que recebeu um doce.

Outra das tarefas difíceis que teve na Colômbia foi dar apoio a reclusos nas prisões de alta segurança do país. “Era complicado. O consumo de droga era altíssimo, havia nuvens de fumo em todo o lado. Ainda hoje, quando alguém está a fumar droga, eu detecto o cheiro a grande distância”, conta.

A paróquia do povo

Há quase oito anos regressou a Portugal. Optou por não trabalhar em nenhuma paróquia. O trabalho na rua, junto das pessoas que menos têm, foi a opção de vida deste homem nascido na Lourinhã. “A minha paróquia é o povo. Eu não cabia noutra paróquia que não esta”, afirma.


O irmão José Duarte recebeu os jornalistas do PÚBLICO num rés-do-chão da Rua do Comércio na freguesia de Camarate. Um espaço amplo, com algumas paredes “forradas” de livros, e mesas e cadeiras, algumas destinadas a crianças espalhadas pela sala principal. É a sede da associação sem fins lucrativos “para a cidadania em desenvolvimento” Jovem Despertar. Um espaço “com personalidade jurídica, canónica e civil da iniciativa dos institutos dos Missionários Combonianos do Coração de Jesus e Irmãs Missionárias Combonianas, em colaboração com a Paróquia de São Tiago de Camarate.

Resumindo: uma associação que tem como objectivo principal dar todo o apoio possível aos mais pobres. E pobreza é o que não falta nesta freguesia e em muitas outras do concelho de Loures. Um sinal dessa miséria é dado pelas barracas que os visitantes que percorram as suas estradas podem avistar em vários locais.

“Uma vereadora da Câmara de Loures disse-me recentemente que existem cerca de 500 barracas no concelho. Não acredito. São mais de 2000. E com a pandemia e agora com a crise, não param de crescer. Constroem-se barracas quase todos os dias. As pessoas, mesmo as que trabalham, não têm outra solução para viver”, assegura.


Uma das tarefas da Acreditar, fundada há cerca de 12 anos, é receber todos os dias da semana jovens estudantes que terminam as aulas por volta das 16h, mas cujos pais só chegam a casa por volta das 19h, ou mais tarde. Ali estudam, com o apoio de professores, brincam e, se necessário, recebem ajuda clínica com o apoio de médicos. “Evita-se que as crianças fiquem ao abandono na rua várias horas. Há aqui mães que saem de casa às cinco da manhã, muitas delas para o trabalho nas limpezas, e só voltam às 20h, depois de terem trabalhado em três casas num só dia. E mesmo assim não têm dinheiro para arrendar um quarto ou uma casa”, diz o missionário.

Lutar para sobreviver

José Duarte garante que hoje não se consegue arrendar um pequeno apartamento na freguesia de Camarate, e “muitas vezes em péssimas condições de habitabilidade, por menos de 500, 700 euros com recibo de renda”. “Sem recibo fica entre os 400 e os 500 euros, mas aqui é quase tudo sem recibo. É tudo ilegal. E os quartinhos ficam mais ou menos aos mesmos preços. E depois gera-se toda uma cadeia de ilegalidades feita por pessoas que se aproveitam de quem luta pela sobrevivência. Sim, muitas das pessoas que aqui vivem lutam para sobreviver”, acrescenta com um semblante muito triste. “Sim, fico muito triste quando falo disto porque não vejo solução para estes problemas.”


Lutar para sobreviver

José Duarte garante que hoje não se consegue arrendar um pequeno apartamento na freguesia de Camarate, e “muitas vezes em péssimas condições de habitabilidade, por menos de 500, 700 euros com recibo de renda”. “Sem recibo fica entre os 400 e os 500 euros, mas aqui é quase tudo sem recibo. É tudo ilegal. E os quartinhos ficam mais ou menos aos mesmos preços. E depois gera-se toda uma cadeia de ilegalidades feita por pessoas que se aproveitam de quem luta pela sobrevivência. Sim, muitas das pessoas que aqui vivem lutam para sobreviver”, acrescenta com um semblante muito triste. “Sim, fico muito triste quando falo disto porque não vejo solução para estes problemas.”


José Duarte diz que, desde que chegou a Portugal, tem dedicado parte do seu tempo a perceber como as barracas chegaram ao concelho de Loures. Conta que tudo terá começado nos anos 1960, “quando os primeiros ‘imigrantes’ eram os portugueses”: “Gente que vinha de todo o país trabalhar para Lisboa e que, sem poder arrendar uma casa, construía aqui uma barraca, até porque muitos vinham trabalhar para as fábricas de loiça de Sacavém e para as obras.”

Essas barracas são hoje muitas das casas térreas e até prédios de três e quatro andares que ocupam uma boa parte da freguesia. Ainda hoje são quase todos ilegais. “As pessoas vivem lá há anos, mas eles nunca foram registados. Só nas freguesias de Camarate e da Apelação há 28 bairros destas casas e prédios ilegais. E há muita gente que enriqueceu à custa deles”, salienta.


Já nos anos 1970 e 80 “começaram a chegar em massa os imigrantes estrangeiros”: “Vinham essencialmente de São Tomé, Guiné e Cabo Verde. Vinham trabalhar para as obras e muitos deles construíram a Ponte Vasco da Gama e a Expo’98."


Segundo conta José Duarte, a seguir “começaram a chegar os cidadãos do Brasil”, e “o número de barracas sempre a aumentar, embora tivessem sido construídos alguns bairros sociais”. Ultimamente, diz que chegam ao concelho cidadãos do Bangladesh, da Somália e muitos da Índia: “Continuam também a vir pessoas dos países de língua portuguesa, especialmente da Guiné, que vêm fazer tratamentos médicos graças a protocolos entre os países que têm o apoio da embaixada por dois, três meses, e depois ficam ao abandono. Não têm emprego e constroem uma barraca.”


Mas como é que gente que nada tem consegue arranjar dinheiro para comprar meia dúzia de chapas de zinco e alguma madeira para levantar uma barraca? José Duarte explica: “Estas pessoas são muito solidárias. Ajudam-se umas às outras, uma dá uma coisinha, outra também dá uma pequena ajuda. Depois também há muito lixo espalhado pelos campos que dá para construir uma barraca.”

“A cor da pele ainda conta”


Um dos factos que espantaram o missionário quando regressou a Portugal foi o racismo que diz existir no país. “Há muito racismo, pensei que isso já não existia no nosso país, mas há. A cor da pele ainda conta. E há também muita exploração laboral e muita violência.”

A miséria em que as pessoas vivem, a falta de trabalho, os baixos salários, a falta de casa “e muitas vezes a fome” levam José Duarte a repetir o que já tinha dito no Bairro do Talude no início do mês: “Aqui vive-se uma guerra. O que é uma guerra? É uma situação em que uma pessoa está muito limitada e está sob enorme pressão. É o que estas pessoas estão a viver.”


Uma situação, acrescenta, “em que as pessoas estão a viver no limite”. “Nota-se nas crianças, que estão cada mais violentas, mais tensas. Não sou só eu que o digo, são também os médicos e os professores. Sente-se também nas pessoas que estão nos bairros sociais, que se transformaram em guetos porque foram mal pensados. Há tensão entre as diversas etnias. Isto é um barril de pólvora que pode rebentar a qualquer momento”, alerta.

José Duarte acredita que não vão ser os políticos que vão acabar “com esta guerra”, porque diz que “eles vivem numa democracia, mas desconhecem ou ignoram a democracia em que vivem estas pessoas”: “Têm de ser as pessoas a resolver. A sociedade civil tem de se unir e lutar para resolver este problema. Tem de se ouvir as pessoas que estão no terreno.”

“Não basta dar uma casa”

Quanto à problemática das barracas e das casas degradadas, o missionário diz que “não basta dar uma casa num bairro social: “Tem de se formar as pessoas, até ao nível da gestão económica, e de as acompanhar. Tem de se dar casas de acordo com a sua vivência. Mas, muitas vezes, dá-se uma casa com uma renda simbólica, mas esquece-se que também tem de se pagar a água, o gás e a electricidade, que, quando moravam numa barraca, não pagavam, e agora não conseguem pagar à casa. Conheço pessoas que eram mais felizes quando viviam numa barraca.”


Diz ainda que tem de se conhecer a realidade de cada pessoa a quem se dá uma casa. E cita vários maus exemplos, como uma mãe que tinha um filho paraplégico e “foi colocada num nono andar de um prédio que tinha o elevador quase sempre avariado. “O seu filho acabou por morrer.” Ou o do homem que vivia no sétimo andar do mesmo prédio “e que tinha de ter assistência permanente de oxigénio”. “Também morreu no prédio.” Ou, por último, o da mulher “que vivia do material que apanhava para vender para reciclagem, que também teve uma casa nova, mas não lhe deram um espaço para guardar o material que ia recolhendo”.

Fala com tristeza por não ter ele próprio uma solução para acabar com “esta guerra”, mas diz que, “como homem de fé, um dia será possível” resolver este problema. “Tem de ser, afinal somos todos irmãos.”

José Duarte despede-se dos jornalistas do PÚBLICO convidando-os a visitarem a associação na manhã de sábado: “É o dia em que distribuímos cabazes alimentares pelas famílias mais carenciadas. Um dia em que pessoas de vários credos fazem orações em conjunto. É um dia de alegria.”

5.7.22

Penas entre 12 e 17 anos para padre e 'freiras' por escravizarem noviças em Famalicão

in DN

Os crimes foram cometidos durante cerca de três décadas na Fraternidade Missionária de Cristo Jovem, instalada num convento em Requião.

O Tribunal de Guimarães condenou esta sexta-feira a penas entre 12 e 17 anos de prisão um padre e três responsáveis de uma "associação de fiéis" de Requião, em Vila Nova de Famalicão, distrito de Braga, por escravizarem noviças.

O padre Joaquim Milheiro, com cerca de 90 anos, e as arguidas Maria Arminda Costa, Maria Isabel Silva e Joaquina Carvalho, hoje com idades entre os 70 e os 75 anos, estavam acusadas de nove crimes (nove vítimas, à data dos factos com idades entre os 12 e os 20 anos) de escravidão, incluindo a escravidão laboral.

Maria Arminda Costa foi condenada a 17 anos de prisão, o padre Joaquim Milheiro foi condenado a 15 anos de cadeia, enquanto a Maria Isabel Silva e a Joaquina Carvalho o tribunal aplicou as penas de 14 e de 12 anos de prisão, respetivamente.

"O tribunal deu como provado, no essencial, os factos que constam da acusação [do Ministério Público]", disse a presidente do coletivo de juízes, Paula Sá, durante a leitura do acórdão.

A juíza presidente falou em "clima de terror e medo", em "agressões bárbaras" cometidas pelos arguidos, assim como de "escravidão e de crimes hediondos praticados por alguém que se diz representante de Deus na terra", os quais levaram à total "exploração e desumanização" das vítimas, que não recebiam "qualquer tipo de contrapartida", permitindo à fraternidade aumentar o seu património na modalidade de "poupança de custos".

