3.12.12

Quase metade dos deficientes visuais depende de prestações sociais

Marisa Soares, in Público on-line

Estudo da Acapo revela vulnerabilidade acrescida dos cegos e amblíopes no mercado do trabalho.

Muitos vivem isolados, são dependentes de terceiros e vivem em dobro o flagelo do desemprego. Este é o retrato dos deficientes visuais em Portugal, traçado pela Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (Acapo). Um estudo realizado pela associação revela que quase metade dos deficientes visuais, 49%, depende de prestações sociais para viver.

O documento, apresentado nesta segunda-feira em que se assinala o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, traça um retrato “preocupante” dos deficientes visuais, explica Paulo Pedroso, professor de sociologia no ISCTE e coordenador do estudo.

A taxa de emprego dos cegos e amblíopes em idade activa é metade (32,9%) da taxa de emprego nacional (62,9%). Já a taxa de desemprego é quase o dobro da que se regista entre a restante população – no primeiro trimeste deste ano, 29% dos invisuais não tinha trabalho, enquanto que a taxa nacional era de 15,6%.

“Esta população tem uma vulnerabilidade acrescida no mercado do trabalho, que aumenta quando a deficiência é adquirida mais tarde”, afirma. A justificação está no sistema de educação e reabilitação dos deficientes visuais. “É um sistema muito centrado nas pessoas que adquirem a deficiência precocemente, mas falha na reabilitação e reinserção das que a adquirem na idade adulta”, explica Paulo Pedroso. O problema, sublinha, é que a maioria dos invisuais adquire a deficiência em adulto.

Segundo o estudo “Prestação de serviços e a promoção da vida independente”, que se baseia em inquéritos feitos a 1325 sócios e utentes da Acapo, a idade média das pessoas com baixa visão é de 44 anos e a das pessoas cegas é de 53 anos. Quase metade, 42%, adquiriu a deficiência até aos cinco anos e 79% dos cidadãos em idade activa que adquiriram a deficiência depois dos 30 anos não estão no mercado de trabalho.

Professores ou telefonistas
Metade dos inquiridos empregados trabalha no sector público. Para Paulo Pedroso, este facto deve-se ao sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, que na administração pública é de 5%. “O sector privado continua muito fechado às pessoas com deficiência visual”, lamenta o sociólogo. Nas empresas, as quotas ficam-se pelos 2% e não são obrigatórias.

As saídas profissionais dos cidadãos com deficiência visual estão concentradas em duas profissões: professores, no caso dos licenciados, e telefonistas, no caso dos níveis escolares mais baixos. “Esta conclusão reflecte a continuidade do estereótipo em relação à capacidade de trabalho destas pessoas”, observa Paulo Pedroso.

No capítulo das dinâmicas sociais e familiares, o estudo conclui que 20% dos deficientes visuais são completamente dependentes na vida quotidiana, não têm acesso à informação nem mobilidade. Desses 20%, metade vivem sozinhos. “É um dado muito perturbador, porque não há um serviço social organizado para pessoas com estas características”, nota o professor.

Mais de metade (59%) dos deficientes visuais vive em meio urbano, onde os laços familiares e sociais são mais fracos. Em 95% dos casos não têm ninguém com quem possam sair de casa e 75% não pode estar com familiares ou amigos quando quer.

Ao nível da mobilidade, 60% dos deficientes visuais não são autónomos e têm dificuldade ou não conseguem andar em espaços públicos não familiares, não usam transportes públicos e têm dificuldade ou não conseguem subir ou descer escadas.

Segundo o estudo, 79% das pessoas que adquiriram a deficiência na idade adulta dizem que a sua vida piorou ou piorou muito desde então. “Não surpreende, mas não deixa de ser preocupante”, observa Paulo Pedroso.

Para melhorar as condições de vida destas pessoas, a Acapo vai propor ao Governo a criação de um sistema de apoio social, destinado particularmente aos idosos que estão isolados. “É também vital melhorar o desempenho do sistema educativo, pois a escolarização garante uma melhor integração dos deficientes”, conclui o sociólogo.