25.2.21

Líderes da UE insistem na coordenação, mas medidas de combate à pandemia continuam

Rita Siza em Bruxelas, in Público on-line

Conclusões do Conselho Europeu apontam para a manutenção de “restrições rigorosas” nas fronteiras. A aceleração da campanha de vacinação é a maior preocupação e a grande prioridade dos 27.

Ao fim de um ano, e de muitas medidas com carácter de emergência e duração limitada, os chefes de Estado governo da União Europeia continuam a discutir a necessidade de acertar as suas acções no terreno e coordenar melhor os esforços no combate à pandemia de covid-19.

Há sempre elementos novos no debate entre os líderes europeus: esta quinta-feira, serão as “questões mais técnicas” ligadas à propagação das novas variantes e a adaptação das vacinas às mutações do vírus, a generalização do recurso aos testes rápidos antigénios e a emissão de certificados de vacinação que vão estar em cima da mesa da reunião, mais uma vez virtual, do Conselho Europeu.

Mas a questão de fundo — e que é política — é a mesma desde que o novo coronavírus irrompeu no continente, em Fevereiro de 2020: como evitar que, à custa de uma pandemia, as quatro liberdades garantidas pelo mercado único europeu fiquem reduzidas a apenas três, por força dos controlos fronteiriços e todas as outras restrições impostas à livre circulação de pessoas?

Os 27 ainda procuram a melhor resposta para essa pergunta. Apesar da incompreensão e críticas motivadas pelas decisões unilaterais de seis Estados membros (Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Hungria e Suécia) que este mês voltaram a fechar as suas fronteiras para impedir o contacto das suas populações com as novas variantes, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, entende que essas medidas não devem ser postas em causa.

“A situação epidemiológica mantém-se bastante grave, ainda estamos num momento em que todas as deslocações não essenciais devem ser desencorajadas”, considerou uma fonte europeia, que reconhecia que “as liberdades de que os europeus gozam desde o início da crise são menores” e que as restrições impostas “têm implicações no funcionamento do mercado único”. Ao mesmo tempo, dizia que não existe outra alternativa que não “limitar os movimentos agora, para evitar a propagação das novas variantes”.

“Não cabe ao presidente do Conselho Europeu julgar as decisões tomadas por vários governos para travar as contaminações”, observou o mesmo responsável, que remeteu para as duas recomendações aprovadas pelos 27 relativas a viagens dentro da UE e para o território europeu, e lembrou que é à Comissão que compete verificar se as restrições aprovadas pelos Estados membros são conformes aos tratados (o executivo enviou cartas a ameaçar a abertura de procedimentos de infracção se as medidas não forem corrigidas num prazo de dez dias).

Entre os líderes não parece haver apetite para arrastar o debate e a polémica sobre as restrições e controlos nas fronteiras. Alguns, principalmente os do Sul da Europa, preocupados com a possível perda de mais uma época turística no Verão, preferem avançar na discussão dos certificados de vacinação. Para já, esse debate prossegue apenas ao nível técnico, em colaboração com o Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças e a Organização Mundial de Saúde, e não se espera que evolua muito para além disso em termos políticos.

“Há pouca clareza sobre a matéria e são precisos mais dados científicos”, diz fonte europeia, justificando a posição de países como a França ou a Alemanha que não têm o tema na lista das suas prioridades. Ainda assim, Charles Michel quis colocar a questão na agenda, para sinalizar o interesse num compromisso que evite que, mais uma vez, os governos tomem decisões unilaterais ou assinem acordos ad-hoc com países terceiros.
Intensificar esforços

Assim, no rascunho das conclusões do Conselho Europeu, a que o PÚBLICO teve acesso, os 27 apelam à “prossecução dos trabalhos relativos a uma abordagem comum no que respeita aos certificados de vacinação”. Enquanto isso, defendem que devem manter-se “restrições rigorosas (…), de acordo com os princípios da proporcionalidade e da não-discriminação, e tendo em conta a situação específica das comunidades transfronteiriças”. E “simultaneamente” devem intensificar-se os esforços para “acelerar o fornecimento de vacinas”.

É nas dificuldades que persistem no abastecimento dos países europeus, e no comportamento das três farmacêuticas cujas vacinas já foram aprovadas pela Agência Europeia do Medicamento, que as atenções dos líderes estão concentradas: o apelo que deixaram no final da última reunião do Conselho Europeu (21 de Janeiro) para a aceleração da campanha de vacinação só se tornou mais dramático, depois de a UE ter ficado para trás de outros parceiros em termos do acesso e administração da vacina.

“Temos de acelerar urgentemente a autorização, a produção e a distribuição de vacinas, bem como a vacinação”, dizem as conclusões do Conselho Europeu, onde os 27 expressam mais uma vez o seu apoio à estratégia da Comissão e aos seus esforços “para trabalhar com a indústria no sentido de aumentar a actual capacidade de produção de vacinas, bem como adaptá-las às novas variantes, consoante necessário”.

O investimento no reforço da produção e na investigação e desenvolvimento de vacinas tinham sido as duas acções apontadas como fundamentais para ultrapassar os bloqueios da campanha europeia numa carta conjunta do primeiro-ministro, António Costa, e da presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, enviada às capitais a 2 de Fevereiro.

Na véspera do Conselho Europeu, uma nova missiva, subscrita pelos chefes dos governos de Espanha, Bélgica, Dinamarca, Lituânia e Polónia, defendia que os recursos deviam ser concentrados no apoio aos produtores de vacinas assentes na tecnologia ARNm (ADN mensageiro), como é o caso do consórcio Pfizer/BioNTech e Moderna, e na promoção de parcerias público-privadas através de toda a cadeia de valor no fabrico de vacinas.

No gabinete de Charles Michel, as reivindicações não foram interpretadas como um novo ataque contra a companhia anglo-sueca AstraZeneca, que esteve na linha de fogo da Comissão depois de ter comunicado uma redução das entregas das doses previstas para o primeiro trimestre do ano, e viu a eficácia da sua vacina ser questionada por políticos como o Presidente francês, Emmanuel Macron. “A estratégia agora é de aumentar a produção de todas as vacinas que são eficazes, e não apenas as de ARNm”, vincou fonte europeia.

Para isso, o presidente do Conselho Europeu já não fala no eventual recurso ao artigo 122 do Tratado de Funcionamento da UE, que permitiria à Comissão assumir o controlo da produção de vacinas ou os direitos de propriedade intelectual das farmacêuticas — como reclamam vários grupos políticos do Parlamento Europeu. “Preferimos a cooperação à obrigação”, comentou a mesma fonte.

Nas conclusões do Conselho, os 27 confirmam a disponibilidade para “facilitar a celebração de acordos entre fabricantes em todas as cadeias de abastecimento” e “examinar as instalações existentes para ajudar a aumentar a produção na UE”, e repetem o aviso às empresas que “devem assegurar a previsibilidade da sua produção de vacinas e respeitar os prazos contratuais de entrega das mesmas”.