Os crimes foram cometidos durante cerca de três décadas na Fraternidade Missionária de Cristo Jovem, instalada num convento em Requião, concelho de Vila Nova de Famalicão, distrito de Braga, pertença do Centro Social de Apoio e Orientação da Juventude, uma Instituição Particular de Solidariedade Social sob a forma de Instituto de Organização Religiosa.

15.6.22

Migrantes continuam a viver sem condições em Odemira

in SIC



 https://sicnoticias.pt/pais/migrantes-continuam-a-viver-sem-condicoes-em-odemira/





Migrantes continuam a viver sem condições em Odemira





Governo anunciou medidas em 2021 mas mais de um ano depois, pouco mudou.


Há um ano que se fala na falta de condições a que os imigrantes da região de Odemira estão sujeitos. O Governo anunciou medidas para tentar resolver os problemas e várias fiscalizações foram feitas, mas, 13 meses depois, foi pouco o que mudou nas condições de vida destes trabalhadores estrangeiros.

Em Odemira, em 2021 um surto de Covid-19 expôs os problemas relacionados com a população de migrantes estrangeiros que habitavam e trabalhavam na região.

Um ano após este caso ser público, o presidente da Câmara de São Teotónio diz que existem menos pedidos de atestado de residência, mas garante que essa é a única diferença em relação ao ano anterior.

Muitos são aqueles que ainda hoje habitam em pequenas casas, anexos, ou até mesmo estabelecimentos comerciais desativados, sem qualquer tipo de condições e, em muitos casos, sobrelotados.

Em 2021, o Governo aprovou a construção de alojamentos temporários para estes trabalhadores mas até que as obras arrancassem passaram mais de oito meses. Estas instalações nada mais são que contentores colocados nos terrenos das propriedades das empresas.

Até ao final do presente ano é esperado que 2.000 trabalhadores estejam devidamente instalados em alojamentos provisórios e mais mil deverão, no próximo ano, ter um local com as devidas condições para habitar.

Os migrantes continuam a chegar em grande número ao território nacional o que se traduz em muita procura para pouca oferta.


Muitos dos que chegam a Portugal são sujeitos a exploração laboral e ao pagamento de valores elevados aos intermediários que os trazem para o país.



A Associação de Horticultores, Fruticultores e Floricultores dos Concelhos de Odemira e Aljezur já tem um protocolo com a Organização Internacional das Migrações para travar este problema com os intermediários que se aproveitam e exploram os migrantes.

Juízes e procuradores portugueses precisam de mais formação em tráfico de seres humanos, defende relatório

Patrícia Carvalho, in Público

Esta é a terceira avaliação do Grupo de Peritos em Acção contra o Tráfico de Seres Humanos do Conselho da Europa à forma como Portugal está a aplicar a convenção sobre esta matéria, a que aderiu em 2008.

Em Janeiro de 2020 dois menores de 6 e 15 anos foram repatriados para Angola, por ordem de um tribunal de família português, enquanto ainda decorria uma investigação sobre se as crianças tinham sido alvo de tráfico de seres humanos. Num outro caso, envolvendo mais de 50 alegadas vítimas de tráfico humano para exploração laboral, em Beja, o juiz decidiu deixar cair a acusação de tráfico, considerando que se estava perante imigração ilegal, o que impediu que as vítimas pudessem aceder à compensação prevista no primeiro caso.

Estes são apenas dois exemplos apresentados no mais recente relatório do Grupo de Peritos em Acção Contra o Tráfico de Seres Humanos (GRETA), que levam esta organização do Conselho da Europa a recomendar que Portugal invista mais na formação de todo o sistema legal, para as questões relacionadas com esta temática. O terceiro relatório de avaliação à aplicação da convenção contra este crime, de que Portugal faz parte desde 2008, saúda uma série de avanços conseguidos pelo país, mas deixa também um conjunto de recomendações para áreas em que é preciso fazer mais e melhor, como a formação do sistema legal, uma maior capacidade para identificar as vítimas deste tipo de crime e de levar os perpetradores à justiça e também mais garantias para que as vítimas tenham acesso (e de forma atempada) a todos os direitos que lhe assistem, nomeadamente, apoio jurídico e uma indemnização.

3.5.22

MP abre inquérito após denúncia de imigrantes escravizados em Serpa

in DN

O Ministério Público (MP) abriu um inquérito após ter recebido um auto de ocorrência da GNR relativo a uma publicação numa rede social que denunciou a alegada existência de 200 imigrantes moldavos escravizados em Serpa.
Fonte da Procuradoria-Geral da República disse à agência Lusa que o MP recebeu um auto de ocorrência da GNR relativo a uma publicação numa rede social, "o qual deu origem a um inquérito", que está em fase de investigação.

Já a GNR informou que "não tem registo de denúncias ou de ocorrências" na zona de Serpa, no distrito de Beja, "relacionadas com o descrito" na publicação na rede social Twitter.

No entanto, a GNR "teve conhecimento" da publicação, a qual enviou para o MP, por "descrever factos que poderão configurar a prática de crimes".

Os jornais Sol e inevitável noticiaram que "cerca de duas centenas de migrantes moldavos estarão a ser escravizados em Serpa", segundo uma denúncia feita no Twitter por um jovem universitário moldavo, Catalin Schitco.

No texto publicado no domingo, Catalin Schitco escreveu: "Recebi uma denúncia, de fonte fidedigna, que em Serpa, Beja, 200 moldavos estão neste momento a ser escravizados. O salário é enviado para o patrão no estrangeiro que não lhes paga. E isto não é o mais chocante".

Acrescentando depois, numa resposta à publicação, que "a mesma fonte acrescenta que [a] GNR sabe do sucedido e tem acordos com os patrões criminosos".

Em declarações ao Inevitável, o estudante alegou que foi "abordado por uma moradora de uma aldeia em Serpa, avó de uma amiga próxima", que lhe terá contado "a história".

Segundo Catalin Schitco, a mulher terá conseguido "comunicar com um imigrante", que lhe terá contado que "os trabalhadores não recebem salários fixos" e "o dinheiro é enviado de forma centralizada para uma pessoa no estrangeiro que depois o redistribui, sem qualquer tipo de periodicidade fixa ou garantida".

Em resposta à Lusa, a GNR referiu ainda que "tem estado particularmente atenta" à situação dos imigrantes e "tem realizado ações de policiamento e de fiscalização, intensificadas desde janeiro", no distrito de Beja.

As ações de policiamento e de fiscalização visam, segundo a GNR, "detetar possíveis situações de exploração de trabalhadores" e de "outros fenómenos associados" e "garantir a maior proteção possível" aos imigrantes que estão a residir ou a trabalhar naquele distrito.

28.1.22

SEF investiga 25 casos de exploração laboral ou contratação ilegal no Alentejo

Ana Dias Cordeiro, in Público on-line

Há menos inquéritos do SEF por esses crimes em todo o Alentejo do que em Maio do ano passado, quando eram 32. Jornal The Guardian escreve que “trabalhadores explorados” em Odemira garantem produção de frutos vermelhos vendidos nos melhores supermercados britânicos.

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) tem em curso várias investigações na zona de Odemira, que tiveram na sua origem suspeitas de tráfico de pessoas para exploração laboral ou contratação e auxílio à imigração ilegais.

Porém, nenhuma dessas investigações visa qualquer empresa associada da Lusomorango, uma organização de produtores citada numa notícia do The Guardian em que o jornal inglês relata denúncias de exploração laboral recolhidas em Odemira junto de 40 trabalhadores da Índia e do Nepal.

Na notícia, publicada na terça-feira, o Guardian escreve que esta organização de produtores tem, entre os seus associados, pelo menos duas explorações agrícolas referidas pelos trabalhadores estrangeiros ouvidos.

Em respostas ao PÚBLICO, o SEF diz que “nenhuma das investigações [em curso] surge associada a Sociedade Anónima Lusomorango” e acrescenta que “os trabalhadores estrangeiros referenciados [nas investigações] têm vínculo formal laboral a empresas de trabalho temporário, na sua maioria registadas e geridas por outros cidadãos estrangeiros da mesma origem”.

O que significaria que as empresas agrícolas podem contratar através de empresas de trabalho temporário, sendo estas responsabilizadas pelas condições de trabalho e não as empresas que beneficiam da mão-de-obra.

Neste caso específico, ainda não existem indícios suficientes para a abertura de um inquérito, diz o SEF que garante “estar atento a todas as situações que possam configurar a prática de qualquer crime, determinando [nesses casos] a abertura de inquéritos sempre que reunidos os indícios suficientes”.

Em todo o Alentejo, o SEF tem 25 inquéritos-crime em curso (eram 32 em Maio de 2021); desses, oito estão localizados no município de Odemira, no distrito de Beja. Mas apenas dois são relativos a tráfico de pessoas; os restantes seis são por auxílio à imigração ilegal. Igualmente contactada, fonte oficial da Polícia Judiciária não revela quantas investigações por crimes de auxílio à imigração ilegal ou angariação para tráfico de e exploração tinha em curso nesta zona do Alentejo.
Agências intermediárias

O The Guardian diz que, entre Setembro e Novembro de 2021, ouviu homens e mulheres empregados directamente ou através de agências intermediárias em explorações agrícolas em Odemira que não mudaram de empregador por receio de, com isso, colocarem em risco o pedido de autorização de residência em Portugal.

Segundo a investigação do jornal britânico, os imigrantes que seriam mal pagos ou trabalhariam mais horas do que as legalmente permitidas eram trabalhadores de pelo menos três empresas, cujos nomes não são revelados. Estas empresas fornecem frutos vermelhos para supermercados europeus e alguns dos melhores supermercados britânicos, como o Waitrose ou o Marks&Spencer, refere o jornal.

Contrato colectivo

Contactado pelo PÚBLICO, a propósito desta notícia, José Canelas, director-geral da Lusomorango, garante que “os termos dos valores de vencimento, das horas de trabalho” dos “trabalhadores das empresas que integram a Lusomorango estão estabelecidos no contrato colectivo de trabalho”.

O responsável explica que esse contrato é negociado entre a Associação dos Horticultores, Fruticultores e Floricultores dos Concelhos de Odemira e Aljezur e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Agricultura, Floresta, Pesca, Turismo, Indústria Alimentar, Bebidas e Afins, e que está em vigor desde Setembro de 2021 para todos os trabalhadores do sector na região.

Nas mesmas respostas escritas, acrescenta que, entre os cerca de 40 produtores associados à Lusomorango, os que exportam para o mercado internacional estão obrigados a cumprir “os vários processos de auditoria internos e externos, nacionais e internacionais, a que respondem periodicamente como as auditorias no âmbito da GRASP-Global GAP”, uma organização que fiscaliza as condições de trabalho no sector agrícola.



6.5.21

Observatório diz que condições de trabalhadores em Odemira “envergonham” Estado

in Público on-line

Carla Marques Pinto acentuou que “as condições degradantes e miseráveis” em que vivem trabalhadores agrícolas no concelho de Odemira, sobretudo migrantes, são “conhecidas, há muito, do poder político e das instituições”.

