28.10.21

Um em cada cinco portugueses está em risco de pobreza, revela novo indicador

Natália Faria, in Público on-line

Eurostat divulgou esta quinta-feira os novos indicadores do risco de pobreza e exclusão social. O alargamento do conceito foi mais notório entre os idosos, cuja taxa de risco de pobreza e exclusão social subiu de 20,2% para 21,4% no ano passado.

São, afinal, 20% os portugueses que estão em risco de pobreza ou exclusão social, segundo os dados revelados esta quinta-feira pelo Eurostat, relativos a 2020. Os últimos indicadores do Instituto Nacional de Estatística (INE), relativos ao mesmo período temporal, apontavam para uma taxa de ligeiramente inferior, de 19,8% (2.037 milhares de pessoas), mas a adopção de um novo indicador inflacionou esta realidade estatística. Deste modo, a proporção das crianças e jovens até aos 18 anos de idade em risco de pobreza ou exclusão social aumenta para os 21,9% (eram 21,6%). Mas a mudança mais visível observa-se nos idosos, cuja taxa aumentou dos 20,2% para os 21,4%.

“No novo indicador, a privação material severa passa a considerar 13 em vez de nove itens (e altera o nome para privação material e social severa) e a intensidade laboral per capita muito reduzida passa a abranger as pessoas até aos 64 anos (antes considerava apenas idades até aos 59 anos), explicitou ao PÚBLICO Ernestina Baptista, do gabinete de comunicação do INE, acrescentando que o novo inquérito sobre o rendimento e condições de vida dos portugueses, cuja divulgação está aprazada para o dia 26 de Novembro, irá já “descrever e apresentar os resultados para o novo indicador” usado para quantificar a população que está em risco de pobreza e exclusão social.

Para melhor compreender esta alteração recorde-se que no conceito de risco de pobreza cabem todos os indivíduos cujo rendimento fica abaixo dos 60% do rendimento mediano por adulto de cada país. Na prática, este risco de pobreza não mede por si só a riqueza de cada um, limitando-se a separar a população entre os que vivem abaixo ou acima daquela linha, numa proporção que vai variando consoante a evolução dos salários mínimos e médios de cada país.

Para apurar a taxa do risco de pobreza e exclusão social, somavam-se aos ameaçados pelo risco de pobreza os indivíduos abaixo dos 60 anos de idade com intensidade laboral per capita muito reduzida, isto é, que viviam em agregados familiares em que os adultos entre os 18 e os 59 anos de idade (excluindo estudantes) trabalhavam em média menos de 20% do tempo de trabalho disponível. E a estes somavam-se ainda os submergidos em situações de privação material severa, ou seja, com dificuldades em aceder a pelo menos três de um conjunto de nove itens, entre os quais se incluem a capacidade de fazer face a uma despesa inesperada de custo próximo do valor da linha de pobreza (504 euros, em 2019), de pagar uma semana de férias ou de custear uma refeição de carne ou peixe a cada dois dias, de manter a casa aquecida ou a existência de contas em atraso relativas às despesas essenciais.

A actualização dos conceitos deu-se, portanto, nestes dois campos, alargando-se o universo considerado na intensidade laboral à faixa etária dos 64 anos e somando quatro novos itens ao conceito de privação material. Neste campo, passou a avaliar-se também o acesso à Internet, a capacidade de custear a necessária renovação do vestuário, a posse de pelo menos dois pares de calçado adequados à estação e a capacidade de gastar pequenas quantias em actividades de lazer, além da possibilidade de reunião com familiares ou amigos para uma bebida ou refeição pelo menos uma vez por mês.

Mais de 24% das crianças e jovens em risco

À luz dos novos indicadores adoptados pelo Eurostat, a União Europeia somava no ano passado 24,2% das crianças e jovens abaixo dos 18 anos de idade em risco de pobreza ou exclusão social. Nos adultos com idades entre os 18 e os 64 anos a taxa descia para os 21,7%, baixando para os 20,4% entre os que tinham 65 ou mais anos de idade. Na fotografia europeia que retrata o risco de pobreza ou exclusão entre crianças e jovens, a Roménia surge destacada por somar 41,5% das suas crianças e jovens em risco de pobreza ou exclusão social, seguindo-se a Bulgária (36,2%), a Espanha (31,8%) e a Grécia (31,5%). Mais a Norte, a Eslovénia e a República Checa destacam-se por serem os países em que aquela taxa é mais baixa: 12,1% e 12,9%, respectivamente. Estão, aliás, acima da Dinamarca e da Finlândia, países onde a taxa de pobreza ou exclusão social de crianças e jovens se fixava no ano passado nos 13,5% e 14,5%, respectivamente.

Na Europa, a escolaridade dos pais continua a ser um factor determinante no que toca ao risco de pobreza dos mais novos. A prova é que entre as crianças filhas de pais com baixa escolaridade a taxa de risco de pobreza fixava-se em 2020 nos 50,5%, baixando drasticamente para os 7,7% entre aquelas cujos pais possuem uma escolaridade elevada.

Igualmente determinante parece ser o local onde se nasce. Entre as crianças com pelo menos um dos progenitores imigrantes a taxa de pobreza era de 32,9%, contra os 15,3% registados entre os menores cujos pais eram ambos nativos do país.

À semelhança de anos anteriores, e do que se passa, de resto, em Portugal, as famílias monoparentais com crianças dependentes surgem como as mais marcadas pelo risco de pobreza ou exclusão social: 42,1%, na média europeia. Muito acima, portanto, da taxa de 15,7% das famílias compostas por dois adultos sem crianças dependentes (até 18 anos ou entre os 18 e os 24 anos desde que sem actividade económica e que continuem a residir com pelo menos um dos pais). “Genericamente, o risco de pobreza ou exclusão para um adulto com crianças dependentes está 19,9 pontos percentuais acima do das diferentes famílias sem crianças dependentes (42,1% contra 22,3%)”, precisa o Eurostat.

Nos agregados familiares com crianças e com intensidade laboral reduzida (cabem aqui todos os adultos que trabalharam em média menos 20% do tempo de trabalho possível) o risco de pobreza ameaça 71,9 famílias em cada 100. Entre as famílias com baixa intensidade laboral sem crianças dependentes, aquela taxa baixa para os 52,5%.

O destaque do gabinete estatístico da União Europeia enfatiza, de igual modo, aquilo que já se sabe, isto é, as crianças que crescem em risco de pobreza ou exclusão social têm menores probabilidades de terem bom desempenho escolar e de gozarem de boa saúde, correndo assim muitos maiores riscos de, uma vez adultos, ficarem desempregados, pobres e socialmente excluídos.

O risco de pobreza e exclusão social entre as crianças e jovens vem diminuindo nos últimos anos. Entre 2015 e 2020, desceu de 27,5% para os referidos 24,2%. “No entanto, em quatro estados-membros o risco de pobreza ou exclusão social para as crianças era mais alto em 2020 do que em 2015, nomeadamente na Alemanha, Luxemburgo, Suécia e França”, aponta o Eurostat.