29.4.12

Projeto à medida dos jovens ciganos do Alentejo

Sara R. Oliveira, in Educare

Terra Nómada existe para reduzir o défice de qualificação de jovens de etnia cigana. Os saberes e tradições de casa entram nas aulas, os conteúdos são adaptados e os pais também podem participar.

É uma terra especial. Uma terra nómada, que anda com a casa às costas para estar bem perto da comunidade cigana do Alentejo. O projeto Terra Nómada nasceu para promover a inclusão escolar e a educação formal e não formal de jovens de etnia cigana, tentando combater o insucesso e travar o abandono precoce das salas de aula. Surgiu no âmbito do Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF). Com vários anos de intervenção em turmas PIEF, Susana Silvério sentiu necessidade de olhar com particular atenção para os alunos de etnia cigana e o Terra Nómada acabou por aparecer. A experiência tem sido positiva.

"O projeto Terra Nómada visa a integração escolar e social dos jovens de etnia cigana, no sentido de reduzir o défice de qualificação escolar desta população. A escola é o espaço ideal para a integração das comunidades ciganas, pois é um local de todos e que se pretende que seja para todos", explicam as responsáveis. Nesse sentido, acompanham-se jovens ciganos dos 12 aos 17 anos, de vários anos da escolaridade obrigatória, integrados no PIEF. A intervenção não se restringe ao presente, também olha para o futuro. "A promoção de uma maior escolarização dos jovens de etnia cigana é um factor preponderante para o 'empowerment' destas comunidades, dando-lhes voz e uma maior capacidade de comunicação efetiva".

O Terra Nómada trabalha em vários PIEF da região do Alentejo. O PIEF de Mourão tem 17 alunos "cheios de vontade de continuar a aprender e fazer mais coisas novas" e um novo projeto. "Às sextas, TIC é no cinema" surgiu para analisar os conteúdos relativos à segurança na Internet e outras questões relacionadas com as novas tecnologias. O tema atrai muita curiosidade e na EB2,3 de Mourão, de 15 em 15 dias, às sextas-feiras, exibem-se filmes que abordam o assunto. Segue-se o trabalho: os alunos têm de responder a um guião de compreensão para cada filme, analisando personagens e mensagens. No final de cada período, é tempo de mostrar o que se aprendeu durante as sessões de cinema. Fala-se de tudo um pouco em Mourão: de métodos contracetivos, dos critérios de divisibilidade da Matemática, e até de defesa pessoal para perceber que o respeito pelos outros é uma base essencial na vida da comunidade.

O PIEF da Vidigueira tem 16 alunos, dos 13 aos 16 anos, e a 9 de março chamou os pais e encarregados de educação à escola por causa da avaliação intercalar. A reunião juntou os pais, alunos e a equipa técnica e pedagógica para um balanço antes das férias da Páscoa. Falou-se do comportamento, da assiduidade, do que está bem e do que está mal. Em fevereiro, na aula Homem e Ambiente, com a ajuda do professor João Matias, os alunos colocaram ninhos nas árvores da escola.

No PIEF de Moura-Amareleja também não se para. Os alunos têm um livro de receitas especial para compilar. Chama-se "Cabén Calon", ou seja, comida cigana, e arrancou com a receita de arroz de funcho. O livro está recetivo a colaborações de outros PIEF das redondezas. Por ali, em Moura, já se falou do que os micróbios são capazes de fazer. Amassou-se a massa que levedou e foi ao forno na forma de pão com chouriço. Os alunos têm uma horta para tratar, já experimentaram pintar de olhos vendados para deixarem sair o que vem de dentro e aprenderam várias práticas relacionadas com a higiene oral.

A construção de uma comunidade educativa multicultural é um dos objetivos do Terra Nómada. Apesar de centrado na etnia cigana, o projeto faz questão de promover e divulgar boas práticas com turmas de diversas culturas. Há várias atividades para captar a atenção do público-alvo. Há a Mala de Terra Nómada que funciona como um instrumento de trabalho com jogos e dinâmicas para aplicar nas salas de aula. Há aulas que abrem as portas à participação dos pais. Há intercâmbios com outras turmas PIEF para a partilha de experiências. Há um diário escrito pelos alunos, exposições, oficinas, sessões temáticas.

As turmas PIEF têm as suas especificidades. Alunos de três ciclos e com idades diferentes no mesmo espaço requerem um trabalho diferenciado. "Por serem jovens bastante mais velhos do que a média de outras turmas, é importante adaptar os conteúdos aos interesses e gostos, necessidade acrescida quando falamos de jovens de etnia cigana. As turmas abrangidas pelo projeto Terra Nómada são maioritariamente de alunos de etnia cigana, pelo que o trabalho desenvolvido em contexto de sala de aula procura sempre integrar os 'saberes de casa' e as tradições e vivências culturais dos alunos e das comunidades ciganas", referem.

A medida PIEF não esquece a realidade familiar de quem estuda, faculta a integração dos alunos em qualquer altura do ano, permite um ensino feito à medida. O Terra Nómada aproveita essas diferenças para o seu trabalho. "A flexibilidade existente numa medida PIEF tem sido especialmente adequada para o acolhimento e integração dos jovens ciganos na escola, na medida em que permite integrar as suas vivências culturais e familiares. Jovens com percursos escolares marcados pelo insucesso escolar e desmotivação face à escola, encontram nas turmas PIEF um espaço em que se identificam e onde se sentem acolhidos."

O futuro é agora incerto. O PIEC - Programa para a Inclusão e Cidadania, que albergava a medida PIEF, foi extinto em dezembro do ano passado. Neste momento, a medida PIEF e o projeto Terra Nómada dependem diretamente do Instituto da Segurança Social e, portanto, a continuidade está a ser avaliada.

Informações:
www.terranomada.moonfruit.com