As condições dos trabalhadores agrícolas em Odemira, onde existe uma cerca sanitária devido à covid-19, “envergonham” o Estado, criticou esta quarta-feira o Observatório dos Direitos Humanos e das Prisões do Conselho Regional de Évora da Ordem dos Advogados.

“As miseráveis condições de habitabilidade, insalubridade e as gritantes violações dos direitos humanos a que se encontram sujeitos, bem como o abandono a que foram votados, pela inércia ou inépcia das diversas instituições e responsáveis políticos, há muito conhecedores desta realidade, envergonham seguramente o Estado português”, afirma o observatório, em comunicado.

Contactada hoje pela Lusa, a presidente do Observatório dos Direitos Humanos e das Prisões do Conselho Regional de Évora (CRE) da Ordem dos Advogados (OA), a advogada Carla Marques Pinto, sublinhou que “já não restam dúvidas” de que este caso representa “uma violação gritante dos direitos humanos”.

“Num ano em que Portugal preside à União Europeia, é, de facto, uma vergonha que, num Estado que se quer moderno e de Direito, se permita” esta situação, a qual ocorre “descaradamente”, porque “está noticiada e não é possível ignorá-la”, vincou.

Carla Marques Pinto acentuou que “as condições degradantes e miseráveis” em que vivem trabalhadores agrícolas no concelho de Odemira, sobretudo migrantes, são “conhecidas, há muito, do poder político e das instituições”.

“É uma realidade que toda a gente conhecia e que a covid-19 só veio agora “pôr a nu"”, salientou, insistindo que “os vários poderes políticos que foram passando ao longo desta década, pelo menos, têm conhecimento do que se passa”, assim como “qualquer cidadão atento”.

A advogada indicou que o observatório já acompanha a situação dos trabalhadores agrícolas em Odemira “há algum tempo”, adiantando que esta comissão vai continuar atenta e a fazer “tudo o que estiver ao seu alcance” para a resolução do problema.

No comunicado, o Observatório dos Direitos Humanos e das Prisões do CRE da OA frisa que “milhares de trabalhadores imigrantes, na legítima busca por melhores condições de vida, acabaram sujeitos, em território nacional, a tratamentos cruéis, desumanos e degradantes”.

“Não ignoramos, naturalmente, a complexidade do problema, mas também não podemos olvidar os inúmeros alertas e apelos que foram feitos ao longo dos anos pelos mais diversos setores da sociedade, na tentativa de encontrar uma solução que permitisse conferir dignidade a estes trabalhadores”, realça.

O observatório apela à criação de “condições estruturais que permitam resolver o problema de fundo”, as quais vão “indubitavelmente muito para além da resolução imediata do controlo da propagação do SARS-CoV-2”.

Lançado em julho de 2020, o Observatório dos Direitos Humanos e das Prisões da Conselho Regional de Évora da OA visa fazer o acompanhamento regional de situações de defesa dos direitos humanos nos distritos de Beja, Évora, Portalegre, Santarém e Setúbal.

O Governo decidiu decretar uma cerca sanitária às freguesias de São Teotónio e de Almograve, no concelho de Odemira, devido à elevada incidência de casos de covid-19, sobretudo entre trabalhadores do setor agrícola.

António Costa sublinhou que “alguma população vive em situações de insalubridade habitacional inadmissível, com hipersobrelotação das habitações”, relatando situações de “risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”.

5.5.21

Numa década, houve 547 vítimas de exploração laboral. A maioria na agricultura, no Alentejo

Joana Gorjão Henriques, in Público on-line

De acordo com os dados recolhidos pelo Observatório de Tráfico de Seres Humanos, a exploração laboral representou 70% do total das vítimas confirmadas entre 2008 e 2019. Maioria de vítimas são homens.

Em 11 anos, as entidades oficiais confirmaram 547 vítimas de tráfico de seres humanos para exploração laboral, mostra um relatório do Observatório de Tráfico de Seres Humanos (OTSH). A maioria das vítimas foi explorada no trabalho na agricultura. E o Alentejo foi a região do país com maior incidência.

Esta semana, na sequência da cerca sanitária imposta em duas freguesias de Odemira (Beja), a questão da exploração laboral tem estado em foco. Como o PÚBLICO noticiou no domingo, a Polícia Judiciária está a investigar várias queixas de exploração laboral na zona, o SEF tem 32 inquéritos a decorrer no Alentejo e o Ministério Público de Odemira abriu 11 inquéritos por auxílio à imigração ilegal para efeitos de exploração laboral.

De acordo com os dados recolhidos pelo OTSH, a exploração laboral foi, de resto, a forma mais frequentemente identificada pelas autoridades, representando 70% do total das vítimas confirmadas entre 2008 e 2019, o período abrangido pelo documento.

No âmbito das investigações do tráfico de seres humanos, há a identificação de vítimas como sinalização e como confirmação. Uma vítima é sinalizada quando há suspeitas de tráfico; é confirmada como tal só depois de recolhidos indícios pela investigação das autoridades competentes como o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) ou o Ministério Público.

Segundo os dados apurados naquele documento, mais de 80% das vítimas nesses 11 anos foram homens e o Alentejo representou 51% dos casos. Nenhuma outra região do país teve uma taxa de incidência tão alta — para se ter uma ideia, a zona em segundo lugar, a Área Metropolitana de Lisboa, concentrava menos de metade dos casos de exploração laboral, 19%. No Norte, a percentagem era de 14% e no centro 10%.

O tráfico no Alentejo para exploração laboral foi sobretudo para a agricultura e as autoridades confirmaram 303 vítimas nesta região, em que 82,5% foi no Baixo Alentejo, com destaque para os municípios de Beja (ao qual pertence Odemira) e Ferreira do Alentejo — o documento assinala 36 vítimas exploradas “em mais que uma herdade agrícola em diferentes municípios”. Isto porque uma das características deste fenómeno é a mobilidade das vítimas, que circulam de campanha em campanha.

No total, foram confirmadas 27 nacionalidades de África (14 países), da Ásia (seis países), da Europa (cinco países) e da América (dois países).
64 processos em 2020

Já o último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) refere que em 2020 foram instaurados 64 processos no âmbito de tráfico de pessoas e constituídos 29 arguidos. Foram ainda investigados 86 inquéritos, com a sinalização de 59 vítimas. As autoridades confirmaram 13 vítimas em 2020. Porém, sinalizaram 155 para exploração laboral, com Santarém e Portalegre como os distritos com maior incidência de presumíveis vítimas — foram identificadas 31 e 14, respectivamente. Estas vítimas sinalizadas podem ser confirmadas mais tarde, porque os dados só são actualizados depois de terminadas as investigações.

Na análise longitudinal do observatório, entre 2008 e 2019 é possível concluir que foi em 2013 e 2016 que se confirmaram mais vítimas de tráfico para exploração laboral — com 118 e 124 em cada um desses anos.

No relatório anual do OTSH de 2013 já se destacava o elevado número de confirmações em Beja: das 45 vítimas confirmadas nesse ano todas foram para exploração laboral e 43 estavam em Beja.

Em 2016, era de novo vincado o fenómeno: das 108 vítimas confirmadas, 101 foram para exploração laboral na agricultura. Beja voltava a aparecer entre os distritos com mais casos de exploração de vítimas para a agricultura com 23 casos. Nesse ano, porém, foi Santarém o distrito com mais vítimas de exploração laboral para a agricultura com 24.


4.5.21

Odemira: seis mil trabalhadores agrícolas não têm condições de habitabilidade

in Público on-line

É quase metade da força de trabalho agrícola do concelho, diz autarca. Nas 22 vistorias já efectuadas foram identificadas situações “de menor salubridade”, incluindo habitações sobrelotadas.

O presidente da Câmara Municipal de Odemira estima que “no mínimo seis mil” dos 13 mil trabalhadores agrícolas do concelho, permanentes e temporários, “não têm condições de habitabilidade”. “Este ano, estamos a falar de seis mil, mas, mesmo que sejamos capazes de resolver dois mil, no próximo ano, estamos a falar de seis mil ou sete mil, outra vez”, alertou o autarca, no final de uma reunião da task force do concelho que acompanha a situação da pandemia de covid-19, realizada esta segunda-feira.

Segundo o autarca, em relação a estes trabalhadores, o concelho de Odemira, no distrito de Beja, tinha, em Março deste ano, “cerca de 10 mil pessoas a descontar para a Segurança Social”, às quais se juntam “no mínimo três mil” que chegam para o “pico das colheitas”, citando dados das associações de agricultores. “No mínimo, são seis mil que não têm condições de habitabilidade, porque já temos três mil”, de forma permanente, sublinhou.

José Alberto Guerreiro salientou que esta situação “não pode ser acometida a um município com a escala e a dimensão de Odemira”, considerando, por outro lado, que “o fenómeno não pode crescer ilimitadamente, porque o território também tem limites”. “Temos que tentar fazer algum equilíbrio neste território para que a vida ambiental e económica, mas também social, possa ter tranquilidade e possamos ajudar o país e a economia em geral, mas com sustentabilidade”, acentuou.

O presidente do município advertiu também para “um novo problema” no concelho de Odemira, “tão grave” como o da falta de condições para os trabalhadores agrícolas, que é a falta de capacidade da barragem de Santa Clara para “fornecer água a tudo”. “Na última reunião do Conselho Estratégico da Associação de Beneficiários do Mira, a principal discussão foi exactamente a água disponível na barragem de Santa Clara para efeitos de rega, que dá apenas para um ano, se não chover”, adiantou.

Nesse sentido, o autarca questionou se o Governo tem “consciência” de que a região está “perante uma situação de seca iminente” e que, “com a falta de água na barragem de Santa Clara, pode haver uma paralisação de todo este sector”. “Eu julgo que não, porque já escrevi ao Governo duas vezes e, desculpem, nem acusaram a recepção do ofício”, acrescentou.
Falta de salubridade ou sobrelotação

As autoridades já identificaram no concelho de Odemira um total de 22 situações de alojamento de trabalhadores agrícolas com deficiências, por falta de salubridade ou por sobrelotação, revelou nesta segunda-feira o autarca. Em declarações aos jornalistas, no final de uma reunião de coordenação da task force do concelho que acompanha a situação da covid-19, o presidente da câmara municipal indicou que foram “efectuadas, até ao momento, 22 vistorias, no total, a situações identificadas de menor salubridade”, incluindo “obviamente algumas habitações em sobrelotação”.

“Neste momento, as informações estão recolhidas, foi definido o procedimento de evacuação de algumas [dessas habitações] e de redução do número de habitantes noutros casos”, acrescentou. Agora, cabe à autoridade de saúde pública “decidir qual é o momento de actuação, uma vez que foi também decidido efectuar testagem prévia a todos os ocupantes” das respectivas residências ou espaços, assinalou.

