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30.9.22

Moradores do Segundo Torrão vão ser realojados em hotéis

Cristiana Faria Moreira, in Público on-line

Demolição das casas que se situam junto de uma vala em risco neste bairro precário de Alamada vai arrancar no sábado e durar até dia 6. Em causa estão 60 famílias que terão de ser realojadas em apartamentos e unidades hoteleiras ou então procurar apoio junto da Segurança Social. Amnistia Internacional está a acompanhar o processo.

É um dos maiores bairros precários de Almada, a apenas uma ponte de distância de Lisboa. O Segundo Torrão costuma ser notícia nos Invernos rigorosos de frio e tempestades, quando fica dias a fio sem luz e os electrodomésticos estouram com a sobrecarga de energia. Ao longo do último meio século, este bairro à beira-mar cresceu muito além das pequenas casas dos pescadores, alargando-se para terrenos da Administração do Porto de Lisboa e de privados.

Ergueram-se casas desordenadas, coladas umas às outras ou separadas por becos estreitos, por onde as crianças correm e brincam. Hoje, serão casa para mais de 300 famílias, muitas chegadas das ex-colónias à procura de melhor vida. Nos próximos dias, poderemos assistir ao início do seu fim: uma “situação de urgência e de emergência” precipitou o arranque do há muito anunciado realojamento do bairro do Segundo Torrão. Esta sexta-feira é o último dia para alguns moradores deixarem as suas casas. As demolições arrancam no sábado.

“Tivemos de acelerar o realojamento. O princípio da prevenção e precaução sobrepõem-se a outros”, disse a presidente da Câmara de Almada, Inês de Medeiros, aos jornalistas que convocou para uma sessão de esclarecimentos sobre este processo.

O aviso aos moradores chegou no início de Junho quando o município convocou cerca de 40 famílias para uma reunião sobre uma intervenção urgente na vala de drenagem de águas pluviais do bairro.

De acordo com o município, os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento (SMAS) de Almada identificaram, ainda em 2019, “problemas com as descargas de esgotos para o rio”, nomeadamente “problemas de salubridade e de escoamento”.

O que era então “um problema de saúde pública” tornou-se uma “emergência”, quando em Maio passado os SMAS voltaram ao local e alertaram para a “deterioração acelerada da vala”, e o “possível colapso do colector” no caso de uma tempestade e de cheias, que poderia pôr em risco as casas que foram construídas por cima e arrastá-las para o mar.

De acordo com o município, o betão da vala foi sendo furado para a drenagem de águas residuais das habitações ao longo dos anos, colocando-o ainda mais em risco. “Há zonas onde o betão já desapareceu. A questão do peso começa a ser preocupante”, diz a autarca. Para a câmara, a emergência é tal que decidiu declarar a situação de alerta municipal e activar o plano municipal de emergência de Protecção Civil no passado dia 23 de Setembro.
Realojamento temporário

Há cerca de quatro meses, algumas famílias começaram a ser alertadas para a necessidade de deixarem as suas casas até 30 de Setembro, antes do início do novo ano hidrológico, a 1 de Outubro. Seriam realojadas temporariamente noutras habitações pelo concelho – ou fora dele — até a câmara ter pronta a construção de 95 casas municipais, destinadas ao realojamento definitivo, que serão pagas pelo Plano de Recuperação e Resiliência, num investimento estimado em cerca de dez milhões de euros.

Até agora, diz o vereador da Habitação, Filipe Pacheco, foram identificadas para demolição 83 construções (casas, anexos e outros estabelecimentos). E há 60 famílias que terão de ser realojadas. Destas, há nove agregados que já se encontram realojados em casas novas em Almada e noutros concelhos e 27 com uma “solução habitacional já aceite”, esperando a assinatura dos contratos de arrendamento e a instalação de água e luz.

Segundo o autarca, o processo de realojamento tem sido negociado “caso a caso” e o número de famílias incluídas neste processo foi aumentando ao longo dos últimos meses. Há ainda 16 famílias para as quais não foi encontrada resposta. “O mercado da habitação está saturado. É uma verdadeira dificuldade”, nota Inês de Medeiros.

Perante a emergência decretada, o município accionou o Programa Porta de Entrada do Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), que se aplica “às situações de necessidade de alojamento urgente de pessoas que se vejam privadas, de forma temporária ou definitiva, da habitação ou do local onde mantinham a sua residência permanente ou que estejam em risco iminente de ficar nessa situação, em resultado de acontecimento imprevisível ou excepcional”.

Inicialmente, foi dito aos moradores que teriam de ser eles a encontrar uma casa que se enquadrasse na tipologia definida para o seu agregado e nos critérios fixados pelo IHRU em termos de áreas e de custo. Mas, depois de várias dificuldades relatadas pelos moradores, a câmara assumiu a procura por casas no mercado de arrendamento privado para depois as disponibilizar às famílias.

