Texto de João Camargo, in Público on-line (P3)
Em Portugal a tarefa é simples: foi o primeiro ministro que arremessou politicamente contra os jovens, humilhando-os e incitando-os à emigração
Após a leitura do texto “Eu, jovem emigrante, não sou uma arma de arremesso político” decidi, enquanto ex-emigrante e observador do que se passa no país e Europa, tentar esclarecer alguns pontos acerca da emigração:
1) Nos últimos três anos, Portugal assistiu à maior emigração registada na história do país, superior ao recorde de emigração dos anos 60;
2) Segundo o INE, em 2011 partiram do país 100.978 pessoas, em 2012 foram 121.418 e em 2013 foram 128.108; nada indica que haja um abrandamento deste êxodo em 2014: são já 350 mil em três anos;
3) Os principais estudos que existem acerca da motivação para a emigração em Portugal indicam que são o desemprego, a precariedade e os baixos salários que motivam as pessoas a emigrar (segundo a seguradora Zurich, 57% dos jovens portugueses pretendem emigrar devido à precariedade e ao desemprego);
4) A emigração em Portugal nos últimos anos é um fenómeno que começou por ser jovem mas que com o crescendo de austeridade e o agravar da precarização, atravessou toda a sociedade: 40% da população activa (todas as faixas etárias e com todos os níveis de habilitação) admitem emigrar embora preferisse ficar no seu país;
5) Entre os mais habilitados, por exemplo, na Ciência, apenas 21% dos bolseiros de investigação não admitem emigrar, associado ao facto de 78% não terem qualquer contrato de trabalho;
6) O desemprego combinado da Grécia, Itália, Espanha, Portugal e Irlanda ascende a 15,6 milhões de pessoas e estes países assistem a uma emigração quase sem precedente histórico:
7) 700 mil pessoas em Espanha emigraram nos últimos anos e 397.500 na Irlanda;
8) Na Grécia emigraram 119.985 em 2010 e 126 mil em 2011, depois disto não há mais registos;
9) Na Itália emigraram 39 mil pessoas em 2010, 50 mil pessoas em 2011 e 132 mil em 2012;
10) Estes são países historicamente de emigração, mas os fenómenos de êxodo que vivemos por estes dias são apenas comparáveis em termos de volume aos que ocorreram aquando da ascensão do fascismo em Itália nos anos 20, da Grande Fome em Irlanda em 1840, da Guerra Civil na Grécia nos fim dos anos 40 ou da Guerra Colonial e de alistamento militar forçado em Portugal;
11) O que as pessoas que emigram procuram noutros países é segurança no trabalho: 60,4% dos espanhóis, 57,1% dos irlandeses, 55,2% dos portugueses e 46,4% dos italianos (Zurich).
Com base nestes dados sinto-me compelido a responder que os jovens emigrantes são conclusivamente armas de arremesso político. Em Portugal a tarefa é simples: foi o primeiro ministro que arremessou politicamente contra os jovens, humilhando-os e incitando-os à emigração, saindo da zona de conforto, quando a maior parte dos mesmos vivia e vive na precariedade e no desemprego. O que move a maioria dos emigrantes é identificado com clareza: a incerteza, o desempoderamento, o desemprego, a precariedade.
As experiências individuais muitas vezes não são um bom espelho para descrever o mundo e a minha própria experiência de emigração voluntária não é realidade para centenas de milhares de expatriados. A Universidade da Sorbonne expôs, em Junho, que a diáspora portuguesa é hoje uma comunidade no limiar da pobreza e altamente precarizada, isto é, que encontra nos países para onde vai condições muito más de trabalho, muitas vezes iguais àquelas pelas quais partiu. É que o plano do empobrecimento não é um exclusivo — é global. Se somos arma de arre messo — e somos, infelizmente — a resposta não é negá-lo, mas sim saber como recuperar o controlo das nossas vidas — no país ou fora.