19.3.12

Sem-abrigo: há ainda muito para fazer

in TVI24

Estratégia nacional para retirar pessoas da rua está muito atrasada em Lisboa

A Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas Sem-Abrigo, lançada há três anos, está muito atrasada em Lisboa, segundo as instituições que diaramente trabalham no terreno e que garantem receber cada vez mais pedidos de ajuda.

Apresentada em março de 2009, a estratégia prevê a criação de condições para retirar dois mil sem-abrigo das ruas até 2015.

«Em Lisboa as coisas estão bastante atrasadas, tendo em conta que não é fácil juntar tantas instituições e onde há também uma grande concentração de pessoas sem-abrigo», disse à agência Lusa o coordenador das equipas de rua da Comunidade Vida e Paz.

Celestino Cunha afirmou que «a estratégia tem um tempo delineado até 2015 e que Lisboa está a fazer o seu trabalho», mas reconheceu que «ainda há bastante caminho a fazer».

Observou que o facto de haver três entidades responsáveis pelo plano na cidade - Santa Casa da Misericórdia, Câmara de Lisboa e Instituto de Segurança Social (ISS)¿ «não favorece a tomada de decisão».

«São condições particulares da cidade, onde há muita necessidade, muita resposta, mas articulá-la é um desafio constante que cabe a todos», sustentou.

Isabel Monteiro, da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, vai mais longe, afirmando que a estratégia está «parada» desde a saída da coordenadora do departamento do ISS responsável pela coordenação da estratégia.

Apesar dos Núcleos de Planeamento e Intervenção Sem Abrigo (NPISA), que fazem o diagnóstico local dos sem-abrigo, estarem a funcionar, «pressentimos que neste momento a estratégia está parada em termos do ISS», disse.

«Pelo que observamos, a estratégia deixou de ser prioritária e estamos a passar para uma sociedade 100% assistencialista que não promove a parceria, nem a autonomização das pessoas», frisou, rematando: «Daqui a um tempo, vamos ter as pessoas dependentes do apoio de montes de instituições e sobretudo do Estado porque neste momento não temos estratégia para promover grandes autonomias».

Nesse sentido, defendeu, «é cada vez mais urgente» que a estratégia esteja «ativa» para responder ao crescente número de pessoas em risco de ficar sem-abrigo.

«Pela experiência que tenho em termos locais, eu vejo que o NPISA tem tido efeitos muito positivos no trabalho com as várias organizações e sobretudo nos utentes que nos têm chegado porque conseguimos conhecer, sinalizar e responder no imediato. Agora não temos respostas milagrosas porque também não existem», acrescentou.

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza salientou, por seu turno, a importância da Estratégia no Porto: «Tomou a dianteira nacional no trabalho com os sem-abrigo», tendo retirado das ruas, até ao início deste ano, cerca de 1300 pessoas.

Lisboa está a «andar mais lentamente», disse o padre Jardim Moreira, assinalando o aumento significativo de pessoas sem-abrigo e com fome nas ruas da capital.

Sobre os atrasos na implementação da estratégia em Lisboa, o responsável afirmou que depende da «disponibilidade de técnicos para fazerem o atendimento dos sem-abrigo», mas também admitiu que «há gente que não deixa a rua».

Ana Martins, da Assistência Médica Internacional (AMI) considerou, por sua vez, que a estratégia potencializou «os recursos humanos e materiais» na cidade que evitaram o «"boom" que se estava à espera do número de sem-abrigo».

Dados da AMI indicam que em 2011 registou-se um aumento de 9% dos casos, sendo que 31% são mulheres.

Uma caraterização feita pelo ISS em 2009 identificou 2133 sem-abrigo, 63% das situações em Lisboa e Porto, sendo 84% homens, a maioria entre os 30 e 49 anos.