Dessas 60 famílias sinalizadas, há ainda oito famílias que a câmara diz não se enquadrar nos critérios do Porta de Entrada por terem uma segunda habitação ou por estarem a trabalhar fora do país na altura em que foi feito o levantamento, em 2020. Essas famílias, diz a autarquia, têm sido remetidas para a Segurança Social. “Não há nenhuma família que não esteja a ser acompanha”, acrescenta a vereadora da Protecção Civil, Francisca Parreira.

Os moradores que não têm ainda uma alternativa habitacional serão instalados em unidades hoteleiras em Almada e Lisboa. Inês de Medeiros afiança que a câmara assumirá todos os custos pelo alojamento em unidades hoteleiras, assim como as despesas com a alimentação. E diz ainda que o município tem condições para guardar os bens das famílias, assim como os seus animais de estimação.

A data de saída das casas dada aos moradores foi 30 de Setembro, esta sexta-feira. A área da vala foi dividida em cinco para o realojamento ser faseado. A demolição das casas vai iniciar-se no sábado, diz 1, e terminar a 6 de Outubro.

Este processo custará ao município entre 1 e 1,5 milhões de euros, embora parte do montante seja ressarcido pelo programa Porta de Entrada. Por agora, este programa terá a duração de 36 meses, esperando que no final desse período estejam concluídas as 95 casas que a câmara quer construir para realojar estas pessoas e mais uma parte do bairro.
Amnistia Internacional está a acompanhar o processo

Este processo tem sido criticado por alguns moradores que se queixam de não terem sido incluídos no processo de realojamento, apesar de viverem junto à vala. Mas, entre os que foram identificados, houve também queixas relativas à gestão de toda esta situação por parte do município.

No início do mês, o PÚBLICO deu conta das preocupações de alguns munícipes, que temiam ter de sair do concelho de Almada, colocar os filhos noutras escolas, desfazer laços e ter criar novas raízes num local novo que, supostamente, ocuparão apenas por três anos. Queixavam-se ainda de pouco apoio por parte do município e de informações confusas.

A câmara, contudo, refuta essas críticas. “Não é verdade que a câmara não tem estado no bairro. Este processo foi comunicado e negociado com os moradores”, disse Filipe Pacheco.

A Amnistia Internacional - Portugal tem também estado a acompanhar o processo de realojamento destas famílias. Num comunicado enviado ao PÚBLICO, esta organização salienta que, para as famílias visadas, é “fundamental estar garantida uma casa provisória, que cumpra os padrões internacionais de adequação, antes da data de demolição da casa actual, de forma que não se verifiquem desalojamentos forçados”.

“Só assim estará protegido o direito à habitação adequada, consagrado em vários tratados de direitos humanos regionais e internacionais, por forma a que as famílias possam viver em segurança, paz e dignidade”, continua a organização, que garante continuar a acompanhar as famílias para garantir que o município garante o “respeito pelos direitos humanos destas pessoas” no realojamento.

O director executivo da Amnistia Internacional – Portugal, Pedro A. Neto, nota ainda que, apesar a situação precária e de incumprimento, “muitas destas famílias trabalham a tempo inteiro servindo a sociedade de que todos fazemos parte, mas mesmo assim não conseguem sair da situação de pobreza em que vivem”.


17.5.22

Amnistia Internacional na Ucrânia recolhe indícios de violência sexual sobre crianças

in RTP

Oksana Polalchuk confirma que as autoridades ucranianas já abriram investigação a mais de dez mil casos de alegados crimes de guerra.

Sobre os crimes de violência sexual, a diretora executiva da Amnistia Internacional na Ucrânia afirma à jornalista Ana Jordão que o que se sabe até agora é muito doloroso.


8.6.21

Amnistia Internacional: países mais ricos estão a condenar milhões à fome, seca e deslocações forçadas

Nelson Marques, in Expresso

A poucos dias do início da cimeira do G7, relatório sobre a crise climática sublinha os impactos negativos do apoio das nações mais ricas à indústria dos combustíveis fósseis. Crise climática “é uma crise de direitos humanos sem precedentes”, defende a ONG

A Amnistia Internacional acusou esta segunda-feira os governos mais ricos de estarem a condenar milhões de pessoas em todo o mundo à fome, à seca e a deslocações forçadas, ao continuarem a investir na indústria dos combustíveis fósseis. A poucos dias do arranque da cimeira do G7, no Reino Unido, a ONG aponta o dedo a EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Canadá e Japão, acusando-os de falhar na proteção das populações dos efeitos das alterações climáticas, que considera ser “uma crise de direitos humanos sem precedentes”.

