9.4.14

Índia: Da pobreza ao empowerment

por Subir Gokarn, Anu Madgavkar, in Negócios on-line

A Índia, que está em período de eleições legislativas, tem alguns motivos para celebrar: a pobreza extrema está finalmente a recuar.

Em 2012 – duas décadas após o Governo ter lançado uma série de reformas económicas que tinham como objectivo a abertura económica – os números oficiais apontavam que a taxa de pobreza tinha atingido os 22%, menos de metade da taxa verificada em 1994. Mas é tempo para a Índia aumentar as suas aspirações. Escapar da miséria extrema, apesar de ser um marco importante, não é o mesmo que alcançar um padrão de vida decente e um sentido de segurança económica. Para esse objectivo há ainda muito a fazer.

De facto, a dimensão dessa tarefa está reflectida num novo relatório do “McKinsey Global Institute”, intitulado “India’s path from poverty to empowerment (dar ou ganhar poder)”, que utiliza um quadro analítico inovador, a linha de “empowerment”, para estimar os custos, para os cidadãos médios, de satisfazer oito necessidades básicas: comida, energia, habitação, água potável, saneamento, cuidados de saúde, educação e segurança social. De acordo com esta métrica, 56% da população da Índia, em 2012, “carecia de meios para satisfazer estas necessidades básicas”.

De forma surpreendente, este número é superior em mais de 2,5 vezes o número de pessoas que continua a viver abaixo da linha de pobreza na Índia. Ainda mais impressionante é que o “gap” de “empowerment” – ou seja, o consumo adicional exigido para trazer estes 680 milhões de pessoas para a linha de empoderamento – é sete vezes mais elevado do que os custos de erradicar a pobreza extrema.

Além disso, enquanto a linha de “empowerment” é uma medida do consumo individual, a capacidade ou vontade de uma família em gastar não é suficiente para garantir uma vida decente. As pessoas precisam também de ter acesso a infra-estruturas ao nível da comunidade como clínicas de saúde, escolas, redes eléctricas e sistemas sanitários. Mas a média de famílias indianas com carências ao nível dos serviços básicos é de 46%, com a gravidade destas deficiências a variarem amplamente de distrito para distrito.

O que pode o governo da Índia fazer para dar aos seus cidadãos a dignidade, o conforto e a segurança que merecem? Dado que cerca de metade dos gastos públicos actuais com os programas sociais falham em produzir resultados melhores para os mais pobres, simplesmente direcionar mais fundos através dos canais existentes provavelmente não terá um grande impacto.

Em vez disso, os políticos deviam focar-se em apoiar o emprego e os ganhos de produtividade – historicamente as armas mais potentes contra a pobreza. Claro que isto não será fácil. A economia indiana abrandou nos últimos anos. Se o crescimento económico mantiver a sua actual trajectória, sem reformas importantes, mais de um terço da população vai continuar abaixo da linha de “empowerment” em 2022 e 12% da população vai continuar presa na pobreza extrema.

Para evitar tal desfecho, o governo indiano devia prosseguir um conjunto de reformas ambiciosas que impulsionem o crescimento, estimulando as empresas a investirem, a crescerem e a contratarem. A agenda desta reforma devia ser baseada em quatro prioridades fundamentais:


- A criação de 115 milhões de postos de trabalho adicionais em sectores não agrícolas durante a próxima década para absorver o conjunto crescente de trabalhadores e acelerar a mudança para indústrias modernas.

- Duplicar o crescimento da produtividade na agricultura de forma a fazer com que a rendibilidade das fazendas indianas aumente para níveis alcançados por outros países emergentes na Ásia.

- Duplicar os gastos públicos reais (ajustados à inflação) em serviços sociais durante dez anos, com uma parcela grande deste aumento alocada para: preencher as lacunas dos serviços de saúde, para fornecer água limpa e potável e saneamento.

- Restruturação dos serviços sociais.

Com o conjunto acertado de medidas, mais de quinhentos milhões de pessoas podem transpor o limiar do consumo exigido para terem uma vida autónoma do ponto de vista económico e os indianos podem ganhar acesso a mais de 80% dos serviços básicos que necessitavam em 2011. Emprego e ganhos de produtividade podem contribuir com 75% dos ganhos potenciais. Por outro lado, o aumento dos gastos públicos apenas, sem medidas para melhorar a sua eficiência, iria contribuir com menos de 10%.

Para concretizar este potencial, os políticos deveriam eliminar as regulamentações obscuras que colocam obstáculos às empresas; acelerarem os projectos de infra-estruturas; tornar o mercado de trabalho mais flexível; remover as distorções de mercado e aumentar a formação profissional para os mais pobres e para as pessoas pouco instruídas. Ao mesmo tempo, deveriam trabalhar no sentido de que todos os gastos públicos sejam tão eficientes como nos estados indianos que têm os melhores desempenhos.

Tudo isto exige um compromisso forte para uma governação melhor e um foco contínuo nos resultados. As estratégias de senso comum – tal como melhorar a coordenação entre o elevado número de ministérios e departamentos que incluem a burocracia e que estabelecem uma agência com poder e responsabilidade para produzirem resultados em áreas prioritárias – podem ter de percorrer um longo caminho para cumprir esta exigência. Além disso, a tecnologia pode ser utilizada para agilizar os serviços estatais e fazer com que estes sejam mais transparentes.

Por fim, um relacionamento próximo entre os actores do sector privado e os actores sociais, assim como, com as comunidades locais pode ajudar a aumentar a eficiência, enquanto reduzem o fardo do sector público.

A jovem e dinâmica população da Índia exige uma melhor qualidade de vida. Com uma vontade política forte e persistente e com políticas orientadas para os resultados, o governo indiano pode dar essa qualidade de vida.

Subir Gokarn, antigo vice-governador do Banco da Índia, é actualmente director de Investigação na “Brookings India”. Anu Madgavkar é um dos membros séniores da “McKinsey Global Institute”.

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2014.
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Tradução: Ana Laranjeiro