7.3.12

Insucesso e abandono escolar não serão combatidos com a nova revisão currricular, defende CNE

Por Clara Viana, in Público on-line

A proposta de revisão da estrutura curricular do ensino básico e secundário apresentada pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC) “não parece adequada” para fazer face aos “grandes problemas identificados” da escola portuguesa, como o grau de insucesso e de abandono escolar precoce.

Esta é uma das conclusões contidas no parecer sobre a proposta do MEC aprovado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), um órgão consultivo da Assembleia da República, que foi hoje publicado em Diário da República.
O CNE lembra, a propósito que “a taxa de abandono escolar precoce, geralmente provocada por insucesso repetido, atingia 28,7% em 2010”, quando a média da União Europeia se situa em menos de metade (14,1%). Segundo o CNE, na proposta apresentada pelo MEC “não é claro como se propõe combater este problema dos custos da repetência e da exclusão dos alunos que à escola cabe ensinar e educar”.
Para este órgão, as alterações proposta pelo MEC “eliminam elementos estruturantes do currículo vigente, o que indicia a adopção de um modelo diferente, mas não se explicita o verdadeiro alcance da mudança”. Na proposta também não é explícito em que medida as alterações previstas irão contribuir “para que mais alunos aprendam e aprendam mais”. O CNE considera que “é necessário clarificar em que medida as alterações profundas na composição social das escolas foram tidas em conta nesta reformulação”.
Estas alterações serão aprofundadas a partir do próximo ano lectivo com a chegada ao ensino secundário da primeira vaga de alunos abrangida pela escolaridade obrigatória até aos 18 anos, um cenário que é ignorado na proposta do MEC. Do alargamento da escolaridade obrigatória “decorre também a substituição de uma escola selectiva por uma escola que sabe acolher todos os alunos”, frisa o CNE, defendendo que “esta alteração fundamental na função e finalidades da escola acarreta mudanças quer nos conteúdos do que a escola transmite, quer na forma como o faz, quer no mandato dos professores, quer na criação de vias diferentes, quer na própria duração do dia escolar”.

Menos disciplinas
Com o reforço proposto da carga horária das ciências humanas e sociais e das ciências físicas e naturais, e a continuação de mais horas para língua portuguesa e matemática, estas disciplinas ocuparão no 3.º ciclo “uma percentagem de 91% do currículo obrigatório ocupando a educação artística e tecnológica e física apenas 19%”, constata o CNE, que critica também a eliminação prevista “de um espaço específico orientado para a formação cívica”.
O CNE recomenda que não seja eliminada uma das opções anuais do 12.º ano, por considerar que esta medida “poderá limitar o campo de experiências em que se baseia a escolha de percursos escolares e profissionais”. E também que se opte por maior flexibilidade no currículo. “O fechamento em componentes controladas a nível central, a limitação da oferta a um determinado tipo de conhecimentos, aliados a uma restrição dos espaços de decisão das escolas não facilitam a resposta adequada a exigências diferentes e são, portanto, mais compatíveis com populações homogéneas e mais previsíveis”, alerta.
Os desafios colocados pela nova escolaridade obrigatória, e não só, aconselham “a que seja atribuído tempo” ao debate sobre a reforma curricular, que deve ser pensada desde o 1.º ciclo ao ensino secundário, e com as diferentes modalidades de ensino em vigor nas escolas", defende o CNE, acrescentando que um debate com mais tempo possibilitaria “uma participação mais alargada e intensa e um repensar destas teorias de forma fundamentada”.