14.4.14

Danos colaterais

Por António Perez Metelo, Dinheiro Vivo

O mês de abril, sobretudo em anos como este, 40 anos depois da grande rotura com um passado opressivo, estimula os pronunciamentos públicos de questões particularmente dolorosas e difíceis de superar nos dias que correm. Há sempre vários lados de uma mesma questão e, se as democracias podem reivindicar para si a superioridade face a outros regimes políticos, é porque em liberdade é sempre possível encontrar pacificamente vias de compromisso e de progresso.

A petição, assinada por 35 mil cidadãos, para que se ponha no topo da agenda política o problema da sustentabilidade do pagamento da dívida, nas condições e ao ritmo que os tratados europeus impõem, reclama um amplo debate sobre uma questão espinhosa, que ameaça a qualidade de vida de milhões de portugueses nos próximos 20 ou 30 anos.

Os dados sobre o alastramento da pobreza em Portugal (que reportam a 2012 e nem espelham a situação crítica atual) são alarmantes. As medidas anunciadas pelo governo nem chegam a ser remendos.

Jovens quadros, forçados a emigrar para ver reconhecidos e valorizados os seus saberes e capacidades, lançam um manifesto para que se discuta como dar a volta à situação que os enxotou do país, já que é aqui que querem trabalhar e construir um futuro.

Uma reportagem televisiva mostra a realidade chocante das mulheres trabalhadoras discriminadas e penalizadas, pelos pequenos ditadores que, 40 anos volvidos, continuam a mandar nas relações laborais de demasiadas empresas em Portugal, pelo simples facto de terem filhos pequenos ou estarem grávidas.

Nada disto pode ser encarado como natural ou inevitável. Eu já tenho idade para saber que não há soluções fáceis. Mas importante é fazer caminho, caminhando. Sem esta sensação angustiante de que as questões sociais são danos colaterais de uma longa caminhada de equilíbrios económicos e financeiros - e não mais do que isso.

Tudo depende das prioridades atribuídas aos diversos aspetos da recuperação nacional. Tal como as coisas se apresentam, “o país” (isto é, as condições de realização dos negócios em Portugal) está melhor. Os jovens, os velhos, os pobres, a classe média, é que não conseguem dar por isso.

Redator principal do Dinheiro Vivo
Escreve à sexta-feira