15.4.13

Trabalhar no Estado rende cada vez menos. Cortes vão aumentar

Por Margarida Bon de Sousa, in iOnline

Funcionários públicos perdem últimas regalias. Na reforma, no trabalho para toda a vida e até mesmo nas carreiras especiais


O Estado não vai fechar nem falir, mas as reestruturações estão à porta, à semelhança do que tem vindo a acontecer no sector privado desde a crise do Lehman Brothers, em 2008. E a receita é cada vez mais idêntica: rescisões amigáveis, cortes permanentes nos salários e maior mobilidade.

Para já está em marcha um novo ajustamento salarial no Estado que inclui não só as empresas que giram na órbita pública e que já integram as contas nacionais como uma diminuição do fosso salarial entre as carreiras especiais e gerais na função pública. Tudo para compensar os cortes impostos pelo Tribunal Constitucional (TC) a quatro normas do Orçamento do Estado (OE) para este ano.

Estão nestes casos os vencimentos dos docentes universitários (incluindo reitores, vice-reitores, professores catedráticos, professores associados com agregação, professores auxiliares e leitores), os docentes do ensino superior politécnico, os médicos, enfermeiros, polícias, incluindo Guarda Nacional Republicana (GNR), militares dos três ramos das forças armadas, juízes e pessoal dirigente, entre muitas outras.

Carreiras especiais O objectivo é diminuir o peso destes vencimentos na massa salarial global paga pelo Orçamento do Estado. “As opções podem incluir a aplicação de uma tabela salarial única”, escreveu Passos Coelho, numa carta enviada na quinta-feira ao FMI, à Comissão Europeia e ao BCE, a que a agência Lusa teve acesso.

Outra revolução, que já está prevista na nova lei que vai enquadrar as relações dos trabalhadores e prestadores de serviços com a administração central, local e regional, é a subordinação destes contratos ao Código de Trabalho, o que representa uma aproximação progressiva dos dois tipos de vínculos, dispensando a renegociação das duas leis gerais em separado e criando condições cada vez mais idênticas para todos os trabalhadores portugueses.

Aliás, como o primeiro-ministro fez questão de realçar na mesma missiva, em linha com o que estabelece o acórdão do Tribunal Constitucional “que põe grande ênfase na equidade”.

Reformas aos 67 Mas a equidade não se fica pelos trabalhadores no activo. A aproximação também será feita nas reformas. Em cima da mesa está já o aumento da idade no sector privado dos actuais 65 anos para os 67, que deverá entrar em vigor até ao final deste ano. O mesmo será aplicado aos pensionistas do Estado, que ainda agora viram a idade legal subir para os 65 anos, o que provocou uma verdadeira corrida às aposentações ainda não contabilizada nas contas públicas. Uma incógnita: se se mantêm ou não as condições principescas de reforma atribuídas a alguns trabalhadores das carreiras especiais, incluindo os juízes do Tribunal Constitucional, os únicos que se podem aposentar aos 40 anos com 10 anos de serviço.

Indemnizações O pontapé de saída dado este ano pelo executivo para as rescisões por mútuo acordo no Estado aponta para que se venha a fixar uma compensação de 1,5 vencimentos por cada ano de trabalho. Mas a magnanimidade do executivo promete ser sol de pouca dura e adequar-se às metas fixadas para a redução de efectivos. Aqui também a aproximação entre os dois regimes é inevitável, pelo que, tendencialmente, as compensações deverão ser fixadas nos 12 dias por cada mês de trabalho, à semelhança do que está previsto vir a entrar em vigor no sector privado.

Ou seja, o chumbo do Tribunal Constitucional abriu uma nova etapa para a gestão dos recursos humanos públicos. Trabalhar no Estado compensa cada vez menos e quem não está preparado para se adaptar deve ponderar seriamente se esta não será a melhor altura para se ir embora. A partir de agora, é só a descer.