28.5.20

Europa começa a abrir os destinos de Verão ao turismo interno e externo - e há preocupação

Maria João Guimarães, in Jornal Público

Onda de calor dos últimos dias deixou as praias cheias em várias zonas de costa europeia. Especialistas temem efeitos do relaxamento. Há “bolhas” e “corredores” em algumas.

O calor levou muitas pessoas à beira-mar em muitos países em fase de desconfinamento, e alguns acabaram por encerrar algumas praias para impedir que se juntasse demasiada gente. Enquanto isso, países de turismo de praia preparam-se para reabrir, também a estrangeiros — ou pelo menos a alguns estrangeiros.

Espanha adiantou esta segunda-feira a data em que planeia receber visitantes de outros países sem a necessidade de 14 dias em quarentena como existe actualmente: a partir de 1 de Julho e não de 15 como estava previsto.

A falta de uma data concreta era apontada por representantes do sector do Turismo como um problema para quem estivesse indeciso entre vários destinos ao planear as suas férias, e a existência da quarentena era vista como um sinal de que os turistas não eram bem-vindos.

A ministra francesa Élisabeth Borne (Transição Ecológica) declarou que a decisão de Espanha abrir as fronteiras mas manter a quarentena dava “uma mensagem contraditória”, desaconselhando viagens para o país vizinho. França está a levar a cabo, de qualquer modo, uma campanha para os franceses fazerem turismo no próprio país.

Na Grécia, recomeçaram esta segunda-feira as viagens de ferry para todas as ilhas, depois de um ensaio de uma semana apenas com a rota para Creta, com medidas de distanciamento físico e medição de temperatura. A única excepção de destino dos ferries continua a ser Itália, cujo recomeço se espera para a próxima semana.

Alguns países estão a agir com especial cautela, por exemplo a Croácia, o país europeu mais dependente do turismo (20% do PIB), que ainda só considerou admitir sem quarentena visitantes da Eslovénia, que tem um número semelhante de mortes de covid-19.

"Bolhas” ou “corredores” de turismo
A Comissão Europeia continua a discutir com os Estados-membros uma abordagem coordenada, disse no briefing diário desta segunda-feira o porta-voz Christian Wigan. Mas a Comissão sublinha que “todas as restrições devem ser baseadas na saúde pública e não na nacionalidade”, disse. “A nossa expectativa é de que os Estados-membros apliquem as mesmas medidas a cidadãos que venham de países com situações epidemiológicas semelhantes.”

Como será o Verão na Europa? Um guia do regresso do turismo
Até agora, têm sido referidos acordos bilaterais entre alguns países para o regresso da livre circulação entre si, e a primeira “bolha de viagens” é na Estónia, Letónia e Lituânia.

Estas “bolhas” ou “corredores” de turismo são uma possibilidade para salvar a época turística este ano, dizem vários peritos. Mas para isso é necessário informação pormenorizada, disse Richard Butler, professor de turismo na Universidade de Strathclyde (Escócia), deixando várias perguntas: “Quem precisar de assistência médica tem-na garantida dentro da ‘bolha’? As restrições em termos de dimensões máximas de grupos permitidos vão ser as mesmas, e os visitantes vão ser tratados de igual modo que população local?”

A professora de psicologia da saúde Susan Michie da University College de Londres (UCL) disse que para o cumprimento das regras ser maior, era essencial que as regras fossem claras: “É preciso saber exactamente quem pode fazer o quê, quando, onde e como”, disse, citada pela estação de televisão americana CNN.

Períodos diferentes para idosos ou famílias​
E há ainda pouca definição sobre como vão funcionar destinos de Verão no acesso aos locais mais procurados: as praias.
Isso começou a ver-se nos últimos dias: com o aumento da temperatura, muitas zonas costeiras foram muito mais procuradas nos últimos dias, e em alguns locais, praias foram fechadas por se temer enchentes. Na quarta-feira passada, dias depois de as autoridades francesas terem determinado a reabertura das praias, uma zona da Bretanha, Morbihan, decretou o encerramento de cinco praias por “comportamento inaceitável” dos visitantes e não cumprimento das regras de distância física entre as pessoas.

Em Barcelona estão em vigor janelas de tempo em que os visitantes podem estar na praia, e as autoridades têm apelado a que os cidadãos cumpram estes limites — das 6h às 10h as praias podem ser usadas por pessoas que vão caminhar ou correr, das 10h ao meio-dia e das 19h às 20h as praias estariam reservadas a idosos, e a “famílias” no restante horário. Ainda assim, houve uma hesitação inicial sobre o que se poderia fazer na praia, e apesar de ter sido pensado inicialmente que se poderia ficar na praia a apanhar sol, isso não foi ainda permitido, diz a televisão Beteve.

Peritos de saúde ouvidos pela agência de notícias alemã DPA avisaram para o risco de uma segunda onda de infecções resultado do relaxamento ainda antes do Verão.
Hajo Zeep, do Instituto Leibniz para Investigação em Prevenção e Epidemiologia em Bremen lembrou que os números dos estudos serológicos indicam baixas taxas de infecção (Itália e Suécia têm 5%, por exemplo) o que significa que a esmagadora maioria da população está ainda exposta e “o vírus pode espalhar-se rapidamente se houver as condições certas”.

Já Max Geraedts, médico e investigador da Universidade de Marburg, notou o perigo de não cumprimento da distância social se muitas pessoas se juntarem em bares de praia, por exemplo, e destacou as viagens de férias como um potencial multiplicador de casos quer no país de origem, quer no destino. Outro problema podem ser turistas doentes a sobrecarregar sistemas de saúde locais. “Eticamente é pelo menos questionável se já se tem poucos recursos para quem já lá está, e ainda se tem de ter em conta turistas.”