Paulo Sá, in DN
Estudo da Pordata mostra que Portugal melhorou "consistentemente" nos indicadores de pobreza e exclusão social, abandono escolar, desemprego de longa duração, entre outros. Mas continua a ter um PIB per capita mais baixo do que a média europeia e mais desigualdade.
No Dia Mundial da Justiça Social ficamos a saber, por um estudo da Pordata, que Portugal tem vindo a reduzir a miséria no país, mas ainda tem 2,2 milhões de pessoas, ou seja, dois em cada dez residentes, em situação de pobreza e exclusão social.
Em plena presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, a Pordata, projeto da Fundação Francisco Manuel dos Santos, lança um conjunto de indicadores capazes de traçar o retrato de Portugal e dos 27 e o percurso relativo aos objetivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, ao longo das últimas décadas e dos próximos dez anos.
Os dados apurados, com base na informação do Eurostat, mostram que há ainda 91 milhões de pessoas (21%) em situação de pobreza e exclusão social na União Europeia (UE) e mais de dois milhões (22% da população) estão em Portugal, que ainda assim superou em 2017 a meta de redução da pobreza prevista para 2020, ao ter conseguido retirar 543 mil residentes das condições mais precárias de vida, o que lhe confere o sexto lugar entre os 27 com a evolução mais positiva nos últimos cinco anos.
Índices de pobreza mais acentuados têm a Bulgária, a Roménia e a Grécia, e os países com menor proporção neste indicador são a República Checa, a Eslovénia e a Finlândia (inferiores a 12%). E há Estados que viram aumentar os seus níveis de pobreza desde 2008, como Espanha, Suécia, Holanda, Itália, Grécia, Dinamarca, Luxemburgo, Estónia, Malta e Chipre.
A diretora da Pordata, Luísa Loura, sublinha ao DN a importância de acompanhar estes indicadores, sobretudo num momento em que vivemos uma crise sanitária, mas também económica e social e que se prolongará no pós-pandemia.
"Não é preciso fazer futurologia para perceber que o indicador da pobreza e exclusão social se irá agravar", diz, anunciando o mesmo para o das desigualdades sociais: "Haverá novas franjas, dada a crise que vivemos, que ficarão nas margens, mas numa situação transitória porque terão níveis de educação superior."
Luísa Louro dá o exemplo dos profissionais do setor da cultura, que têm um nível alto de instrução, mas que estão a ser fortemente penalizados pela pandemia na sua atividade profissional.
O limiar a partir do qual se define a pobreza nos vários países da UE é muito diferente. Em Portugal, situava-se, em 2019, em 580 PPS mensais - uma moeda fictícia que significa "paridade de poder de compra padrão" e serve para comparar os níveis de bem-estar e de despesa entre países, anulando a diferença de níveis de preços. Assim, no Luxemburgo, o limiar da pobreza situa-se nos 1447 PPS mensais e menos de 367 mensais na Roménia.
Empregados e casas pobres
Em 2019, segundo o mesmo estudo, em Portugal, 11% da população empregada era considerada pobre, ou seja, vivia com rendimentos inferiores ao limiar de risco de pobreza. O que nos coloca entre os cinco países em maior risco de pobreza entre trabalhadores (os outros quatro são Roménia, Espanha, Luxemburgo e Itália). Já na Finlândia e na República Checa, menos de 4% da população empregada está em risco de pobreza.
A taxa de risco da pobreza é a percentagem de pessoas que têm rendimentos considerados baixos em relação à restante população, e a linha de pobreza varia de país para país, isto é, uma pessoa considerada pobre em Portugal pode não o ser noutro dos 26 Estados membros. Por cá, considera-se no limiar da pobreza quem auferir menos de 501 euros mensais.
Desigualdade
O nosso país é também o oitavo a nível da UE com maior desigualdade entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres. Os primeiros ganham cinco vezes mais do que os segundos. Na Bulgária essa diferença é oito vezes mais. Já República Checa, Eslováquia e Eslovénia são os que apresentam menor diferença na desigualdade (três vezes mais).