“As alterações climáticas ameaçam o usufruto dos direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais das gerações presentes e futuras e, em última análise, o futuro da humanidade. Quando os impactos relacionados com as alterações climáticas atingem um país ou uma comunidade, os efeitos multiplicadores podem minar seriamente o gozo do direito à vida em dignidade, colocar em perigo várias liberdades e, em muitos casos, até colocar em risco a sobrevivência cultural de povos inteiros”, lê-se no documento.

Apesar de os sete países do G7 se terem comprometido a tomar medidas para fazer a transição para uma economia mais ecológica e alcançar a neutralidade de carbono até 2050, a Amnistia Internacional acusa-os de não terem ainda “uma estratégia adequada para reduzir as emissões” até ao final desta década, um passo considerado fundamental para evitar os cenários climáticos mais negros. Por isso, desafia os membros do G7 a comprometerem-se nesta cimeira a “eliminar incondicionalmente todos os combustíveis fósseis, tão perto de 2030 quanto tecnicamente viável”, criando regulamentos mais exigentes que obriguem as empresas a fazer a transição para as energias renováveis e a deixando de subsidiar a indústria dos combustíveis fósseis.

"Os planos climáticos pouco ambiciosos apresentados pelos membros do G7 representam uma violação dos direitos humanos de milhares de milhões de pessoas. Não são falhas administrativas, são um ataque devastador e em massa aos direitos humanos", disse num comunicado Chiara Liguori, assessora de Política de Direitos Humanos e Ambiente da ONG.

“O G7 e outros países industrializados ricos têm historicamente emitido as maiores quantidades de carbono e assumem a maior responsabilidade pela atual crise climática. Eles também têm mais recursos para a enfrentar, mas as suas estratégias até agora têm sido terrivelmente inadequadas, e o seu apoio a outros países tem sido avarento.”

A cimeira do G7, o primeiro encontro de líderes destes sete países após o início da pandemia, decorre de 11 a 13 deste mês na Cornualha, Reino Unido.

1.6.21

Pobreza. “Há pessoas que, se isto fosse uma corrida, começavam muito mais atrás”

Ângela Roque (Renascença), Octávio Carmo (Ecclesia), in RR

Responsável pela secção portuguesa da Amnistia Internacional diz que é preciso estar atento à discriminação dos mais pobres por parte dos políticos populistas. Em entrevista a propósito dos 60 anos do movimento, Pedro Neto pede ao Presidente da República que ponha os sem-abrigo de novo na agenda, defende mais investimento na reinserção social dos reclusos e acha que chegou a altura de se definir um estatuto para os refugiados climáticos.

Há 60 anos que a Amnistia Internacional (AI) luta para garantir o respeito pelos direitos humanos em todo o mundo. A data foi assinalada na última sexta-feira com a campanha “uma vela que nunca se apaga”, que visa promover “a esperança” e assinalar as vitórias alcançadas ao longo das últimas seis décadas, uma delas a abolição da pena de morte.

Em entrevista à Renascença e à agência Ecclesia, o responsável pela secção portuguesa da Amnistia diz que uma das principais preocupações ao nível nacional é o aumento da pobreza, por ser um fator de desigualdade e discriminação. Entre os grupos particularmente vulneráveis estão os sem-abrigo. Pedro Neto acredita que ainda será possível acabar com este fenómeno até 2023 e deixa um apelo ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, para que não esqueça desta causa.

O diretor da AI Portugal fala, ainda, da exploração laboral – de que o caso de Odemira é só um exemplo – e acusa o Estado de estar a falhar na reinserção social dos reclusos. Sair da prisão, diz, “é como se fosse uma porta giratória” em que, sem apoio cá fora, quem sai acaba por voltar a entrar.

Ao nível internacional considera que, a par dos conflitos que se multiplicam, é preciso estar atento às questões da poluição e do clima, porque também afetam os direitos humanos, e acha que faz cada vez mais sentido falar em “refugiados climáticos”.

"Abra o seu jornal num qualquer dia da semana e encontrará um relato de alguém que foi preso, torturado ou executado num qualquer sítio do mundo, por as suas opiniões ou a sua religião serem inaceitáveis para o governo do seu país". Este é um excerto de um artigo publicado no jornal 'The Observer', em 1961, que marcou o nascimento da Amnistia Internacional. Hoje, como há 60 anos, basta ler, ouvir ou ver notícias para perceber que ainda há muito a fazer para garantir o respeito pelos direitos humanos. Este é um trabalho sempre inacabado?

É um trabalho sempre inacabado, mas gosto muito de pensar que estou a trabalhar para não ser mais necessário. Esse é o horizonte que me vai orientando, e é a visão que vamos tendo na Amnistia: contribuirmos para um mundo onde todas as pessoas possam usufruir dos direitos humanos. E isto é interdependente: se alguém usufrui dos seus direitos humanos é porque estou a trabalhar para isso, se eu usufruo dos meus direitos humanos é porque alguém está a trabalhar para isso. Portanto, sendo um trabalho inacabado, gosto de pensar que não é, e ter essa utopia, esse sonho e essa visão no horizonte.