No final da reunião desta segunda-feira, na qual participou o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), o autarca de Odemira insistiu que cabe às autoridades de saúde decidir quando devem ser transferidas pessoas com covid-19 para a Pousada da Juventude de Almograve ou para isolamento profiláctico no complexo turístico Zmar, mas afiançou que “será seguramente até amanhã”, terça-feira, que essa transferência arranca. “Amanhã, certamente que haverá já situações operacionalizadas”, frisou, adiantando também que o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, vai participar numa reunião, em Odemira, na terça-feira.

O Governo decidiu decretar uma cerca sanitária às freguesias de São Teotónio e de Almograve, no concelho de Odemira, devido à elevada incidência de casos de covid-19, sobretudo entre trabalhadores do sector agrícola, anunciou o primeiro-ministro, António Costa, na quinta-feira à noite.

O chefe do Governo sublinhou também que “alguma população vive em situações de insalubridade habitacional inadmissível, com hipersobrelotação das habitações”, relatando situações de “risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”.

Segundo o presidente do município de Odemira, o procedimento de transferência dos trabalhadores agrícolas “prevê uma testagem prévia”, no local vistoriado, por parte de uma equipa da Cruz Vermelha, e, quanto ao transporte, o que está acordado é que “será concedido um prazo de 24 horas ao proprietário, arrendatário ou responsável por esse alojamento” para resolver a situação, de “duas formas”.

“Ou ele dispõe de um local alternativo” em que possa garantir, “em condições de salubridade, o alojamento de todos ou, em alternativa, terá de ser ele a promover o respectivo transporte” para os locais identificados pelas autoridades para os isolamentos profilácticos ou para a quarentena dos infectados, explicou.

José Alberto Guerreiro disse que “os números” da covid-19 “estão a baixar” no concelho, mas admitiu não ter qualquer indicação sobre um prazo para o fim da cerca sanitária.

3.5.21

De Rabo de Peixe a Odemira: as pandemias que a covid-19 revelou

Ivo Neto, opinião, Público on-line

Portugal é um país pequeno, mas muito heterogéneo. Se uma parte do dinheiro da famosa bazuca promete aligeirar os efeitos da pobreza no Porto e em Lisboa, é importante que quem decide não se esqueça daqueles que não são tão visíveis Há mais casos como Odemira e Rabo de Peixe. Não podemos deixar estas pessoas à espera que apenas um desastre como o que agora experimentamos as tornem visíveis.

Inoculação, postigo, desconfinamento, cerca sanitária, teletrabalho...Estas são apenas algumas das expressões que a covid-19 retirou daquelas páginas dos dicionários que ninguém lê e as tornou mais comuns. Passaram a fazer parte de primeiras páginas dos jornais e a abrir telejornais todos os dias.

Ou seja, a covid-19 deu-lhes visibilidade. Mas mais importante do que as palavras são as pessoas e as histórias que tornam essas palavras importantes. E se há coisa que a covid-19 tem feito é dar visibilidade a problemas crónicos do nosso país.

Quando o país confinou pela primeira vez, retirámos da cave os problemas das famílias que não têm condições para apoiar os filhos na telescola. Ou porque não têm computadores com Internet ou porque têm empregos precários que não são complacentes com os méritos do teletrabalho num contexto pandémico. Transtornos sociais que existem há muito tempo e que, infelizmente, vão perdurar.

Na quinta-feira, António Costa voltou a usar uma dessas expressões: cerca sanitária. Desta vez decretou-a para Odemira. A última vez que a medida foi aplicada em Portugal aconteceu em Rabo de Peixe. O que têm as duas localidades em comum? Pobreza e condições de vida longe do que podemos considerar serem dignas. Diagnósticos há muito conhecidos.

“[É preciso] quebrar essa sobrelotação [de pessoas a viverem no mesmo espaço] porque é um risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”, disse Costa para justificar a cerca sanitária imposta às freguesias de São Teotónio e de Longueira/Almograve, no concelho do litoral alentejano.

Quem são essas pessoas? Sobretudo imigrantes que procuram trabalho em Portugal para fazer aquilo que nenhum português aceita fazer, muito menos nas condições que lhes são oferecidas. É um problema novo? Longe disso. Por exemplo, e numa simples pesquisa no site do PÚBLICO, encontramos um texto assinado por Armando Sevinate Pinto, em 2014: Os romenos, a “desumanidade” e o desemprego no Alentejo. No artigo, o político e engenheiro agrónomo, falecido em 2015, já falava dos “estrangeiros explorados”, dos “intermediários que os controlam “, e de “ilegalidades cometidas por algumas empresas intermediárias”.

Problemas que subsistem e que em alguns casos se tornaram mais graves, tal como retratado nas várias reportagens feitas pelo PÚBLICO esta semana.

Rabo de Peixe, separada por quase 1500 km de mar de Odemira, também tem um elefante na sala. Que todos sabem que existe, mas que ninguém resolve: a pobreza e novamente situações em que há mais de 14 pessoas a viver na mesma casa. A vila piscatória da Ribeira Grande também teve uma cerca sanitária no início do ano, fruto da multiplicação de novos casos de covid-19.

E tal como em Odemira, os problemas são mais do que conhecidos. Se o turismo mitigou algumas das limitações económicas daquela que já foi a região mais pobre da Europa, as condições de precariedade social continuam.

Muito dependente da indústria piscatória, e da sorte madrasta do mar, não se pode pescar um peixe com fibra óptica. Nem tão pouco pedir que ele chegue pela Uber Eats. Se em cada 100 pessoas em teletrabalho 48 estão em Lisboa e arredores, esta não é uma opção para a grande maioria das pessoas que vivem nesta vila.

Portugal é um país pequeno, mas muito heterogéneo. Se uma parte do dinheiro da famosa bazuca promete aligeirar os efeitos da pobreza no Porto e em Lisboa, é importante que quem decide não se esqueça daqueles que não são tão visíveis Há mais casos como Odemira e Rabo de Peixe. Não podemos deixar estas pessoas à espera que apenas um desastre como o que agora experimentamos as tornem visíveis.

18.1.21

Pandemia e exploração deixam na mendicidade imigrantes que trabalham nos campos do Alentejo

Carlos Dias(Texto) e Rui Gaudêncio (Fotografia), in Público on-line

Há pessoas sem abrigo, outras em casas abandonadas, muitas a pedir ajuda à Cáritas. A antecipação do fim da campanha da azeitona e a pandemia deixou muitos estrangeiros numa situação aflitiva. Alvo da exploração de empresas de prestação de serviços, há quem se queixe ainda de salários em atraso. “São cada vez mais os que não têm nada para comer”, conta um empresário.

Ano após ano o cenário repete-se. A partir de meados de Setembro, milhares de cidadãos estrangeiros chegam a Beja vindos de cada vez mais longe. Vêm do subcontinente indiano — Nepal, Índia, Paquistão, Bangladesh. Ou da África subsariana — Senegal, Guiné-Bissau, Guiné-Conacri, Gâmbia e Gana. Mas também do Leste europeu — Moldova, Ucrânia, Roménia. E ainda do Brasil. A campanha da azeitona termina, em anos normais, no início de Fevereiro e garante trabalho. Mas este não foi um ano normal. A safra sofreu uma quebra que ronda os 40%. Menos produção, significa uma redução na mão-de-obra necessária, acrescido do encurtamento do tempo da campanha que, desta vez, no final de Dezembro, estava praticamente concluída.

A pandemia agravou a situação. Houve mais instabilidade laboral, “com mais paragens nos trabalhos agrícolas”, diz ao PÚBLICO, Isaurindo de Oliveira, presidente da Cáritas Diocesana de Beja. A maior parte destes migrantes trabalha na agricultura e tem contratos sazonais. As remunerações rondam os 2,5 a 3,5 euros por hora, quando há trabalho, e muitos são sujeitos a condições de vida degradantes, como se pode testemunhar em sucessivas sentenças judiciais. Mais: "Se chove ou ficam doentes não recebem”, prossegue Isaurindo de Oliveira. "São cada vez mais os que não tem nada para comer”, diz um empresário ao PÚBLICO.

Há assim um fenómeno novo na cidade de Beja e noutros concelhos alentejanos onde a cultura de olival ocupa grandes extensões de terra. Pelas ruas e bancos dos jardins deambulam, sem destino, os imigrantes abandonados à sua sorte e a quem são devidos os salários que empresas que os contrataram lhes sonegaram, deixando-os na mendicidade, a recorrer ao apoio da Cáritas ou a pedir auxílio na rua, e sem possibilidade de voltar à sua terra. Sobrevivem das ajudas que as organizações de apoio social lhes prestam, sobretudo a Cáritas de Beja. Muitos vivem em casas superlotadas, sem condições, outros ocuparam edifícios abandonados. Começam a aparecer situações de pessoas sem abrigo a dormir em casas abandonadas, na periferia da cidade, próximo da estação dos caminhos-de-ferro. E outros, com rendas em atraso, estão em risco de perder a casa.

Muitos vivem em casas superlotadas, sem condições, outros ocuparam edifícios abandonados. Começam a aparecer situações de pessoas sem abrigo a dormir em casas abandonadas, na periferia da cidade, próximo da estação dos caminhos-de-ferro. E outros, com rendas em atraso, estão em risco de perder a casa.

Com o fim da campanha de recolha de azeitona, “o número de pessoas que nos apareceram de repente com problemas alimentares é muito grande”, diz Isaurindo de Oliveira. Só no Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM) foram realizados no último ano 243 atendimentos.

Uma dessas pessoas atendidas é Iama Mané, uma jovem natural da Guiné-Bissau, que trabalhou na agricultura e está desempregada há três meses. “A minha vida sem trabalho é muito triste”, vai dizendo. Mas é mais do que isso. Conta que mantém um conflito com a senhoria da casa onde vive com uma tia. “Bate constantemente à porta com brutalidade para me exigir o pagamento da renda, mas eu não tenho condições para cumprir. ‘Por favor não é assim!’ E ela responde: ‘Eu não posso esperar mais pelo dinheiro.’” São 330 euros que paga por um quarto e uma sala.

Ana Barrocas, mediadora sociocultural na Cáritas de Beja, é quem faz o primeiro atendimento dos migrantes que aqui acorrem, para apurar quais as necessidades e respostas que podem ser dadas. Diariamente, é colocada perante o cortejo de dramas humanos. “Quando eu deixar de sentir o meu lado humano perde-se o sentido da vida”, comenta. Iama conta-lhe que está a procurar trabalho. “Mas não consigo encontrar.” E tem outro problema em mãos. A família está em Bissau e recebiam a sua ajuda porque são muito pobres. Agora, nada pode fazer por eles.

A realidade tal como ela se expressa, ainda está longe de ser a de um acolhimento eficiente e humanizado dos cidadãos estrangeiros que procuram trabalho nos campos do Alentejo: “Apenas conseguimos fazer cócegas nalguns pelos da pele”, conclui Isaurindo Oliveira. O PÚBLICO solicitou esclarecimentos sobre esta situação que se vive no Alentejo ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e ao das Infra-Estruturas e da Habitação, mas não obteve resposta.

