por Margarida Davim, in Sol
A mãe a quem tiraram sete filhos para adopção arranjou emprego e está a legalizar-se. Graças a uma onda de solidariedade, está agora confiante no recurso para a Relação, que visa recuperar as crianças.
Mais de um ano depois de o Tribunal de Sintra lhe ter retirado sete filhos, a cabo-verdiana conseguiu um emprego e está a meio do processo de legalização. Com a ajuda de anónimos que se organizaram para a apoiar, Liliana pode estar mais próxima de reaver a guarda dos menores.
“Estou a lutar e não desisto de voltar a ter os meus filhos”, assegura Liliana Melo, que está há um mês a trabalhar como empregada doméstica em casa de uma família que ficou chocada com a sua situação e quis dar-lhe uma oportunidade. “Está tudo a correr muito bem no trabalho. Estou muito contente”, conta a mãe da Tapada das Mercês (Sintra), que ficou conhecida depois de o SOL noticiar em Janeiro que tinha perdido a guarda de sete dos seus dez filhos, depois de se recusar a laquear as trompas, incumprindo o acordo de promoção e protecção de menores que tinha assinado.
A história não passou despercebida a Pedro Leite Pereira, leitor assíduo do jornal, que no próprio dia criou um grupo no Facebook para ajudar Liliana. Em pouco tempo, juntou mais de três mil pessoas dispostas a apoiar. “A Liliana não vive da mendicidade e a ideia não é sustentá-la”, frisa Leite Pereira, explicando que rapidamente percebeu estar perante “uma família pobre, com grandes dificuldades, que merecia ter sido ajudada”.
E ajuda não tem faltado. Apesar de a grande maioria dos membros do grupo – que se intitulou ‘Mãe a quem foram retirados sete filhos por recusar a laqueação de trompas’ – não se conhecer pessoalmente, criou-se uma rede de “apoio moral e monetário”. Alguns dos que fazem parte do grupo já conheceram Liliana Melo, mas Pedro Leite Pereira e muitos dos cerca de 20 elementos mais activos apenas falaram com ela ao telefone.
Já pagou a renda com o salário
Não foram os únicos a ajudar. “Houve uma onda de solidariedade enorme. Muita gente ficou chocada e quis ajudar”, conta a advogada de Liliana, Paula Penha Gonçalves, que foi inundada com e-mails e telefonemas de gente disposta a apoiar a mãe a recuperar os filhos.
Até Liliana conseguir emprego, foram os membros do grupo do Facebook que se organizaram para a ajudar a pagar a renda da casa. “Mas em Julho já a pagou com o seu ordenado”, sublinha Pedro Leite Pereira, que está agora apostado em apoiar a emigrante a legalizar a sua situação no país para que possa beneficiar dos apoios da Segurança Social a que tem direito. “É bom que se saiba que a Segurança Social (ou seja, nós, contribuintes) dá 700 euros por criança aos centros de acolhimento. Por que razão não foi concedida metade dessa quantia a esta mãe, para que pudesse criar os filhos?” – questiona, explicando que é numa conta aberta pelo grupo do Facebook que se vai juntando dinheiro para pagar os passes de Liliana e das duas filhas que ainda estão com ela e “toda a papelada necessária para a legalização”.
Por estes dias, Liliana Melo divide-se entre o trabalho e as idas ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para se legalizar. O processo arrasta-se há três anos: “Falta sempre algum papel e muitas vezes não sabem explicar-me bem o que é preciso fazer. Mas estou a tratar de tudo”.
Enquanto isso, Liliana festeja outras vitórias: a filha de 11 anos que está à sua guarda teve nota positiva a todas as disciplinas. “Passou para o 7.º ano”, diz, orgulhosa e confiante de que isso ajude a mostrar que tem capacidades para criar os filhos que lhe tiraram.
O recurso para anular a decisão de entrega dos menores para a adopção subiu ao Tribunal da Relação na semana passada. “Ganhámos a questão relacionada com o prazo no Constitucional. A Relação vai agora apreciar não as questões formais, mas a matéria de facto”, adianta Paula Penha Gonçalves, que acredita que os progressos alcançados por Liliana podem ajudar.