Para perceber até que ponto é que as coisas vão evoluindo a Amnistia publica um relatório anual, que é uma espécie de termómetro. O que foi publicado em abril conclui que a pandemia fez crescer as desigualdades e a discriminação em todo o mundo, incluindo em Portugal, onde expôs "fragilidades no acesso à saúde e habitação". Estes são direitos sensíveis em Portugal?

Sim. A pandemia trouxe um problema novo, que foi o direito à saúde colocado em causa de modo absoluto e dramático. E depois agravou outros que já existiam e que, porventura, não seriam tão visíveis, mas que se tornaram muito mais visíveis.

Alguém que não tem uma habitação condigna, as dificuldades de se proteger contra a doença durante um confinamento é muito maior. Alguém que não tem uma habitação condigna coloca logo aí o seu acesso à educação, se é feita a partir de casa, com uma fragilidade muito maior. Principalmente, quando falamos de uma economia de mercado e de uma educação que nos prepara para essa economia. Quando temos em conta que o que se deve valorizar é o mérito, logo aí há pessoas que, se isto fosse uma corrida, começavam a corrida muito mais atrás na pista.

E estes grupos ainda ficaram mais vulneráveis?

Ficaram ainda mais para trás. É como se tivessem vento contra elas a soprar e a dificultar ainda mais esse processo. Cabe ao Governo, à sociedade civil, às respostas sociais contribuir para essa justiça social se equilibrar e estarmos todos na mesma medida naquilo que é a sociedade.

"Todos os nossos direitos económicos e sociais dependem do planeta Terra."

Este também é um trabalho muitas vezes inacabado, mas que ficou muito visível, as suas consequências e os seus processos, durante a pandemia e creio que agora há que fazer um trabalho conjunto, de escuta, de consulta ativa, mas uma consulta que seja mesmo ir ao terreno estar com as pessoas. Não pode ser uma consulta pública nos termos clássicos, porque são pessoas que muitas vezes estão a lutar para sobreviver.

É preciso ir lá ter com elas, calçar os seus sapatos, perceber como é a sua vida, para depois formular políticas públicas que sejam adequadas e que resultem, para fazermos essa caminhada com essas pessoas, no sentido de equilibrar a nossa sociedade e de contrariarmos esta tendência que tem sido o aumento do fosso entre os mais ricos e os mais pobres, fazermos o caminho inverso e termos uma sociedade mais equilibrada.

Os novos indicadores da pobreza em Portugal não são nada animadores. A pobreza agravou-se e isso, em termos de direitos humanos, pode vir a piorar ainda mais as coisas?

Muito. De facto, a pobreza agravou-se e temos aqui um nível que já existia, mas que agora é muito evidente: pessoas que trabalham a tempo inteiro, que têm um “full-time job”, mas que mesmo assim não conseguem sair da pobreza. Isto é dramático e exige uma reflexão muito grande, por um lado, para perceber que economia é esta que se serve dos pobres para poder crescer, a exploração dos mais pobres, exigindo a pessoas que trabalhem em tempo inteiro e mesmo assim não conseguem sair da pobreza.

Por outro lado, líderes políticos, assentes no populismo, que se aproveitam da fragilidade da circunstância destas pessoas para as atacarem, porque precisam de vilões para se apresentarem como heróis, e depois ganharem dividendos com pessoas, porventura, mais desatentas e que votam nelas acolhendo essas acusações.

Portanto, para além de famílias forçadas a trabalhar assim, de crianças que ficam sozinhas – e também elas em circunstâncias de maior fragilidade, por não serem tão acompanhadas, por causa de trabalhos tão exigentes –, estas pessoas ainda são estigmatizadas por alguns líderes políticos e pela capacidade que têm de formular opiniões pouco esclarecidas. Há aqui uma dupla camada de discriminação que é preciso olharmos com muita atenção e resolver.

O relatório fala também de uma faixa da população particularmente vulnerável, que são os sem-abrigo, diz que foram esquecidos pelo Estado durante a pandemia. Tínhamos a meta de, até 2023, deixar de haver quem faça da rua a sua casa. Será possível cumprir essa meta?

Penso que será. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, elegeu a causa dos sem-abrigo como uma das suas causas no seu primeiro mandato. Aqui, o apelo que faço, se ele nos estiver a ouvir, é que essa causa volte de novo à sua agenda, porque ele tem uma capacidade muito grande de influenciar a agenda mediática e agenda política, pelas suas qualidades e pelo cargo que exerce.

É preciso investir "na reinserção social e no acompanhamento das pessoas quando vêm para fora". 

Creio que a resposta a este problema das pessoas sem-abrigo é uma resposta que tem de contar com todos: Governo central, mas também – e apelando ao princípio da subsidiariedade...

