Por João d´Espiney , in Público on-line
O aumento do número de horas de trabalho diminui o bem-estar das pessoas, mas são as mulheres e os indivíduos de ideologia de esquerda quem mais sofre com a sobrecarga, conclui um estudo realizado em Coimbra.
Estas são algumas das conclusões de um estudo europeu desenvolvido nos últimos três anos por investigadores de 24 países – incluindo dois da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), Filipe Coelho e Conceição Pereira – que agregou as respostas a um questionário envolvendo 34 mil pessoas, entre os quais 1034 portugueses.
Em declarações ao PÚBLICO, Filipe Coelho salienta que a relação do aumento do número de horas com a diminuição do bem-estar é “igual para toda a gente, mas para as mulheres é mais negativo, pois têm conjugar o trabalho pago com o trabalho em casa e muitas vezes a maternidade”.
Relativamente à questão ideológica, o investigador da FEUC explicou que as pessoas estão “associadas a diferentes formas de ver o mundo e a sua relação com o trabalho”. “À esquerda, as pessoas estão associadas a ideais como a igualdade, protecção dos direitos dos trabalhadores, enquanto que à direita ao individualismo, ao capitalismo e à concorrência”, acrescenta.
Filipe Coelho sublinha que, além das mulheres e pessoas com crianças e indivíduos de esquerda, “quem sofre mais” com o aumento da carga horária laboral são também “as pessoas com mais idade, problemas de saúde, pessoas com posições mais baixas na organização da empresa e sem autonomia no trabalho”
Estas conclusões poderão influenciar, a partir de agora, a escolha dos empresários na hora da contratação? Filipe Coelho responde que “não estão à espera de nenhuma aplicação prática de imediato”, mas “a médio e longo prazo pode levar as empresas a adaptar os seus horários de trabalho às especificidades das pessoas” e alterar algumas “práticas de gestão, dando mais autonomia às pessoas, para reduzir o efeito do aumento do número de horas de trabalho”.
Ter filhos
Filipe Coelho reforça, por outro lado, que “ter filhos torna mais negativa a relação entre horas de trabalho e bem-estar”, embora não tenha sido tido em conta o sexo.
A relação negativa, de partida, entre o aumento das horas de trabalho e o bem-estar acaba por ter um impacto menos notório para aqueles que trabalham fora do seu país de origem. “Faz sentido que não sofram tanto com as horas de trabalho, porque muitas vezes abandonam o seu país para melhorar a sua situação económica e, além disso, não têm o mesmo enraizamento social que possuíam anteriormente”, explica o investigador.
Para o cidadão que trabalha no seu país, “a vida é mais preenchida, por exemplo, pela família, pelos amigos, e outras actividades de cariz social”, e para aqueles que estão fora, até por não terem essa envolvência social, e como estão focalizados na melhoria de vida, trabalhar mais horas é encarado como positivo.
Por outro lado, as pessoas com mais autonomia no trabalho “não sofrem tanto”, acrescenta.
Na opinião dos investigadores de Coimbra, os resultados do estudo podem ser úteis para as empresas na maximização da produtividade dos colaboradores, sendo apontadas “pistas para redesenhar horários de trabalho em função do sexo, idade e outras características”.
A exploração das diferenças entre países e o tipo de ocupação são hipóteses a desenvolver a partir dos dados já obtidos.
Diversos estudos salientavam já que o aumento do número de horas de trabalho está associado a “cansaço físico e mental, estilos de vida menos saudáveis, acidentes no trabalho, stress e, por vezes, má produtividade, além de tornar mais difícil o equilíbrio entre trabalho e família”, conclui.