Abandono e fome

Actualmente, a Cáritas Diocesana de Beja presta atendimento a imigrantes oriundos de 27 países. Vêm suprir as carências de mão-de-obra na apanha da azeitona, da amêndoa, da uva e de frutos vermelhos. Ninguém sabe quantos serão. A Associação Solidariedade Imigrante (Solim) que presta apoio a cidadãos estrangeiros, admite que possam chegar aos 30 mil. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) adianta que no distrito de Beja residem cerca de 12 mil imigrantes. No entanto, o número dos que chegam ilegalmente ao sul do país para trabalhar está por quantificar.

A partir da capital do Baixo Alentejo, são levados para os mais diversos locais da região para trabalhar nas culturas intensivas, por vezes, em condições degradantes.

Os contratos de trabalho fazem sempre referência ao salário mínimo, mas nuns casos “são pagos à hora, noutros à semana, à quinzena ou ao mês e, às vezes, com atrasos e irregularidades”, diz o presidente da Cáritas.

Os contratos de trabalho fazem sempre referência ao salário mínimo, mas nuns casos “são pagos à hora, noutros à semana, à quinzena ou ao mês e, às vezes, com atrasos e irregularidades”, observa o presidente da Cáritas.

As rusgas que todos os anos as autoridades (GNR, ACT e SEF) realizam para detectar a presença de trabalhadores ilegais, o tráfico de seres humanos ou infracções às condições de trabalho, não têm inibido quem pratica crimes. Boa parte dos implicados em redes de tráfico de seres humanos é sancionada com pena suspensa, como se pode constatar no mais recente julgamento no Tribunal de Beja. A sentença proferida a 4 de Dezembro condenou, a pena suspensa, cinco cidadãos romenos e um moldavo pelo crime de auxílio à imigração ilegal. A apenas um, por ser reincidente, foi aplicada uma pena de prisão efectiva de quatro anos e nove meses.

Os imigrantes que vêm trabalhar no Alentejo e na nova agricultura, não são contratados directamente pelos proprietários ou rendeiros das explorações agrícolas. A legislação em vigor permite que fiquem à disposição de empresas prestadoras de serviços, constituídas por angariadores de mão-de-obra, muitos deles de outras nacionalidades. Os empresários agrícolas são acusados de serem coniventes e pactuarem com a exploração laboral dos imigrantes ou de aceitarem trabalhadores ilegais nas suas explorações.

José Manuel Castelo Branco, proprietário com outros membros da família de culturas de olival, vinha e hortícolas, em Baleizão, defende a necessidade de “uma fiscalização mais intensa” e considera um absurdo a facilidade com que algumas empresas de prestação de serviços “declaram falência para fugir aos pagamentos à Segurança Social”. “Os imigrantes são essenciais para nós”, refere o empresário, destacando o “respeito” que lhe merecem os trabalhadores estrangeiros que todos os anos contrata para as tarefas agrícolas. Reconhece que, pelo valor do seu trabalho, merecem ser “acarinhados”.

Nos arredores de Beja e no lugar de Quintos, Hugo Pereira, o proprietário de uma exploração de morangos, tem ao seu serviço 20 trabalhadores paquistaneses e indianos, que residem em contentores com cozinha, casa de banho e ar condicionado no interior da exploração. “Tenho funcionários que trabalham comigo há quatro anos. São dedicados, organizados e metódicos, merecem consideração. No entanto, conheço casos muito maus, em que se trata mal os imigrantes, que deixam as suas famílias para virem ganhar a vida para tão longe das suas casas.” No seu caso diz que tem trabalho para eles, todo o ano, contrariando o cenário que se observa quando termina a campanha da azeitona.

Um português que contrata imigrantes conta como “os desgraçados que trabalham no duro” são defraudados por empresas de prestação de serviço. “Assim que recebem a verba acordada no contrato que fazem com os empresários agrícolas, dão logo baixa da empresa e desaparecem com o dinheiro dos trabalhadores, e com o que deviam entregar na Segurança Social"

Um português que contrata imigrantes para os colocar nas explorações agrícolas na região de Beja confirmou ao PÚBLICO, sob anonimato, por razões de segurança, o modo como o erário e “os desgraçados que trabalham no duro” são defraudados por empresas de prestação de serviço. “Assim que recebem a verba acordada no contrato que fazem com os empresários agrícolas, dão logo baixa da empresa e desaparecem com o dinheiro dos trabalhadores, e com o que deviam entregar na Segurança Social e nas Finanças.”

Este modus operandi “origina situações muito preocupantes do ponto de vista humano e social”. Não entregam aos que trabalharam sob as suas ordens “o salário a que têm direito”, frisa o presidente da Cáritas de Beja.

O empresário português descreveu ao PÚBLICO várias situações de falta de pagamento de salário, de abandono e de fome. “É a toda a hora a telefonarem-me a pedir ajuda. Nos casos mais extremos, compro-lhes arroz e frangos. São cada vez mais os que não têm nada para comer”, garante, junto à Igreja de S. Amaro e do castelo de Beja onde estão “alojados” vários cidadãos indianos sem trabalho.

Sidy Toure Trabalhou na apanha da azeitona e está sem trabalho. Aguarda que o patrão o leve para a apanha de laranjas mas não sabe onde nem quando pode começar, embora, acentua, tenha sido o patrão que disse para ele se legalizar e o está a ajudar nesse sentido

27 nacionalidades

Os imigrantes atendidos no CLAIM são provenientes de 27 nacionalidades. A faixa etária mais predominante nestes trabalhadores encontra-se entre os 26 e 35 anos. No que diz respeito às habilitações, o nível de escolaridade mais frequente é o ensino secundário.

Assim que foi decretado o estado de emergência nacional, seguido do estado de calamidade, praticamente todos organismos públicos e privados pararam com o seu funcionamento. “Os imigrantes ficaram privados de trabalhar e consequentemente sem qualquer fonte de rendimento” e as instituições que são fundamentais para regularizar a sua presença no território nacional também fecharam as portas e “ficaram congestionadas ou até mesmo inacessíveis telefonicamente, nomeadamente SEF, Serviço de Finanças, IEFP, etc. ”, observa a Cáritas de Beja.

As consequências fizeram-se sentir nos atendimentos do CLAIM, “dispararam de forma acentuada uma vez que se tornaram uma das poucas portas abertas onde os imigrantes poderiam encontrar apoio e uma orientação”, sublinha Isaurindo Oliveira. Chegam aqui “à procura de melhores condições de trabalho e apoios sociais”, mas também para denunciar “trabalho precário e exploração laboral.”

Nos esclarecimentos prestados ao PÚBLICO o Ministério da Administração Interna (MAI), diz que à semelhança de outros serviços da administração pública, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) “viu a sua capacidade de atendimento reduzida devido à situação pandémica que atravessamos”. Face a esta situação, “foram tomadas medidas de forma a garantir inequivocamente os direitos de todos os cidadãos estrangeiros” com processos pendentes no SEF.

Os cidadãos estrangeiros com processos pendentes no SEF ao abrigo Lei de Estrangeiros consideram-se em “situação de permanência regular em território nacional”. Dadas as circunstâncias, “podem aceder a todos os serviços públicos: obtenção do número de utente, acesso ao Serviço Nacional de Saúde ou a outros direitos de assistência à saúde, acesso às prestações sociais de apoio, celebração de contratos de arrendamento, celebração de contratos de trabalho, abertura de contas bancárias e contratação de serviços públicos essenciais”.

No que diz respeito aos documentos de residência, os vistos e documentos relativos à permanência de cidadãos estrangeiros em território nacional que “expiraram a partir de 24 de Fevereiro são aceites, nos mesmos termos, até 31 de Março de 2021”, informa ainda a tutela, frisando que a capacidade de atendimento dos serviços de atendimento ao público do SEF “tem vindo a ser ajustada sempre que possível”.

Esforço para evitar ruptura nos apoios

Feroz Khan veio da Índia e já tem a família consigo em Beja. Trabalhava num restaurante na praia da Comporta onde permaneceu durante dois anos, mas a empresa teve de fechar por ter sido identificado um surto de covid-19. Recorreu ao trabalho agrícola, mas há quatro meses que está sem trabalho. Como vive? Sorri antes da resposta. “É um grande problema. Peço aos amigos e à família que me ajudem financeiramente.”

Está legalizado e tem atestado de residência. “Mas não benefício do subsídio de desemprego e a esposa não trabalha porque temos três filhos.” Paga 350 euros de renda. Com as despesas da água, luz e gás o encargo sob para os 450.

“O trabalho agrícola sazonal levanta este tipo de problemas”, esclarece Ana Barrocas. “Com a pandemia, o apoio alimentar que é prestado sofreu um acréscimo enorme. E está a exigir um esforço constante para se evitar situações de ruptura nos apoios que prestamos” por ordem decrescente, a senegaleses, indianos e brasileiros. E mesmo com trabalho, muitos imigrantes continuam a procurar o nosso apoio.” O que ganham não chega para sobreviver, observa.

Acresce ainda “a imensidão de papéis e de burocracia que chega a ser extenuante”, reconhece Ana Barrocas. Que o diga Sidy Toure natural do Senegal e que não fala português. Pediu à Cáritas apoio para conseguir autorização de residência em Portugal. Diz que vive em Espanha e que está em Portugal desde Outubro. Ainda não tem número de utente no SNS. Vive com outros colegas africanos numa casa em Beja e paga 105 de renda, mais 25 euros pela água, luz e gás que consome.

“Com a pandemia, o apoio alimentar que é prestado sofreu um acréscimo enorme. E está a exigir um esforço constante para se evitar situações de ruptura nos apoios que prestamos”, diz Ana Barrocas

Trabalhou na apanha da azeitona e está sem trabalho. Aguarda que o patrão o leve para a apanha de laranjas mas não sabe onde nem quando pode começar, embora, acentua, tenha sido o patrão que disse para ele se legalizar e o está a ajudar nesse sentido.

Pediu também para se inscrever no curso de português. “Faço quase diariamente pedidos de inscrição de cidadãos estrangeiros” no Centro Qualifica da Escola Secundária D. Manuel I em Beja, ou esporadicamente no Instituto de Emprego e Formação Profissional, adianta Ana Barrocas, realçando a sua preocupação em aconselhar os imigrantes para adquirem formação em português. O problema é que a oferta de ensino “está muito longe de poder corresponder às solicitações que são feitas”.


