15.2.21

“Incerteza do futuro e medo de arriscar” explicam depósitos elevados

Rosa Soares, in Público on-line

Num levantamento feito junto das seguradoras, a Deco Proteste encontrou apenas dois seguros de taxa fixa. Ao PÚBLICO, António Ribeiro, analista financeiro desta entidade, admite que os fundos de investimento “são uma solução para o investimento a longo prazo, mas sem garantia de capital”.

O que explica o elevado montante de dinheiro deixado nas contas de depósito à ordem?

A tendência tem sido de aumento do montante aplicado nos depósitos, seja à ordem ou a prazo. Por um lado, isso é explicado pela falta de alternativas de poupança e pelo medo de arriscar em produtos sem garantia de capital (que aumentou durante a pandemia, com a queda das bolsas no primeiro trimestre de 2020 e a incerteza de uma crise económica que se avizinha). Por outro, pelo elevado desconhecimento e iliteracia financeira dos portugueses. As baixas taxas de juro dos depósitos não explicariam o montante aplicado a aumentar, até poderia ser contraditório: mas a incerteza do futuro sim, a necessidade de liquidez e o medo de arriscar. Claro que, às taxas de juro actuais, próximas de zero, não há motivação para aplicar os montantes a prazo, já que o rendimento é praticamente idêntico ao das contas à ordem.

Para além da baixa literacia financeira também há um certo “comodismo” dos portugueses em relação à poupança?

Baixa literacia, comodismo, sim; mas também a incerteza relativamente ao futuro e a necessidade de liquidez, de ter o dinheiro ao alcance, caso seja necessário, como já referi.

As seguradoras têm apostado nos fundos de investimentos (sem capital e taxa de remuneração garantidos). Mas são adequadas a todos os clientes?
As seguradoras também têm tido uma postura muito conservadora. Este poderia até ser um momento de oportunidade para os seguros de taxa fixa de médio e longo prazo, enquanto alternativa aos depósitos a prazo. Mas não se tem verificado uma grande aposta nestes produtos. Há uns meses fizemos uma recolha de informação pelas seguradoras e não existiam seguros de taxa fixa, apenas dois na Lusitânia Vida [da Associação Mutualista Montepio Geral] que, ao mudar o ano, renovou as séries desses produtos. Mas parece ser a excepção. Dentro dos produtos de capital garantido, não há muitas opções: os melhores depósitos, os Certificados de Aforro e os Certificados do Tesouro. Os seguros PPR também são uma solução, mas para o longo prazo, como complemento para a reforma, e os fundos de investimento, também para o longo prazo (sempre mais de cinco anos), mas sem garantia de capital. No longo prazo, o potencial de rendimento destes produtos é superior, mas a curto prazo isso pode não acontecer. Períodos de crise, como o que vivemos em 2020, podem ser desfavoráveis, ainda que por períodos curtos. Por isso, o conselho é sempre aplicar nestes produtos apenas o montante que tem a certeza de não vir a necessitar nos próximos cinco anos. Além disso, deve sempre diversificar o investimento, por sectores, por mercados, como forma de diluir o risco. Para pequenas poupanças ou quem não tem muitos conhecimentos financeiros, um fundo misto é o mais adequado – mas sempre para prazos superiores a cinco anos.

O facto de os certificados de Aforro e do Tesouro serem feitos unicamente em nome do aforrador, não é um entrave à escolha destas alternativas por pessoas mais idosas ou menos conhecimentos financeiros?
Actualmente, os certificados de Aforro apenas podem ser subscritos por pessoas singulares. Ao contrário das anteriores, a série em subscrição (E) não permite a figura do movimentador. Esta opção prende-se provavelmente com a necessidade de canalizar a movimentação destes produtos para o canal online. Claro que as gerações mais velhas, menos familiarizadas com as novas ferramentas tecnológicas, poderão ter mais dificuldades. Já a indicação de um beneficiário existe apenas nos seguros de capitalização e fundos de pensões.