… que é um dos princípios da Doutrina Social da Igreja…

E é um princípio que defende que não é tudo do Estado central. Este paternalismo não funciona muitas vezes. Há também a administração pública local, municipal e não esquecer a sociedade civil, as organizações que estão no terreno, desde as IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social) às ONG (organizações não-governamentais) que têm de tomar parte.

Há um outro ator muito importante a ter em conta e essencial: os sem-abrigo. É preciso perceber a origem dos seus problemas, porque são diversos, e é no diagnóstico desses diversos problemas que depois se dará o início do caminho para as soluções.

O relatório da Amnistia também fala na sobrelotação das prisões. Que dados tem sobre a situação atual?

O número em Portugal de reclusos não é superior à capacidade total das prisões em Portugal, no entanto há algumas prisões que, mesmo assim, estão sobrelotadas.

Os problemas das prisões são vários e sistémicos. Eu fui professor e a sala de aula espelhava a sociedade. As prisões espelham também muitas vezes a sociedade e aquilo que de mais frágil a sociedade tem.

A Justiça tem três funções para ser Justiça, se falhar uma delas já não o é: a função punitiva, a função reparadora das vítimas e a função de reinserção social. E esta terceira função está a falhar muito.

Mesmo a própria direção-geral chama-se Direção-Geral dos Serviços de Reinserção Social e Serviços prisionais. A reinserção social vem primeiro, mas está a ter pouco efeito e há pouco investimento; é necessário investir nela para depois poupar na despesa nas prisões e para poupar naquilo que são processos de regresso. É como se fosse uma porta giratória, muitas pessoas que saem da prisão chegam cá fora, não têm meios e são obrigadas a reincidir, e voltam para dentro.

Há pouco falou dos discursos populistas. Esses discursos tendem a acentuar muito a dimensão punitiva.

Sim, só a dimensão punitiva, esquecem as outras. Porque os discursos populistas, a sua estrada é o descontentamento e a revolta, por isso alimentam isso e não falam de soluções. Geralmente criticam, dizem mal, porque é essa revolta da cultura de café, como é vulgarmente conhecida, mas depois falta o resto.

E nós não precisamos de pessoas que só falem mal e que só falem dos problemas, os diagnósticos são importantes, mas não com linguagem de ódio, e são importantes no sentido de construir soluções a seguir.

" Todos os nossos direitos económicos e sociais dependem do planeta Terra."

No caso das prisões, o que é preciso é esse investimento na reinserção social e o acompanhamento das pessoas quando vêm para fora. Acompanho alguns casos que tiveram os perdões presidenciais agora, no contexto da pandemia, casos de pessoas que estão completamente abandonadas e em risco de se tornarem até sem-abrigo.

Ou seja, a medida foi positiva, mas não teve acompanhamento?

Faltou qualquer coisa a seguir. Claro que para isto acontecer é preciso investir. E digo investir, porque é mesmo um investimento. Pode parecer uma despesa a curto prazo, mas é um investimento, porque vai poupar muito mais à frente, em recursos do Estado e, claro, contribuir para o bem-estar dos cidadãos, dos próprios e das próprias, e também da comunidade que acolhe, ou não, neste caso.

Temos um caso recente em Portugal de violação de direitos humanos, muito mediático, que foi o caso de Odemira. A Amnistia tem acompanhado estas situações. Como chegámos a este ponto?

Usando o chavão que já muita gente disse, ''é um caso conhecido” e é um caso à escala global. Muitas vezes, os preços que temos nos supermercados não estão a retribuir os produtores dos bens que estamos a consumir, estão a retribuir intermediários, e há preços baixos que são conseguidos à custa de alguma exploração nesse processo.

E aqui estamos a falar de exploração de migrantes no nosso país.

Precisamente. E isso acontece em produtos lá fora, mas também cá. Odemira não é caso único, há outros contextos, é preciso dar atenção à Lezíria e ao Oeste, onde o tráfico de seres humanos se aproveita para este trabalho quase escravo. E isto não são dados desconhecidos, estão publicados em vários relatórios.

A primeira razão do tráfico de seres humanos em Portugal, enquanto país de destino, é a exploração em contexto de trabalhos agrícolas e a segunda é a exploração em contexto de trabalho sexual. Portanto, os diagnósticos estão feitos, agora é preciso soluções, que uma série de entidades se comprometa nesse trabalho ainda mais, e capacitá-las ainda mais para esse trabalho.

Há outra questão que queria ressalvar, que é: temos também de ser responsáveis enquanto consumidores. Quando vamos ao supermercado, infelizmente muitas vezes temos de ir ao mais barato, porque não temos escolha, mas temos de ter consciência que temos de exigir também ao mercado, à indústria que nos coloque produtos à disposição, para nosso consumo, que sejam eticamente irrepreensíveis.