A Pordata regista ainda que, entre 2010 e 2019, onze dos 27 países da UE, entre os quais não está Portugal, aumentaram as desigualdades na distribuição de rendimentos.
Portugal é o nono país com menor PIB per capita dos 27, abaixo da média europeia, duas vezes menor do que, por exemplo, o irlandês e três vezes menor do que o luxemburguês.
Habitação e educação
O estudo mostra ainda que cerca de uma em cada quatro pessoas (24%) vive no país com más condições de habitação, proporção só ultrapassada por Chipre (31%), sendo certo que 13% da população europeia reporta não ter boas condições em suas casas. Este indicador mede a percentagem de população com pelo menos um dos défices básicos nas condições das habitações: um telhado que deixa entrar água, paredes/soalhos/fundações húmidas ou apodrecimento dos caixilhos das janelas ou do soalho.
Ainda no que diz respeito ao conforto das habitações, Portugal é o quarto país dos 27 com maior proporção de população (19%) que não se consegue manter quente adequadamente, um valor que ainda assim decresceu 17% em 15 anos. Só a Bulgária (30%), Lituânia (27%) e Chipre (21%) registam maiores proporções.
Outro dos indicadores importantes do estudo da Pordata neste Dia Mundial da Justiça Social é o da educação, que mede a taxa de abandono escolar precoce. Portugal é o sétimo país a registar maior taxa de abandono escolar em 2019 (10,6%). Mas foi o segundo país, a seguir a Malta, que mais viu decrescer o abandono escolar entre 2002 e 2019. Recorde-se que a escolaridade obrigatória até ao 12.º ano foi aprovada em 2009 e entrou em vigor no ano letivo de 2012-2013.
"O ponto de partida de Portugal em 2002 era de 45% de abandono escolar precoce, valor só superado por Malta, com 53%", refere o estudo. Em 2019, Portugal já tinha taxas inferiores a países como Espanha, Itália, Bulgária, Hungria e Roménia e o Instituto Nacional de Estatística, (INE) divulgou que em 2020 a taxa de abandono escolar ficou pelos 8,9%, bastante inferior à meta de 10% definida pela Estratégia Europa 2020.
"Há uma melhoria consistente nos indicadores de Portugal, nalguns casos espetacular, como é o do abandono escolar", afirma a diretora da Pordata. Luísa Loura lembra que Portugal partiu de uma "situação muito complicada", com elevadas taxas de analfabetismo, durante a ditadura, em que o investimento na educação era muito fraco. "Os que tinham educação era de bom nível, mas não havia condições de acesso às crianças à escola", frisa.
Luísa Loura considera que "parecia impossível" atingir a meta de 10% dos jovens que não frequentam o ensino secundário ou não estão a estudar. "Conseguimos um percurso consistente de escolarização dos nossos jovens. E este indicador é muito importante para tudo, é o capital humano que está a ficar em toda a Europa e é uma mais-valia neste momento de crise", afirma a também investigadora universitária. "É um capital que não se perde", insiste.
Mas o "impossível" foi conseguido. Em Portugal, a taxa global de jovens não empregados, que não estão em educação ou formação, é de 9%, valor que representa um decréscimo de sete pontos percentuais face ao valor máximo atingido em 2013 (16%).
Na União Europeia, a taxa dos jovens entre os 15 e os 29 anos nestas condições foi de 13%, sendo mais acentuada nas mulheres (15% versus 11%).
No que diz respeito à taxa de desemprego de longa duração - 12 ou mais meses -, caiu mais de sete pontos percentuais desde 2013, ano em que atingiu o máximo de 9,3%. Este foi um ano em plena concretização do programa de ajustamento imposto pela troika, depois da crise económica de 2011 que obrigou Portugal a pedir o resgate financeiro.
Portugal é assim o sexto país com maior taxa de desemprego de longa duração (2,8%), valor semelhante à média da União Europeia, que, em 2013 e 2014, também atingiu o seu valor mais elevado (5,5%). Na Grécia, este tipo de desemprego atinge os 12%.