2.2.18

Refugiados acabam explorados na apanha da azeitona em Alqueva

Carlos Dias, in Público on-line

Largas dezenas de cidadãos africanos que vieram trabalhar nos olivais, muitos deles fugidos da África subsaariana, não conseguem a sua legalização por incapacidade do SEF. O que os deixa nas mãos das máfias

Os trabalhadores vivem em contentores e ainda pagam por isso

Desde 2010 que as comunidades rurais, com maior incidência na chamada zona dos barros de Beja que abrange os concelhos de Beja, Serpa, Ferreira do Alentejo, Cuba e Aljustrel, são “invadidas” por imigrantes, que chegam para a campanha da azeitona. Primeiro vieram do leste europeu (ucranianos, moldavos, búlgaros). Depois os asiáticos (tailandeses, nepaleses, indianos, paquistaneses). Este ano, chegaram centenas de imigrantes oriundos da África subsaariana (Senegal, Guiné Bissau, Guiné Conacry, Gambia). A nacionalidade dos imigrantes muda quase todos os anos, mas o regime de exploração de mão-de-obra ilegal mantém-se por incapacidade das autoridades portuguesas em fazer cumprir a lei por aqueles que os exploram e em legalizar quem chega, na maior parte dos casos trazidos pelas redes de tráfico de mão-de-obra ilegal.

Foram várias as denúncias feitas por trabalhadores africanos e indianos ao PÚBLICO. Queixam-se, não só da exploração a que estão sujeitos, mas sobretudo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) por este tardar em atribuir-lhes atestado de residência, apesar de alguns deles se encontrarem há dois, três e até quatro anos em Portugal. É que a legalização é a sua única defesa contra a exploração.

Na delegação de Beja da Associação Solidariedade Imigrante (SOLIM), a presença de cidadãos africanos a pedir apoio “tem sido constante”, refere Alberto Matos, que coordena o trabalho de apoio aos imigrantes, na sua esmagadora maioria chegados à região para trabalhar na apanha da azeitona. Este responsável estima que a campanha de azeitona no olival intensivo e superintensivo mobilizaram cerca de 10 mil trabalhadores, na sua esmagadora maioria imigrantes que incluem um elevado número de naturais da Africa subsaariana, entre eles refugiados que atravessaram o Mediterrâneo e que ainda não possível quantificar.

“Chegam-nos por vezes desesperados para legalizar a sua situação em Portugal” porque só assim “muitos deles se conseguem libertar das redes de tráfico de mão-de-obra”, diz o delegado da SOLIM

O PÚBLICO falou com três cidadãos vindos da Guiné-Bissau. Dois deles entraram como turistas e um terceiro já atravessou o Mediterrâneo “três vezes”. Apresenta um visto de entrada em Catânia, na costa leste da Sicília. Está a tentar legalizar a sua situação.

Diz não compreender tanto obstáculo à sua legalização quando já desconta para a segurança social há quase três anos. Evita identificar-se. Receia que aconteça alguma coisa aos seus familiares pois veio através de uma rede de tráfico de mão-de-obra. “Há muitos refugiados e viram para aqui (Alentejo) trabalhar nas oliveiras”, assegura.

Questionado sobre as razões que estão a impedir a legalização de muitos dos imigrantes que trabalham na apanha da azeitona, o SEF argumenta que, após a entrada em vigor da Lei 59
2017, “cabe aos requerentes solicitar a abertura de um procedimento administrativo para a obtenção do atestado de residência”, o que aparentemente poderá facilitar e tornar mais célere a legalização.

Contudo, não deixa de sublinhar que a “melhoria do atendimento ao público e da celeridade na instrução processual fazem parte das prioridades do SEF” mas, para alcançar este objectivo, aguarda pela “introdução de novas ferramentas tecnológicas” para “efectuar a verificação das manifestações de interesse submetidas ao abrigo no novo articulado da Lei, bem como todas as que se encontravam pendentes ao abrigo da anterior legislação”.
Alberto Matos diz que “falta descentralizar e tornar menos burocráticos” os procedimentos do SEF tendo em conta “os dramas humanos que se presenciam todos os dias”. Refere que a actual situação “é vantajosa para muita gente” pois sabe que a mão-de-obra imigrante ilegal “é muito mais barata” por estar nas mãos “das máfias” que a explora.

Os trabalhadores da Guiné Bissau asseguram que, para além da luta pela legalização, o imigrante não tem condições para reivindicar nem para reclamar o que lhe é devido. “Nunca há data certa para recebermos o salário”. E quando atrasa, “o patrão não atende o telefone”. Além disso, recebem o ordenado mínimo anterior ao que se encontra em vigor.

“Nós fazemos descontos para a segurança social mas ele (o patrão) não faz”, acusa um trabalhador, dizendo que tem 27 meses de descontos mas não tem um atestado de residência.

O regime laboral obriga-o a levantar-se às 5h e só pára às 19h, com 30 minutos para almoço. A situação acabada de descrever, atinge outros cidadãos africanos e também indianos, com quem o PÚBLICO falou na Herdade do Curral a pouco mais de seis quilómetros da cidade de Beja.

“Somos tratados como animais”, é o primeiro desabafo. Estão alojados em contentores no meio do olival, com muita lama e uma linha de água contaminada com as águas residuais resultantes da presença de quase uma centena de pessoas. O lixo está acumulado a um canto.

O encarregado deste grupo de trabalhadores é português e diz que cada trabalhador ganha 4,16 à hora. Vários trabalhadores denunciaram o pagamento de 75 euros de alojamento, num contentor que é partilhado com mais duas pessoas e 30 euros pelo transporte.

Se chover não ganham e por vezes são colocados de castigo “se refilarem”, acrescenta um deles.

Concluída a campanha da azeitona, estes trabalhadores vão apanhar framboesa no Algarve. Outros ficarão na poda das oliveiras. Nas mesmas condições sub-humanas.

25.7.17

Também já fui a cigana (ou a preta) dos outros

Ana Sousa Dias, in Diário de Notícias

Ela consegue fazer isto, é espantoso. Esta era a reação do patrão que me tinha atribuído uma tarefa ridiculamente fácil, mas como eu era portuguesa ele não esperava que eu conseguisse. Estávamos em Bruxelas em 1973, talvez início de 1974, e naquela pequena empresa os únicos belgas eram o dono e a secretária. Nós, os outros, éramos uma espécie de equipa benetton: uma congolesa, uma espanhola, um vietnamita, uma polaca e eu. Recebíamos menos e tínhamos menos direitos do que os da Comunidade Económica Europeia, na altura constituída por França, República Federal da Alemanha, Itália, Holanda, Bélgica e Luxemburgo. E mais o Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca, que tinham acabado de entrar.

Nós éramos todos de fora e isso criou cumplicidades com significados diferentes. Anne-Marie, linda e sempre vestida de capulanas espetaculares, era casada com um opositor de Mobutu, um homem de Lumumba que tinha sido forçado a deixar o então chamado Zaire. Tínhamos uma cumplicidade política, uma coisa em meias-palavras. Blanca era exuberante e atrevida. Aproveitava as ausências do chefe e da secretária para falar ao telefone com o namorado em Espanha. Ríamo-nos, só eu percebia o que ela dizia. Barbara encantava-se com os sons do português e de vez em quando ia a minha casa. Gostava da palavra nuvem. O contabilista Trinh era discreto, não convivia connosco.

O patrão, bigodinho estreito e sotaque de Bruxelas, e a secretária eram os únicos monsieur e madame. Nós éramos Anne-Marie, Blanca, Barbara, Trinh e Ana.

A imigração portuguesa tinha sido cortada na Bélgica mas, nesses anos antes do 25 de Abril, o país acolhia quem pedia asilo ao Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas. Havia ONG que disponibilizavam apoio, e a segurança social oferecia um subsídio, as primeiras rendas de casa e algum recheio essencial. Apresentávamo-nos às autoridades todos os meses.

Só tínhamos acesso aos trabalhos que requeriam menos habilitações, enquanto esperávamos o estatuto de refugiados da ONU, as bolsas de estudo ou o reconhecimento das habilitações. Mesmo depois de conseguidos "os papéis" os obstáculos não desapareciam. Era preciso provar--se que se era capaz. A cor da nossa pele era avaliada. Portuguesa e loira? estranhavam constantemente, como se fosse impossível. Vínhamos da Europa do Sul e abaixo de nós, na cadeia alimentar, estavam os marroquinos e os congoleses, as comunidades mais numerosas de então. O G, nascido em Moçambique e desde miúdo criado em Portugal, foi uma vez apanhado a comer morangos no supermercado. Tinha saudades de morangos. Humilharam-no como se fosse um criminoso e ele chorou de raiva.

Se conto isto não é para reivindicar nada, é apenas para dizer como é fácil sermos tratados como "os outros", aqueles de quem se desconfia porque não pertencem ao grupo. Estávamos na Bélgica depois de termos sido recambiados na fronteira da Suécia: "Estamos fartos de pagar impostos para vos sustentar." Puseram-nos no mesmo barco em que chegáramos, como se fossemos perigosíssimos, os passaportes riscados a vermelho e entregues à polícia marítima. Tínhamos a polícia alemã à espera para nos interrogar e finalmente lá nos deixaram apanhar o comboio para Bruxelas.

Este é o tema destes dias, em Portugal, 2017, com a revelação de situações insuportáveis na Cova da Moura e com a discussão sobre palavras de um candidato autárquico sobre ciganos. E a este propósito tenho, assim de repente, duas reações. Uma é aplaudir e adotar a resposta de Mamadou Ba na RTP: não entro em concursos de burrice. Não me faz sentido repisar argumentos mais do que esclarecidos. Outra é voltar ao livro Racismo, de Francisco Bethencourt, português académico do King"s College de Londres. É um estudo profundo das origens do racismo. O historiador pesquisa e analisa as relações com "os outros" desde o tempo das Cruzadas e até ao século XX, para concluir que "o racismo foi motivado historicamente por projetos políticos". Percorre o mundo inteiro, os diferentes contextos, as teorias "científicas" das raças, os genocídios, as guerras:

"A norma de comportamento antirracista prevalece agora na maior parte do mundo. Todavia, o racismo não desapareceu. Abandonou, isso sim, a reivindicação de diferenças físicas, substituindo-as pela incapacidade cultural. A migração não é criticada com argumentos físicos, mas sim através da ideia de atraso cultural de incapacidade de adaptação. O argumento da inferioridade foi abandonado no debate político; agora, os imigrantes são acusados de desfrutarem de assistência social que não foi criada por eles."

Numa bela manhã a Anne-Marie chegou entusiasmada e disse-me: houve uma revolução no teu país. Abraçou-me, em festa ela também. Consegui a custo que o patrão pagasse o dinheiro que me devia. Era pouco, evidentemente, mas deu para pagar a viagem de comboio.

13.2.17

O caso do inspector das Finanças que não pagava a imigrantes que cuidavam da mãe

Joana Gorjão Henriques, in Público on-line

Contratava mulheres para cuidarem da mãe. Um dia mandava mensagem a dizer: “Está dispensada.” E não lhes pagava. Oito imigrantes denunciam o inspector ao PÚBLICO. O próprio admite não lhes ter pago. “Não tinham documentos, nem queriam celebrar contratos.” Mulheres desmentem.

Pouco tempo depois de começar a trabalhar em casa de António (nome fictício), Etelvina Pereira reparou que a colega estava com roupa nova. “Que bonita”, disse. Era a farda que uma das trabalhadoras anteriores tinha deixado lá em casa. Havia mais roupa “deixada para trás”: sapatos, T-shirts, mantas, guarda-chuvas. Percebeu mais tarde o que levou imigrantes que por lá passaram a não recuperarem as coisas que usavam — ora para cuidar da mãe, uma idosa acamada, ora para limpar a casa. Ao 17.º dia, recebeu uma SMS a dizer-lhe que não precisava de voltar.