Resposta ao "problema das pessoas sem-abrigo tem de contar com todos". Foto: Miguel Rato/RR

O ambiente é uma das temáticas que vos preocupa. As alterações climáticas, a poluição e o consumo desenfreado também põem em risco os direitos humanos?

Sim. Cito até um documento, a encíclica do Papa Francisco ‘Laudato Si’ (2015), que fala muito bem da Casa Comum. É mesmo assim: o planeta é como se fosse o nosso supermercado, mas não temos de comprar. O planeta dá tudo o que o que precisamos: a roupa que vestimos, a água que bebemos, a comida, os carros onde andamos, tudo é feito com matérias-primas que foram extraídas do planeta e transformadas para o nosso consumo.

Para que as prateleiras do supermercado se voltem a encher, temos de consumir com sustentabilidade e é por isso que a Amnistia Internacional se dedica aos Direitos Humanos, não na mesma perspetiva de uma ONG ambiental. Todos os nossos direitos económicos e sociais dependem do planeta Terra. Se extrairmos sem regras e sem sustentabilidade, vamos ficar sem modo de sobrevivência. Aliás, isso já está à vista, com os refugiados climáticos.

As populações mais frágeis são as primeiras a pagar esse preço…

Claro. “Refugiados climáticos” é uma expressão que ainda não está normalizada e o clima ainda não é uma razão válida para que haja, formalmente, pessoas refugiadas, mas também está na altura de os fazedores de políticas, ao nível internacional, considerarem também esta razão: as alterações climáticas.

Isso está nas suas expetativas para a próxima Cimeira do Clima, marcada para novembro, em Glasgow?

Eu tenho muita confiança no secretário-geral das Nações Unidas. É uma organização cheia de entraves, de questões burocráticas, que muitas vezes impedem a ação – a questão dos vetos, há sempre alguém a vetar e, se não há unanimidade, não se avança. Mas tenho muita confiança em António Guterres, que também elege esta causa como a sua causa primordial, enquanto secretário-geral. Não sei se terá continuidade, num segundo mandato, mas espero que, livres da pandemia, possamos voltar a esta questão.

Até porque acredito que a saúde do meio ambiente também contribui para a saúde humana.

Deixem-me partilhar esta ideia: os recifes de coral são organismos vivos que também albergam muitos vírus. Estando a ser destruídos, um pouco por todo o mundo, sobretudo junto da Oceânia, há aqui riscos desconhecidos para nós, porque estes vírus poderão chegar aos humanos e fazer-nos mal… Isto é desconhecido, ainda, mas temos de olhar também para o ambiente, nesta perspetiva da saúde humana.

Referiu há pouco a encíclica do Papa Francisco sobre ecologia integral. Ele tem dado um contributo nesta área do ambiente, e também noutras, como é que vê o papel de Francisco e da Igreja Católica na defesa dos Direitos Humanos e da paz mundial?

Na perspetiva da Amnistia Internacional, quantos mais líderes da sociedade civil se empenharem nas questões em que trabalhamos, melhor. É muito importante.

"É preciso ir lá ter com as pessoas, calçar os seus sapatos, perceber como é a sua vida, para depois formular políticas públicas."

Num registo mais pessoal, tenho visto o Papa Francisco – como o Dalai Lama e outros líderes religiosos – a atuar de forma muito pertinente. São líderes que influenciam também muitas pessoas e têm tido um contributo muito importante para esse trabalho.

O Papa Francisco é um Papa completamente ligado à sociedade, às pessoas e às suas preocupações, muito atento aos problemas sociais do mundo. Desejo-lhe uma boa continuação desse trabalho, porque é preciso que haja líderes na sociedade que nos remetam e que nos liguem ao mundo, aos problemas reais do mundo, e que não estejam deslocados, como, porventura, já vimos outros Papas a fazer. E mais uma vez, esta é uma opinião pessoal.

Há muitos líderes políticos que estão desarredados da realidade, dos problemas das pessoas que lideram, e por isso não contribuem de modo significativo para os Direitos Humanos nas suas realidades.

Como é a relação da Amnistia com a Igreja e as instituições católicas, sabendo que há temas de total convergência, como a luta contra a pena de morte, embora sejam divergentes noutras, como o aborto?

Eu não tenho tido problemas. Temos trabalhado. Há pouco tempo fizemos uma ação conjunta com os jesuítas, em Portugal, sobre a Índia, porque há defensores dos direitos humanos que são jesuítas e estão presos.

Temos de nos focar naquilo que nos une e menos no que nos separa. Na questão dos direitos sexuais e reprodutivos, o ambiente do trabalho da Amnistia Internacional é o âmbito da lei, o nosso foco é a lei, os direitos humanos. E há assuntos em que não temos de nos pronunciar.

