2.4.13

Gap year. O que fazer após o secundário? Intervalar, viajar e crescer

Por Diogo Pombo, in iOnline

Tirar um ano sabático antes da universidade é raro. PS recomendou que governo incentive a prática


“Não dizemos ‘faz, faz e faz’, não passamos horas a tentar convencer, apenas sugerimos.” Foi assim, confiante e cheio de entusiasmo, que, aos 19 anos, Gonçalo Silva resumiu ao i a missão da associação que criou e a que preside desde Outubro de 2012. A Gap Year Portugal incentiva hoje os jovens a realizarem um ano sabático, a intervalarem, a optarem por outro rumo após concluírem o ensino secundário. Em breve, a associação poderá contar com um apoio de peso – no início deste mês, o PS submeteu a discussão na Assembleia da República um projecto de resolução em que “recomenda ao governo a adopção de medidas de divulgação e apoio” a uma prática que, em português, se traduziu por ano sabático. A sua transferência para a sociedade portuguesa, porém, era até há pouco tempo “um tema adormecido”.
Concluído o 12.o ano, Gonçalo Silva garantiu a entrada na universidade, mas adiou-a. Tirou um ano para viajar pelo mundo, fazer voluntariado, estagiar, conhecer pessoas, culturas, lugares e enfrentar desafios. Tudo isto cabe num gap year, uma experiência que, aos 17 anos, o rapaz confessou que “era quase utópica” e até estava “longe de ser um sonho”. “Nas aulas transmitiam-nos a ideia de que que os pais não iam deixar, que era muito caro e difícil de concretizar”, lembra Gonçalo, hoje com 19 anos e já sedentário num curso de Economia em Lisboa. Entre 2011 e 2012, porém, o jovem foi nómada durante mais de seis meses, um período em que se baseia para resumir as vantagens de realizar um gap year.
“A primeira e mais prática é a de regressar a Portugal com certezas do que queremos fazer no mercado de trabalho”, defende, pois, “se for bem feito”, é suposto que cada jovem “procure trabalhos e estágios na área que quer seguir” durante a sua viagem. Os “horizontes mais abertos, a facilidade de adaptação a novas situações [e] e maior destreza” foram outros dos factores referidos por Gonçalo Silva, antes de realçar, por último, o peso que o gap year pode ter no curriculum: “No momento do recrutamento, são supervalorizados os conhecimentos ganhos a par da vida académica”.

Diz quem sabe O caso de Gonçalo, contudo, é especial. O financiamento do seu ano sabático ficou a cargo da Fundação Lapa Lobo (FLL), que se propôs a cobrir os custos da sua viagem – e a de Tiago Marques, co-fundador da Gap Year Portugal, com quem viajou – após o líder da instituição assistir ao seu discurso sobre o tema durante um evento organizado pela instituição. Na mesma situação estão hoje Diogo Pedrosa e Rúben Ferreira.
Enquanto este texto estava a ser escrito, ambos os jovens estavam a bordo de um autocarro, na América do Sul, a numa viagem de 23 horas até Santiago, capital do Chile. Antes, por email, ainda tiveram tempo para contar ao i as vantagens, “enormes” e “inúmeras”, que eles próprios já retiram da experiência. “Agora que olho para trás e vejo o Diogo de há um ano, tenho a certeza que não estava preparado para entrar na faculdade. Era irresponsável, não fazia ideia do que era gerir dinheiro para as despesas do dia-a-dia”, reconhece, antes de Rúben revelar que “agora sente que é mais responsável”, pois tem “maior noção do que é viver sem depender dos pais”. Ambos concordam numa outra vantagem: a experiência dar-lhes-á “mais curriculum” e vantagem “no momento de procurar emprego”. Algo que outras experiências, como o Erasmus – programa universitário em que, durante seis meses ou um ano, um aluno estuda numa faculdade estrangeira – também podem dar.
O que escolher então? Como exemplo, o i colocou a pergunta a uma dezena de jovens que ainda frequentam o 12.º ano, e a balança acabou por pesar mais para o lado do gap year. Seis estudantes admitiram que, se pudessem escolher, preferiam realizar um ano sabático, e as razões foram várias: desde ser “uma experiência mais completa que Erasmus” até à possibilidade de “fazer voluntariado e viajar antes de entrar para a faculdade”. Para Gonçalo Silva, o gap year ganha por estimular “um crescimento mais exponencial” e “por fugir mais ao convencional”.

Governo a apoiar? No início de Março, a Gap Year Portugal foi à comissão parlamentar de Educação apresentar a associação, e acabou por convencer vários deputados do PS. Rui Pedro Duarte foi um deles e um dos nomes que subscreveu o projecto de resolução, onde o partido “recomenda o governo” a promover “o conceito e uma maior disseminação da cultura de ano sabático pela rede de estabelecimento de ensino público em Portugal”. Para Rui Pedro Duarte, é necessário “desmontar a ideia” associada ao gap year – de ser “um ano de inutilidade pública”. O deputado defende ser “preciso encorajar os jovens a participarem” no que antes considera ser “um ano de crescimento individual, para ganhar rede e conhecimento do que vai ser o seu futuro profissional”. O projecto não pretende criar qualquer tipo de programa de financiamento, como socialista esclareceu, ao sublinhar que “no limite”, a intenção é “promover a prática” para que seja de “conhecimento comum” e não “um privilégio de alguns”.