Abel Coentrão, in Público on-line
Missão Climate Neutral & Smart Cities foi lançada esta sexta-feira e está aberta à manifestação de interesse de cidades de toda a UE, a partir de Novembro.
Os autarcas eleitos no passado domingo ainda nem tomaram posse e esta sexta-feira foi já anunciado um desafio novo para aqueles que se preocupam com o desempenho ambiental do território que vão governar. A Comissão Europeia apresentou a missão para tornar as cidades neutras em carbono e ficou a saber-se que o programa Horizonte Europa vai alocar quase 360 milhões de euros para ajudar 100 áreas urbanas da UE a atingirem esse objectivo já em 2030. As eleitas terão ainda acesso a financiamentos de outras fontes para anteciparem, em 20 anos, as metas de redução de CO2 da União.
A iniciativa da comissão já tinha sido anunciada em Lisboa, durante a conferência Velo-city, pelo director adjunto da Direcção Geral de Mobilidade e Transportes da UE, Matthew Baldwin. Mas só esta semana, com o lançamento de cinco missões da UE que enquadrarão os investimentos em investigação e desenvolvimento do Horizonte Europa no ciclo 2021-2027 – que cobrem áreas como o cancro, a adaptação climática à escala regional e urbana, a qualidade dos solos rurais ou a recuperação dos ecossistemas marinhos – se ficou a perceber melhor os contornos da missão dedicada a pôr as cidades ao serviço dos objectivos climáticos da UE e do planeta.
Num seminário online que teve quase 1400 pessoas a assistir, Baldwin, que é o responsável executivo desta missão, anunciou a criação e o início do trabalho, esta sexta-feira, do Consórcio NetZeroCities que, depois de seleccionadas as cidades, ajudará a co-criar, com as autoridades políticas locais e o envolvimento do respectivo governo, dos seus cidadãos e agentes locais, um contrato. Que é, na verdade, um memorando de entendimento sem força legal mas assinado pelo presidente da Câmara, que definirá uma visão global, holística, sobre a forma de chegar à neutralidade carbónica nessa cidade e que será depois suportado por um plano de investimento, para objectivos e projectos concretos, também ele desenhado com o apoio do consórcio.
Cidades podem juntar-se
Apenas cidades com mais de 50 mil habitantes podem participar mas, segundo Matthew Baldwin, podem vir a ser aceites candidaturas de cidades contíguas, de um mesmo espaço metropolitano, por exemplo, desde que mostrem um grau de compromisso coordenado e as suas características interessem à diversidade de territórios que esta missão pretende cobrir. Por outro lado, uma cidade pode excluir da sua proposta parte do território cujo comportamento ambiental não controle (um porto comercial, por exemplo). Em todo o caso, deve existir um compromisso para integrar, no futuro, esse território, nos objectivos.
À semelhança do que acontece noutros programas, como o Interreg, serão depois abertas candidaturas para grupos de cidades, em vários países, que vão acolher projectos de investigação, desenvolvimento e aplicação de soluções nas mais diversas áreas (mobilidade, edificado, energia, gestão da água e dos resíduos, etc.). Brevemente vai ser apresentado um portfolio de actividades de Pesquisa e Desenvolvimento (R&D) voltados para o espaço urbano, a financiar pelo próximo ciclo do Horizonte Europa, mas Baldwin assinalou que outras iniciativas, tal como a Nova Bauhaus Europeia, vão também contribuir para este esforço de fazer das cidades espaços mais sustentáveis e mais acessíveis, através do contributo do design, neste caso.
Quanto a fontes de financiamento, para além dos 360 milhões de euros que o Horizonte Europa aplicará na Missão, os municípios escolhidos vão poder suportar os investimentos com outros programas europeus e a aceder a financiamento do Banco Europeu de Investimento. Matthew Baldwin insistiu, contudo, que a maior parte do dinheiro necessário para esta transição virá de investidores privados, que já estão a direccionar os seus negócios para áreas alinhadas com estes objectivos. Nas análises já feitas, estima-se que só 17% da verba necessária virá do orçamento municipal, explicou.
Fazer com as pessoas
Toda a missão assenta na necessidade de pôr em prática soluções inovadoras que acelerem o cumprimento dos objectivos e complementem as tecnologias já existentes, fazendo destas cem cidades uma espécie de farol para o resto do território urbano da UE, que depois terá vinte anos para replicar abordagens. E quando se fala em inovação, a equipa que lidera esta missão insiste que ela tem de surgir também na área da governança, na forma de levar a cabo o projecto. “Queremos fazer isto com as pessoas, não para as pessoas”, insistiu o chefe da missão, notando que não é só por amor à democracia participativa que insiste nesta tecla, mas por se ter percebido, já, que as mudanças exigidas só serão alcançáveis se as pessoas se envolverem, e acreditarem na bondade dos objectivos.
Ainda neste mês de Outubro a Missão, que já tem um espaço online, vai publicar um pacote de informações para ajudar os municípios interessados a preparar a sua candidatura. Esta será feita a partir de Novembro e até ao final de Janeiro através do preenchimento de um questionário. Em Março as 100 cidades terão sido já escolhidas e a meio do próximo ano começarão a trabalhar com a plataforma da Missão para a preparação dos memorandos de entendimento (contratos).
O número de cidades participantes poderá ser inferior ou superior a 100 - que é mais um número redondo, para a comunicação da iniciativa. O que Baldwin garantiu é que se o número de candidatas com um grau de compromisso elevado for muito superior, a Comissão Europeia tentará encontrar uma forma de as manter, a todas, envolvidas nesta ambição de atingir, bem mais cedo do que em 2050, a neutralidade carbónica.