"A estrada dos discursos populistas é o descontentamento e a revolta. Alimentam isso e não falam de soluções."

Creio que todas as pessoas católicas, e a Igreja Católica, me acompanhará, a mim e à Amnistia Internacional, nesta reivindicação de que prender uma mulher porque fez um aborto não é resposta que se dê a este problema. Portanto, foquemo-nos aí, nessa unidade de opinião e de concordância.

Naquilo que discordamos, é o célebre dito: vivemos numa sociedade plural, mesmo que eu não concorde, ou a Amnistia Internacional não concorde com uma opinião, uma coisa é certa, lutaremos para que as pessoas a possam expressar.

A Amnistia está a comemorar 60 anos. Ainda a vivermos uma pandemia mundial, que mensagem final deixa?

Os 60 anos já são uma idade simpática. Vemos que já muito foi alcançado. O mundo melhorou em muitas coisas, nos últimos 60 anos, mais de metade dos países que tinham pena de morte já a aboliram, muitos também fizeram moratórias – apesar de a terem no seu código penal, não a executam. São 60 anos que nos dão esperança, a continuar. Voltando ao início: são trabalhos inacabados, há que continuar.

26.2.21

Amnistia Internacional quer que Portugal inclua direitos humanos nas decisões da pandemia

Ana Tomás, in Contacto

Organismo alerta para impactos negativos da pandemia em grupos vulneráveis e já enviou várias cartas ao Governo a pedir a criação de um comité.

Os números de Portugal têm descido semana após semana e nos últimos dias recuado aos valores de outubro, porém, ainda não há data para alívio das restrições e o Presidente da República já começou ouvir os partidos para a renovação do estado de emergência até 16 de março.

Esta segunda-feira o Governo reuniu-se novamente com especialistas das áreas da saúde e da epidemiologia para discutir a evolução da pandemia no país e antecipar condições para o futuro desconfinamento, mas ainda com o confinamento no horizonte. Por isso, a Amnistia Internacional Portugal defende que outros organismos sejam ouvidos na ponderação de decisões que têm penalizado duramente os grupos sociais mais vulneráveis.

"Apoiamos as medidas de segurança e saúde pública que têm sido desenvolvidas e acreditamos que o que é necessário fazer para proteger a população deve ser feito. Contudo, a par das reuniões de peritos nessa área, devia também haver reuniões de peritos em direitos humanos", diz ao Contacto, Marta Lapa, diretora de investigação daquela estrutura.

Desde o início da pandemia que a Amnistia Internacional defende a criação de um comité de monitorização dos direitos humanos e já enviou três cartas ao Governo a pedir a criação desse grupo, a última no final de janeiro, quando entrou em vigor o segundo confinamento geral em Portugal. Segundo Marta Lapa, esse comité seria composto por peritos, "no sentido académico e também por representantes das comunidades dos grupos mais vulneráveis, porque são eles que têm informação em primeira mão, importante e útil nestas situações".

O objetivo deste grupo seria aconselhar o Governo, "ainda na fase em que as medidas de combate à pandemia estão a ser desenhadas", sobre o impacto que cada uma vai ter ou já está a ter em cada comunidade e no usufruto dos direitos humanos pelos cidadãos. Esse grupo, diz a representante da Amnistia, poderia contribuir, sugerindo "outras medidas" para ajudar a minorar consequências negativas, ao mesmo tempo que serviria para "divulgar informação e estatísticas, da parte do Governo, para mostrar como é que está ser gerido o impacto dos confinamentos nos direitos humanos, sobretudo das pessoas mais vulneráveis".

Na última carta enviada ao Executivo de António Costa, a Amnistia sinaliza alguns dos que foram particularmente atingidos durante a pandemia e cuja situação se agravou com mais um confinamento. Entre eles, Marta Lapa destaca o das pessoas com deficiência, "que viram serviços muito importantes para a sua autonomia, para o seu bem-estar e para o seu dia a dia, suspensos". "Isto inclui serviços de apoio à vida dependente, mas também terapias. Houve pessoas que regrediram na sua mobilidade física e também temos a informação de que houve pessoas com deficiência, institucionalizadas, que não saíram dos lares entre março e novembro. Aquele pequeno alívio que muitos de nós pudemos viver nos meses de verão, estas pessoas não puderam usufruir e agora estão novamente confinadas dentro desses espaços", refere, sinalizando que o emprego entre este segmento também recuou para os níveis de 2016, depois de uma evolução positiva.

Precários e muitas vezes esquecidos, os imigrantes são outro dos grupos em risco continuado nesta pandemia. "Houve, efetivamente, muitos que ficaram sem emprego e recebemos alguns pedidos de ajuda de pessoas que ficaram, de um momento para o outro, sem meios para alimentar as suas famílias. Pedidos bastante angustiantes e que parecem ter uma relação também com o aumento do número de sem-abrigo, que já se notou em 2020, pelo menos em Lisboa." Segundo noticiou o Público, no final do ano passado, mais de 140 pessoas passaram a pernoitar nas ruas em Lisboa, elevando para 356 as pessoas identificadas, pelas autoridades, nestas condições.

