Por Marta F. Reis, in
Numa década as mães entre os 20 e os 30 anos passaram a estar em minoria. No ano 2000, mais de cinco em cada dez mulheres (53,9%) que deram à luz estavam nesta faixa etária. Em 2011, já só representavam 37% das parturientes. Os dados do Instituto Nacional de Estatística mostram que o total de nascimentos no pico da fertilidade caiu quase para metade, de 64 764 no virar do milénio para 36 371 no ano passado.
Envelhecimento e ausência de políticas de natalidade são explicações que se cruzam. “Hoje um terço das mulheres em idade fértil, cerca de dois milhões, tem entre 40 e 49 anos”, explica Lisa Vicente, da Divisão de Saúde Reprodutiva da Direcção-Geral de Saúde. Se a carreira adiou o primeiro filho, a própria inversão da pirâmide populacional – com a quebra dos nascimentos – acaba por tornar mais provável mães mais velhas. Esta variável é reflectida na Taxa de Fecundidade Geral, adianta a demógrafa da Universidade Nova de Lisboa Ana Alexandre Fernandes. Traduz o número de nados-vivos, num determinado ano, pelo efectivo médio de mulheres em idade fértil numa faixa etária. Com este indicador, percebe-se que os nascimentos nesta faixa etária caíram, mas não tanto como sugerem os totais de nascimentos, portanto também há menos mulheres nestas faixas do que há uma década. No ano 2000 houve mais de 100 nascimentos por mil mulheres entre os 25 e os 29 anos e em 2010 foram 74,70.
Lisa Vicente diz que, com os dados actuais, é impossível apontar com exactidão o que pesa mais: a conjuntura social ou a própria demografia, contando com uma análise mais precisa com os dados dos Censos 2011. Ainda assim, até com os dados das interrupções de gravidez, acredita que no caso das mães até aos 19 anos – onde os nascimentos caíram para mais de metade neste período – está reflectido também o trabalho de prevenção da gravidez precoce e a melhoria do planeamento familiar.
Para Clara Soares, coordenadora da urgência da Maternidade Alfredo da Costa, o peso da carreira é incontornável. “Hoje é raro ver uma gravidez programada entre os 20 e os 25 anos.” Casos de mulheres com receio de serem despedidas durante a gravidez ou dificuldades em reduzir o horário de trabalho mesmo com indicação médica são “frequentes”, alerta a obstetra, e a crise veio piorar a situação. “Acontece com a mulher que trabalha na reposição de um supermercado e com a advogada.”
Como inverter o fenómeno? Lisa Vicente hesita numa resposta: esta é a pergunta a que todos os países estão a tentar responder. Para Clara Soares, seria importante reforçar o cumprimento da lei – como o direito a ser dispensada para amamentação – e melhorar a protecção da maternidade, por exemplo com a hipótese de redução dos horários de trabalho depois da licença, como fazem os países nórdicos, mesmo que fosse preciso dar incentivos às empresas. Ana Alexandre Fernandes destaca a necessidade de melhorar a acessibilidade a creches públicas, garantia maior do que os actuais abonos.
Ambas concordam que há ausência de políticas: a obstetra conclui que nada está vocacionado para ser mãe e a demógrafa que nunca houve uma política de natalidade no país. “Tem havido uma grande falta de sensibilidade”, diz Ana Alexandre Fernandes.
A consequência, porque ter filhos mais tarde significa também ter menos filhos, está à vista no envelhecimento. No final de 2011 havia mais pessoas com mais de 65 anos no país do que com menos de quinze: 1,9 milhões de idosos para 1,6 milhões de crianças e adolescentes. “Lidámos com o envelhecimento como com os tubos de escape poluentes dos automóveis. Precisávamos dos carros e foi- -se deixando o resto para depois. Manteve-se a ideia de que era um fatalismo”, diz a demógrafa.