in Jornal de Notícias
O serviço SOS Criança está a receber telefonemas de crianças preocupadas com a "instabilidade do mundo laboral dos pais" devido à crise, disse o coordenador do serviço, Manuel Coutinho.
"As crianças têm noção da realidade e vão começando a ver que os pais dos colegas estão desempregados, que as situações começam a chegar a um limite" e temem que o mesmo aconteça à sua família, adiantou o psicólogo e secretário-geral do Instituto de Apoio à Criança (IAC), citado pela Agência Lusa.
Manuel Coutinho adiantou que estes relatos estão a chegar com "mais expressão" ao serviço do Instituto de Apoio à Criança, que ao longo de 24 anos atendeu mais de 77 mil chamadas telefónicas, a maioria de apelos de crianças em risco, maltratadas, abusadas sexualmente e desaparecidas.
"Eu gostava que a crise fosse mais um problema dos adultos e não um problema que chegasse às crianças", disse o responsável pelo serviço, desejando ainda que "todos os adultos do país contribuíssem para que as crianças não fossem novamente vitimizadas por esta situação de carência".
À frente do serviço há mais de duas décadas, Manuel Coutinho disse que não esperava "nos tempos breves" assistir ao "síndroma do mundo mau, que aflige hoje as crianças.
"Era algo que eu achava que nos tempos breves nunca iria acontecer, mas infelizmente aconteceu porque o mundo está muito difícil de gerir e as pessoas estão muito aflitas e muitas delas em sofrimento grave", adiantou.
Para ultrapassar esta situação, o responsável disse que os portugueses devem estar todos solidários e perceber como podem "ajudar e tranquilizar o mais possível estas crianças".
O telefone do SOS Criança é hoje considerado "pela maioria das pessoas um serviço de primeira necessidade". Ao serviço têm chegado chamadas de utentes a perguntar para onde podem orientar os seus bens para ajudar instituições de solidariedade.
Contudo, lamentou, não têm aparecido casos concretos de adultos a apresentarem casos de famílias em situação de maior de vulnerabilidade e fragilidade que possam colocar em risco as crianças.
Para o psicólogo, era desejável que os portugueses começassem a apresentar estes casos às instituições de forma a ajudar as crianças e evitar que passem por situações de risco e negligência.
"É bom que a sociedade esteja alerta para que possamos chegar mais rápido aos que mais necessitam", acrescentou.
O serviço telefónico SOS-Criança (116111) recebeu este ano 2.554 chamadas, a maioria relacionada com crianças em risco, negligência, maus tratos e abusos sexuais, além de muitos jovens que ligam para o SOS-Criança para desabafar e apresentar os seus problemas.
Criada em 1988, o SOS-Criança é um serviço anónimo e confidencial, de apoio às crianças e familiares, que pretende dar voz aos mais jovens, promovendo e defendendo os seus direitos.
É um serviço de prevenção que pretende atuar antes que a situação de risco se concretize.