Por Luís Claro e Sónia Cerdeira, in iOnline
Esquerda acusa troika de querer baixar salários enquanto direita fala em “flexibilização”. Desemprego foi tema central da reunião no parlamento
A troika voltou ontem a defender a flexibilização dos salários para inverter a tendência de subida do desemprego. Numa reunião com os deputados à porta fechada no parlamento, os representantes do Banco Central Europeu (BCE), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da Comissão Europeia (CE) foram questionados por todos os partidos sobre o aumento do desemprego – que de acordo com os dados da OCDE será superior a 15% este ano – e justificaram os dados negativos com “a ausência de flexibilidade salarial”, segundo relatos de alguns deputados na reunião.
A constatação da troika – preconizada principalmente pelo BCE e pelo FMI – foi lida como uma sugestão para baixar os salários e indignou o PS, os comunistas e o BE, que defenderam a necessidade de pôr em prática incentivos ao crescimento. “Não querem combater o problema com o mesmo remédio que nós”, confessou ao i um deputado do PS, que hoje à tarde vai receber uma delegação da troika na sede nacional, em Lisboa.
À saída da reunião, inserida na quarta avaliação ao Memorando, o deputado comunista Miguel Tiago acusou a troika de uma “insensibilidade brutal”. “Para a troika, o desemprego é causado pelos altos salários dos trabalhadores”, lamentou.
Na mesma linha, o bloquista Pedro Filipe Soares criticou que não tenham sido dadas respostas para travar o desemprego: “A única coisa que diz é que vai estudar o problema.”
À direita os relatos são mais suaves. Um deputado da maioria garante ao i que a troika falou em “flexibilização laboral”, mas que “não houve nenhuma recomendação de baixar salários”. Contudo, outro deputado da coligação confessa que isso “está implícito”, apesar de a equipa do FMI, do BCE e da CE não o ter dito com todas as letras.
O desemprego foi um dos temas centrais na reunião. Ao que o i apurou junto de deputados presentes, a troika quer detalhar as causas que levaram os números do desemprego a superar o esperado, justificando, no entanto, que o desemprego se deve ao processo de ajustamento e que haverá uma diminuição quando os sinais de retoma forem mais evidentes.
Segundo o deputado do PSD Miguel Frasquilho, a próxima avaliação da troika do cumprimento do programa de assistência financeira “deverá ser positiva” enquanto o deputado do CDS Adolfo Mesquita Nunes nota que, segundo a equipa do BCE, do FMI e da CE, Portugal “estará a ultrapassar a fase pior” da crise económica.
As instituições internacionais consideraram ainda, segundo Frasquilho, que a quebra de receita fiscal – divulgada esta quarta-feira – “não é preocupante”. Já a possibilidade de um segundo resgate foi “tabu”, nas palavras de Pedro Filipe Soares.
O consenso político em torno do programa de ajuda externa foi mais uma vez elogiado pela troika que fez questão de agradecer aos deputados. O consenso será posto à prova hoje com a votação do Documento de Estratégia Orçamental (ver texto ao lado).
Também durante o dia de ontem os quatro principais bancos portugueses tiveram reuniões individuais com a troika para discutir os respectivos planos de recapitalização.