4.4.14

Estudar as famílias lésbicas portuguesas para lhes dar voz

Texto de Amanda Ribeiro, in Público on-line (P3)

No seu doutoramento, Tânia Machado está a investigar a homoparentalidade no feminino. Depois do chumbo da co-adopção, a investigadora aponta para a fragilidade do papel destas mulheres: "Ajudaria na constituição da sua identidade maternal"

Procuram-se casais de mulheres — juntas, em união de facto ou casadas — que tenham a cargo filhos conjuntamente planeados, para aquele que será o “primeiro projecto de investigação que se foca especificamente nas famílias lésbicas planeadas em Portugal”, diz a socióloga Tânia Machado, apresentando o seu projecto de doutoramento.

Porque, em termos científicos e académicos, há uma “lacuna” no estudo da homoparentalidade em Portugal. Porque, em termos práticos, “é necessário dar visibilidade e voz a estas famílias”, saber se são discriminadas para saber como intervir. Além de que um estudo como este reforça o sentimento de comunidade destas famílias: "Elas podem ver que há outras iguais a elas, que não estão isoladas, que não são só elas que vivem aquele tipo de situação, boa ou má. (...) Que não são as únicas."

Em 2012, antes do chumbo da co-adopção, da ameaça de referendo e de todos os volte-faces que têm rodeado o tema, Tânia, que desde a licenciatura se tem dedicado ao estudo do género e da sexualidade, em particular à realidade das lésbicas, candidatou-se à bolsa de doutoramento da FCT com o projecto “Representações das mães lésbicas sobre a maternidade lésbica e estratégias de gestão da identidade maternal deteriorada” — o termo "deteriorada", um conceito da Sociologia, refere-se à discriminação em função de alguma característica não normativa, neste caso, a identidade sexual — guiada por dois grandes objectivos.

A socióloga de 26 anos, a frequentar o doutoramento na Universidade do Minho, quer perceber como é que elas se percepcionam, enquanto progenitoras e homossexuais, num contexto social “onde o seu estatuto maternal e a sua estrutura familiar ainda não são normativos”. Por outro lado, vai analisar como é que gerem a sua identidade maternal em interacção com quatro redes de sociabilidade: famílias de origem, amigos, vizinhos e colegas de trabalho ou empregadores. Isto é, como é que se apresentam, se assumem a sua identidade familiar, como é que interagem quotidianamente, e quais são as reacções dos interlocutores.

Co-adopção: pela identidade maternal

Num momento em que não existe enquadramento legal para estas famílias, Tânia aponta para a fragilidade da posição destas mulheres, principalmente daquelas que não dão à luz ou que não são as adoptantes (em Portugal, só a adopção singular está acessível a um homossexual). “Para além de não terem um reconhecimento social e legal, não existe um termo consensual que a defina e que defina o seu papel no seio da família. Fica num limbo em que não sabe o que é. Há uma ambiguidade identitária complicada e que a co-adopção ajudaria, de certa forma, a resolver. Ajudaria na constituição da sua identidade maternal.”

O estudo vai incidir apenas em mulheres por limitações académicas, mas também porque para elas é, por razões biológicas, mais fácil conseguirem concretizar a maternidade. Tânia, que espera concluir o doutoramento em 2016, está agora na fase de trabalho de campo, realizando entrevistas às interessadas. As informações recolhidas são confidenciais e é garantido o anonimato. Todas as mulheres que reúnam as condições solicitadas podem participar. Mais esclarecimentos disponíveis no site do projecto: Famílias Lésbicas Portuguesas.