A mensagem foi enviada por uma das empregadas de António, a pedido do próprio. Diria a Etelvina (ou Vina) que tinha sido proibida de lhe abrir a porta. “É aquilo que faz a todas. E as coisas ficam lá, não deixa irem buscá-las”, conta, semanas depois, num café dos subúrbios de Lisboa.

A promessa de ordenado eram 600 euros mensais pelo trabalho de segunda-feira a sábado, das 19h às 9h, mais o passe dos transportes públicos — que António lhe pagou no início. Devia-lhe, então, cerca de 300 euros.

Ao longo de vários meses de 2016, este inspector das Finanças em Lisboa terá explorado mais de uma dezena de mulheres. Pelo menos duas delas contabilizaram 13 trabalhadoras não pagas, todas imigrantes. O PÚBLICO falou com oito. Uma apresentou queixa à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). Nessa queixa, referem-se as 13 mulheres, acusa-se António de abuso de poder. Escreve-se que ele ameaçava que as denunciaria ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e que as acusaria de maltratarem a mãe, que terá 95 anos.

Ao longo de vários meses de 2016, este inspector das finanças em Lisboa terá explorado mais de uma dezena de mulheres. Pelo menos duas delas contabilizaram 13 trabalhadoras não pagas, todas imigrantes

O próprio António, em entrevista, admitiu que não pagou a seis das mulheres que o PÚBLICO referiu. Alegou primeiro que “nenhuma dessas pessoas” lhe tinha apresentado “identificação”, que “não sabia o apelido delas”. “Estamos a falar supostamente de pessoas que existem”, disse. Depois de afirmar “não me recusei a pagar a ninguém”, confessou: “Não paguei. Porque nenhuma delas me apresentou os documentos de identificação, ou passaportes. E todas se recusaram a celebrar contrato escrito que é obrigatório.” Além de “terem demonstrado que não tinham competência para assistência à minha mãe”.

“Isso é mentira dele”, afirma Filipa (nome fictício). “Quantas vezes falei para ele: e o contrato? Precisava do contrato para autorização do SEF. E ele falava: para a semana.”
SMS a dispensar os serviços

A história que as várias ulheres contaram ao PÚBLICO repete-se. São todas imigrantes, a maioria brasileiras, várias sem autorização de residência legal. Todas dizem ter ficado a prestar serviço de cuidadora ou de limpeza, em média por duas semanas, umas mais e outras menos, até receberem uma mensagem a despedi-las, frequentemente a dizer que a “mãe” não se adaptou a elas. Seguia-se o pedido de um número de identificação bancária para transferência do dinheiro pelo serviço prestado, e depois disso silêncio total — e nada de pagamento.

Mensalmente, quatro pessoas trabalhavam para António, conta quem lá esteve: uma cuidadora de dia, uma empregada de limpeza, uma cuidadora de noite e uma cuidadora de fim-de-semana. “Havia rotatividade de 24h”, diz Hildy, que fez as noites durante 18 dias, algumas “virando”, ou seja, substituindo uma pessoa de dia que ele tinha mandado embora. Hildy diz que lhe foi oferecido um ordenado de 800 euros, mais passe e pequeno-almoço. A pedido de António, entregou-lhe passaporte e número de identificação fiscal. O horário era cansativo, mas ela precisava de emprego, é mãe de dois filhos. Do mesmo número de telemóvel que enviou mensagens semelhantes para mulheres que entrevistámos, lia-se, em letras maiúculas: “O seu trabalho acabou ontem não tem que vir hoje”.

“Não paguei. Porque nenhuma delas me apresentou os documentos de identificação, ou passaportes. E todas se recusaram a celebrar contrato escrito que é obrigatório.”
António, empregador, nome fictício

O marido de Hildy, português, ainda contactou António — mas ele ficou “enrolando”, diz o marido. Numa das respostas de António por SMS, o próprio ameaça-a dizendo que vai consultar um advogado para saber se há “justa causa” para despedimento sem pagamento do salário. “Depois percebi por que é que ele não emprega portuguesas. Claro! Iam depor na justiça”, afirma Hildy que, apesar de não querer ser identificada pelo apelido, decidiu falar “para que ele não continue a fazer o mesmo”.

Eni Marques, brasileira, há 15 anos a viver em Portugal, e Vina, cabo-verdiana que vive em Portugal desde que tem um ano, encontram-se para tirar a fotografia para a reportagem. Não se conheciam, mas sabem da existência uma da outra. Trabalharam em períodos diferentes em casa de António. Vina interroga-se: “Como é que ele tem dinheiro para pagar a quatro pessoas? Não tem. Por isso é que ele fazia isto.”

Destemida, com 45 anos, Vina quer lutar pelos seus direitos. Quem trabalha, recebe, defende. Falam no apartamento dele, numa zona periférica de Lisboa, com garagem, dois quartos e uma sala, e sem muitos bens dentro de casa. Nunca António lhes solicitou documentos, nem sugeriu que fizessem contrato, acusam. Nem o apelido dela conhecia, diz Vina. “Como ele sabe o que vai acontecer no fim, não interessa saber muito sobre as pessoas”, diz.

Eni começou como cuidadora e passou a fazer limpeza. Seria dispensada ao fim de mais de um mês sem nunca lhe ter sido pago “um cêntimo” — apenas o passe. Concorda com Vina: “Ele já é tão mal-intencionado que quando uma pessoa vai para trabalhar ele nem pede nada. Diz que acredita nas pessoas que trabalham lá. Eu trabalho desde os 12 anos e nunca é assim em lugar nenhum. Trata-se de cuidar de uma pessoa que está acamada e é 100% dependente.” Isso ela estranhou. Também o acusa de assédio. “Virava para mim e falava do meu ‘corpão’”, conta.
Email para a IGF

No dia em que António a despediu, a 30 de Dezembro, Vina conta que foi bater-lhe à porta e o esperou no prédio. Decidiu enviar uma mensagem: “Boa noite, Sr. António, não sei o que aconteceu mas sei que disse [à empregada] para não me abrir a porta. Acho que mereço saber o que aconteceu para agir assim.” Ele respondeu: “Boa noite. Hoje enviei uma SMS a dizer que os seus serviços para cuidar da minha mãe tinham terminado esta noite e disse também para me enviar o NIB para transferir o dinheiro. Esta decisão mantém-se.” Até hoje Vina espera o salário. E que ele a contacte para o pagar, depois de o ter confrontado cara a cara sem sucesso.

Irina Antipina, russa, com nacionalidade portuguesa há dez anos, também diz que não tem medo. A morar no outro lado da ponte, na zona de Almada, demorava quase duas horas até casa de António, onde ficou cerca de duas semanas até receber a chamada a dizer que estava dispensada, conta. A rapidez com que foi contratada foi a rapidez com que foi despachada, relata. No dia da entrevista começou logo a trabalhar; ele pagou-lhe apenas o transporte. No fim, nem um cêntimo dos 300 euros que lhe devia pelas noites a cuidar da mãe, queixa-se.

Na altura, quando recebeu a chamada de António, ligou para a colega que ainda lá trabalhava, para ir buscar um envelope com o pagamento e as suas coisas. Recebeu a informação de que ele tinha dado ordens para não lhe abrirem a porta. “A minha cara ficou 'pasma'”, conta. O marido de Irina entrou em acção, telefonou-lhe. António pediu o número de conta bancária — e a partir daí nunca mais respondeu a chamadas. “Ficou lá a minha roupa: as calças, a T-shirt, uma camisa e até os chinelos”, lembra.

Do mesmo número de telemóvel que enviou mensagens semelhantes para mulheres que entrevistámos, lia-se: “O SEU TRABALHO ACABOU ONTEM NÃO TEM QUE VIR HOJE”.

O esforço que teve e os 300 euros que lhe ficou a dever — e muita falta faziam — motivaram-na a denunciar a situação para a Inspecção-Geral das Finanças, onde António trabalha. Não foi contactada por esta instituição, mas um dia ligaram-lhe do SEF para ir falar do seu caso, diz. Disseram-lhe que não tinha “conteúdo criminal” para seguir e que ela não era estrangeira, por isso aconselharam-na a ir ao Tribunal de Trabalho (TT). Na altura, chamaram ainda Filipa (nome fictício), que também tinha feito queixa e informaram-na que o caso seria enviado para o TT. Nunca mais souberam de nada. “Ele continua fazendo a mesma coisa e fica impune”, comenta Filipa que diz ter trabalhado em casa deste funcionário público durante quase três meses. No primeiro e segundo mês recebeu os 800 euros acordados pelo serviço das 10h às 20h; ao final do terceiro mês, António despediu-a sem lhe pagar os dias de trabalho. “Disse que não precisava mais e que tinha arranjado outra pessoa.” Contactado pelo PÚBLICO, o SEF disse que não pode prestar informações sobre processos em investigação.

Outra mulher com quem falámos (e pediu para não ser identificada) não quis “arrumar confusão” pelos 300 euros que ele lhe ficou a dever. Porque “a corda quebra sempre do lado mais fraco”, justificou.

Aos 47 anos, Sílvia Oliveira também andou a correr atrás de António para receber pelo que trabalhou durante cerca de uma semana a cuidar da mãe. Chegou a ir a casa dele. Bateu com o nariz na porta. Está disposta a depor contra ele. Mas o que parece acontecer com estas mulheres é que, a partir de determinada altura, mesmo as que querem lutar, não seguem em frente. Abrir um processo em tribunal não é fácil, exige tempo que muitas agora que trabalham não têm. “É um desgaste total, emocional”, diz Filipa.

Quando confrontado pelo PÚBLICO com o facto de tantas mulheres se queixarem de não lhes ter pago, António admitiu: “Sim. É natural. O que acha que deve ser um pagamento? Um pagamento ilegal, por baixo da mesa? Ou um pagamento a cumprir as obrigações fiscais e da segurança social?” E concluiu: “Todas elas ameaçaram ir para o tribunal. Se querem ir para tribunal, vão. Estamos num estado de direito. O tribunal é que vai dizer quem tem razão.”

Vina conclui: “Ele até podia não gostar do meu trabalho e mandar-me embora, tudo bem. Mas tem que pagar! Trabalhar para aquecer? Isso é exploração.”

