14.4.14

Mulheres ganham menos e estão em minoria nos cargos de chefia

in Jornal de Notícias

A igualdade de oportunidades consagrada na lei às mulheres com o 25 de Abril concedeu-lhes o acesso a profissões que lhes estavam vedadas, mas ganham menos do que os homens e estão em minoria nas chefias.

Um sinal, segundo a socióloga Sara Falcão Casaca, do Instituto Superior de Economia e Gestão, de que a democracia é um "processo inacabado" e que a crise veio fragilizar mais, com o aumento do desemprego, "uma das maiores sombras do Portugal democrático".

Em 2013, referiu a socióloga, a taxa de desemprego rondava nas mulheres 16,4%, contra 16,1% nos homens, sendo que mais de 60% do desemprego feminino era de longa duração.

Para a ex-presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, o "risco de retrocesso" é grande, com a perda de independência das mulheres a significar perda de autonomia, da "possibilidade de conduzirem livremente a sua vida", uma das conquistas de Abril.

O 25 de Abril de 1974 marca a rutura, na lei, com as desigualdades de género: as mulheres passam, inclusive, a poder aceder a todos os cargos da carreira da administração local, bem como à carreira diplomática e à magistratura.

Contudo, 40 anos depois, contam-se pelos dedos as mulheres que lideram embaixadas - seis contra 55 homens - ou que são juízas no Supremo Tribunal de Justiça - apenas sete de um total de 67 juízes e nenhuma é presidente de secção.

Sara Falcão Casaca lembra que, com o 25 de Abril, "as mulheres tomam consciência da necessidade de investirem na sua educação".

Hoje, há mais mulheres diplomadas do que homens, mas, apesar das competências e de a Constituição estipular a igualdade no trabalho e no salário, elas ganham menos do que eles e estão afastadas das atividades tradicionalmente masculinas.

De acordo com o mais recente Censos, de 2011, as mulheres com o ensino superior concluído ascendiam a 754.337, enquanto os homens a 490.405. No entanto, o salário médio delas era inferior, 945,90 euros contra 1.195,40 euros.

Quanto mais qualificadas são as mulheres, "maior é o diferencial" remuneratório que têm face aos homens, assinalou a docente, sublinhando que os quadros superiores femininos ganham menos 29% comparativamente aos masculinos.

"O padrão que é valorizado é a representação tradicional do trabalhador isento de responsabilidades familiares. As mulheres são altamente penalizadas, porque ainda têm muito sobre os seus ombros o ónus das responsabilidades familiares", sustentou Sara Falcão Casaca à agência Lusa.

Se o emprego e o aumento da escolarização das mulheres foram um avanço, "não conseguiram diluir a segregação sexual".

"Continuamos a ter mulheres e homens concentrados em setores de atividade distintos, porque continuamos a ter padrões de socialização diferenciados em função do género", advogou Sara Falcão Casaca, acrescentando que "as opções educativas, formativas, as expectativas profissionais são moldadas pelas representações tradicionais de género e pelas expectativas de quem contrata".

Em 2013, salientou, 82% das pessoas empregadas no setor da Saúde e Ação Social eram mulheres e na Educação 77%, enquanto nos Transportes e Armazenagem resumiam-se a 18% e na Construção a 6%.

Nas opções formativas, as mulheres preferem as áreas da Educação e da Saúde, em detrimento da Engenharia, das Indústrias de Transformação e da Construção.

Apesar de igualmente qualificadas, elas estão em desvantagem em relação aos homens no que toca a cargos de topo, no setor privado e no setor público.

Nas empresas cotadas em bolsa, das 256 pessoas que fazem parte de conselhos de administração, apenas 18 são mulheres e nenhuma é presidente.

Mesmo na administração pública, um "setor feminizado", frisou Sara Falcão Casaca, somente 35% das mulheres ocupam cargos dirigentes.

Portugal nunca teve uma mulher chefe de Estado, apenas uma primeira-ministra, Maria de Lourdes Pintasilgo, em 1979-80, e só recentemente, em 2011, passou a ter uma presidente, Assunção Esteves, da Assembleia da República, segundo órgão de soberania, no qual somente um terço dos deputados são mulheres.

No Conselho de Estado, os homens estão, mais uma vez, em maioria - apenas dois dos seus 19 elementos são mulheres.

Sara Falcão Casaca é apologista de medidas de autorregulação nas empresas, que as incentivem a serem "amigas da família", e do regime de quotas femininas, uma medida "datada no tempo", com penalizações associadas, num reconhecimento de que "há uma situação de desigualdade que não é possível corrigir de outro modo em tempo aceitável, socialmente justo".

"Se a escolaridade não fosse obrigatória, muitas crianças não iam ainda à escola", ironizou.