Segundo a Organização Mundial do Trabalho, uma das formas de exploração laboral é a retenção do ordenado.
“As pessoas que não tenham medo. A justiça está do lado delas”

O trabalho doméstico obedece a um regime específico, através do decreto de lei 235/92, onde estão especificadas as tarefas a desempenhar. A de cuidadora corresponde à vigilância e assistência a idosos. Teresa Pargana, inspectora da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) – instituição que tem uma linha de atendimento para estes casos – clarifica que “o facto de não haver um contrato escrito não significa que não tenha sido celebrado: pode ser verbal”. E é-o a partir do momento em que se acordam horários e respectivo pagamento. Para haver contrato basta que “alguém desempenhe um conjunto de tarefas remuneradas sob autoridade” de outra pessoa. No caso de ser um trabalhador imigrante é preciso comunicar o contrato à ACT, mas há excepções para cidadãos de vários países como Brasil e Cabo Verde. A ACT não tem poder de ir fiscalizar uma habitação própria (apenas empresas) mas pode notificar o empregador que se arrisca ao pagamento de coimas (a multa pode ir dos 102 aos 5100 euros) ou a ser alvo de um processo de contra-ordenação. A ACT não tem dados sobre queixas de trabalhadoras domésticas, mas Teresa Pargana afirma que recebem sobretudo pedidos de esclarecimentos.

Embora não tenham dados, Timóteo Macedo, presidente da Solidariedade Imigrante (Solim), que tem quase 30 mil sócios, afirma que estes casos são comuns. O que aconselha as mulheres a fazerem é a participação ao Tribunal de Trabalho, com pedido de assistência jurídica gratuita para quem não pode pagar. O presidente da Solim diz que existe jurisprudência em relação a casos que envolvem imigrantes em situação irregular onde se faz a separação entre a situação jurídica do individuo em território nacional e a relação laboral com a entidade empregadora. “O que está em causa é a relação de trabalho e é ela que vai ser julgada”, afirma. Em muitos casos, o empregador chega a acordo e acaba por pagar ao trabalhador o montante em dívida, sem ir a tribunal. Aconselha que se faça um processo colectivo: quanto mais trabalhadores participaram, mais força terá a acusação. Este caso faz-lhe lembrar o que acontecia no final dos anos 1990 na construção civil em que os patrões faziam “chantagem” com os imigrantes sem documentos. “As pessoas que não tenham medo. A justiça está do lado delas”, afirma.

“Ele continua fazendo a mesma coisa e fica impune”, comenta Filipa que diz ter trabalhado em casa deste funcionário público durante quase três meses

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) diz "que o não pagamento de trabalhadores, em situação regular ou não, deve ser participado no âmbito da protecção laboral". Se envolver tráfico de seres humanos e exploração ou angariação de mão-de-obra ilegal, a investigação pode ser atribuída ao SEF por determinação do Ministério Público que tem a tutela da acção penal.

27.10.16

Como é que as marcas não sabem dos sírios a trabalhar ilegalmente?

Maria João Guimarães, in Público

Como é que as marcas não sabem dos sírios a trabalhar ilegalmente? As roupas estão penduradas, imaculadas, numa loja da Marks & Spencer em Londres. Quem as passou a ferro? Terá sido uma criança síria, que está 12 horas por dia a lidar com ferros e vapores, ganhando pouco mais de um euro por hora? E quem deu o ar usado àquelas calças de ganga na montra da Mango ou da Zara? Terá sido um refugiado sírio a trabalhar, ilegalmente, as mesmas 12 horas, numa fábrica num beco em Istambul? Os casos são alguns dos apresentados pelo programa Panorama, da BBC, que denuncia o trabalho ilegal de refugiados sírios, muitos deles menores, em fábricas na Turquia que fazem roupa para marcas como as britânicas Marks & Spencer e Asos, ou as espanholas Mango e Zara.

Todas estas marcas, sublinha a BBC, dizem que supervisionam as suas cadeias de fornecimento e não aceitam trabalho infantil ou de refugiados a trabalhar sem papéis.

O problema, diz a organização Business & Human Rights Resource Center, que em Janeiro divulgou um relatório sobre o trabalho de refugiados nas fábricas de têxteis da Turquia, é que os mecanismos de supervisão das marcas, apesar de incluírem inspecções, não são sufi cientes.
Uma das razões é que as roupas não vêm todas das fábricas que a marca conhece e visita, havendo um sistema de subcontratação que passa sob o radar das inspecções, disse ao PÚBLICO, por telefone, Danielle McMullan, do Business & Human Rights Resource Center.

A Turquia, que é já o sexto fabricante de têxteis do mundo, recebeu um grande número de refugiados da Síria: cerca de três milhões, dos quais metade, segundo a UNICEF, são menores. Um estudo da Universidade de Hacettepe, em Ancara, citado pela emissora árabe Al-Jazira, dizia que um refugiado a trabalhar na Turquia será mais provavelmente um menor do que um adulto, até porque aprendem a língua mais depressa. A Turquia tem dado autorizações de trabalho a refugiados, mas aos mais qualifi Investigação da BBC encontra trabalho ilegal de refugiados sírios, alguns deles crianças, em fábricas de roupa na Turquia. Marks & Spencer, Asos, Mango e Zara defendem as suas inspecções. O
Para Danielle McMullan, as auditorias não são a melhor solução por causa da subcontratação, em que a própria marca nem sempre sabe quais as fábricas a trabalhar para si.

É essencial, diz a responsável, que as marcas colaborem com sindicatos e organizações locais, que têm melhor informação.
E deixa um outro alerta: “A chegada de um enorme número de refugiados à Turquia faz com que haja um conjunto de circunstâncias único.
Mas os problemas de trabalho infantil e ilegal na indústria têxtil acontecem noutros países: são problemas globais da indústria.” mguimaraes@publico.pt cados. Segundo o Alto-Comissariado da ONU para os refugiados, mais de dois milhões de sírios não têm autorização para trabalhar na Turquia.

A investigação do Panorama diz que apesar de a Marks & Spencer não ter encontrado um único refugiado sírio a trabalhar nas instalações dos seus fabricantes na Turquia, o jornalista do Panorama, Darragh MacIntyre, viu sete sírios num dos locais, a ganhar pouco mais de uma libra (1,12 euros) à hora. O mais jovem, de 15 anos, passava 12 horas a passar roupa a ferro antes de esta ser enviada para o Reino Unido. “Se alguma coisa acontecer a um sírio, deitam-no fora como a um pedaço de tecido”, disse um dos refugiados.

A marca reagiu dizendo que oferecerá emprego legal permanente a quaisquer trabalhadores ilegais sírios que estejam em fábricas que produzam para si.

Outra fábrica em que o repórter da BBC encontrou crianças sírias estava a fabricar roupa para a loja online Asos. A empresa disse que esta não era uma fábrica aprovada por si. Desde a denúncia, foram encontrados 11 adultos sírios e três com menos de 16 anos a trabalhar no local.

Noutra fábrica turca foram encontrados vários refugiados sírios a trabalhar com gangas, com químicos que dão ao tecido um ar gasto, para a Mango e a Zara 12 por dia, sem protecção para estes produtos.

A Mango diz que a fábrica era subcontratada; a Inditex, grupo da Zara, refere que encontrou irregularidades numa auditoria em Junho e O grupo Inditex, de Amancio Ortega, detectou irregularidades numa fábrica que trabalha para a Zara em Junho, deu-lhe até Dezembro para as resolver
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24.11.15

Sinalizadas 29 vítimas de tráfico humano até setembro

in Diário de Notícias

Estatísticas mostram que este tipo de crime tem vindo a aumentar desde 2007. Exploração laboral é o principal fim

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) sinalizou, até setembro, 29 vítimas de tráfico de seres humanos, 17 das quais para exploração laboral, havendo 28 investigações de tráfico a decorrerem, 18 das quais começadas em 2015.

De acordo com dados do SEF enviados à agência Lusa, havia 28 investigações a decorrer no final do terceiro trimestre deste ano, dez das quais começadas noutros anos.

Destas 28 investigações, 13 estavam relacionadas com tráfico para exploração laboral, cinco com mendicidade, outras cinco com tráfico para exploração sexual, quatro tinham a ver com crianças e uma não está especificada.

Os dados estatísticos mostram que o tráfico para exploração laboral é o mais frequente em Portugal, com 17 pessoas, das 29 sinalizadas nos primeiros nove meses de 2015, a serem vítimas desta forma de exploração.

Das restantes vítimas sinalizadas este ano, cinco pessoas eram exploradas sexualmente e quatro eram alvo de servidão doméstica.

De acordo com o SEF, entre 2001 e 2014 foram condenadas 36 pessoas por tráfico de seres humanos, a maior parte relacionadas com exploração sexual.

Além do crime de tráfico de seres humanos, estavam associados lenocínio, associação criminosa, branqueamento de capitais, sequestro ou detenção de arma proibida.

Os dados estatísticos mostram igualmente que este tipo de crime tem vindo gradualmente a aumentar desde 2007 -- ano em que passou a estar tipificado no Código Penal -- passando de dois casos nesse ano para 13 em 2008, 16 em 2009, 10 em 2010, 13 em 2011, nove em 2012, 11 em 2013 e 23 em 2014.

A Lusa pediu ao Ministério da Administração Interna para ter acesso aos dados estatísticos de 2015 do Observatório de Tráfico de Seres Humanos, já que este organismo faz relatórios trimestrais, mas não obteve qualquer resposta.

A tendência de crescimento tem vindo também a ser percecionada pela Polícia Judiciária (PJ), que tem "notado um aumento em termos do número de inquéritos que estão em investigação".

Fonte da PJ apontou que é um tipo de investigação muito complexo, "com contornos muito difíceis de investigar", já que as vítimas são pessoas que estão numa situação de exploração, coação, privação de liberdade, o que faz com muitas vezes seja complicado fazerem queixa.

A mesma fonte apontou que antes da alteração legislativa, a principal dificuldade estava em conseguir fazer prova que depois suportasse a acusação em tribunal, o que fazia com a estratégia passasse por provar os crimes conexos, como o auxílio à imigração ilegal, o sequestro ou o lenocínio.

"Hoje o crime é prioritário. Tem havido uma preocupação muito grande em termos de formação e de divulgação dos direitos das vítimas e há uma sensibilidade muito maior quer por parte das forças de segurança, quer dos tribunais", sublinhou.

Na opinião do diretor-nacional adjunto do SEF, uma das principais dificuldades está em assegurar o contraditório nas audiências de julgamento, o que obriga a ter especial cuidado com as vítimas e com as testemunhas, mas sobretudo com a prova, sob pena de os criminosos serem absolvidos.

José Van Zer Kellen revelou à Lusa que em Portugal há algumas zonas problemáticas, que estão identificadas, sendo que o que varia nesses pontos negros são os fluxos migratórios que lhes estão associados.

"Em determinadas zonas temos uma prevalência de um determinado tipo de criminalidade organizada associada ao centro leste da Europa e há outras zonas, especificamente malhas urbanas, como Lisboa, onde temos alguma dinâmica muito própria daquilo que é um fluxo migratório com origem em África", apontou o responsável.

De acordo com José Van Zer Kellen, Portugal tem tido uma boa capacidade de resposta contra o tráfico de seres humanos e frisou que "não há uma grande dimensão de processos".

"A dimensão do tráfico é tanto maior quanto maior é a capacidade de atração económica que tem um país, não só para a questão da imigração ilegal, mas do próprio tráfico", sublinhou.