Outro dos segmentos populacionais cuja situação é preocupante, segundo a Amnistia, é o das mulheres, que viram os seus salários mais penalizados, em 2020, e viveram um agravamento da violência. "Temos dados que dizem que a violência doméstica aumentou durante a segunda vaga e que houve mulheres que sofreram violência doméstica pela primeira vez durante a pandemia". O cibercrime visando o sexo feminino também cresceu no último ano.

Outro grupo cuja exposição aos perigos da rede aumentou foi o das crianças, tendo os crimes sexuais contra menores, na internet, duplicado nesta fase. As crianças têm sido um dos segmentos que mais preocupações têm suscitado nas medidas tomadas contra a pandemia, com o fecho das escolas a ser solução de último recurso. "Tem não só impacto a nível da educação, como tem também impacto a nível social, porque as escolas funcionam como uma estrutura de apoio social muito importante. Há um seguimento que é feito por professores e funcionários que deixa de existir e uma criança que pertence a uma família mais frágil ou que tenha uma estrutura mais vulnerável vai estar particularmente exposta nesta altura", refere Marta Lapa.

Os governantes portugueses já sinalizaram que o desconfinamento deverá começar com a reabertura das escolas e, numa carta ao Executivo, centenas de médicos, professores, pais e investigadores pedem que essa reabertura aconteça de forma faseada a partir de 1 de março.

Aos grupos identificados, a que a Amnistia junta também os idosos e comunidades nómadas, como os ciganos, há situações transversais que passam pelas condições económicas e de habitação, que dificultam a própria capacidade de confinar. "Vimos notícias de pessoas sem condições para cumprir o isolamento, a dormir em guarda-fatos, no chão, porque tinham de se isolar dos seus familiares em casas pequenas onde isso não é possível", ilustra Marta Lapa.

Apesar das cartas enviadas ao Governo não terem tido, até agora, o seguimento pretendido, a Amnistia vai continuar a insistir na necessidade de atenuar os impactos negativos das medidas contra a pandemia nos mais vulneráveis. "Acreditamos que mais pode e deve ser feito e continuaremos a insistir nesse sentido, até que, finalmente, haja, por parte do Governo, alguma medida específica para dar aos direitos humanos a atenção que julgamos necessária."

15.5.20

Resposta global ignora refugiados e deixa milhões em risco de fome

Por Lusa, in o Observador

A Amnistia Internacional (AI) denunciou esta quarta-feira que a resposta global à pandemia da Covid-19 está a ignorar as fragilidades de milhões de refugiados, alertando que as medidas adotadas estão a agravar a precariedade e a potenciar situações de fome.

“O tratamento desumano a que estão a ser sujeitos refugiados e migrantes ameaça parar o progresso do combate à Covid-19″, afirmou a organização não-governamental (ONG) de defesa dos Direitos Humanos, advertindo que os campos de acolhimento e os centros de detenção sobrelotados poderão vir a ser os novos epicentros da pandemia, “a menos que sejam tomadas medidas urgentes”.

Segundo a AI, as medidas de resposta à pandemia do novo coronavírus adotadas à escala mundial, que incluíram bloqueios e restrições de movimento, “agravaram as condições precárias de vida” da população de refugiados e “deixaram milhões de pessoas em risco de fome e de doenças”.

“É impossível conter adequadamente este vírus quando tantas pessoas, em todo o mundo, vivem em campos e centros de detenção sobrelotados e sem condições de salubridade. Numa altura em que precisamos mais do que nunca de compaixão e cooperação, alguns governos promoveram a discriminação e o abuso, impedindo a distribuição de comida e água, prendendo pessoas ou enviando-as de volta a cenários de guerra e perseguição”, denunciou o responsável da equipa da AI para os Refugiados e os Direitos dos Migrantes, Iain Byrne.

O representante da AI deixou outro alerta: “Em muitos campos, morrer à fome é, agora, uma ameaça maior do que o próprio vírus. Trata-se de uma terrível renúncia à responsabilidade coletiva de proteger refugiados e migrantes, e estamos a pedir aos Estados que tomem medidas imediatas para evitar que se torne numa catástrofe de direitos humanos”.

Neste sentido, a organização internacional apelou esta quarta-feira a “uma ação global concertada com um objetivo”, que é, segundo frisou, “assegurar que centenas de milhares de pessoas em movimento tenham acesso adequado a alimentos, água, saneamento e assistência médica” para garantir a respetiva sobrevivência, à medida que vários países se preparam para sair gradualmente do confinamento.

Indo também ao encontro deste objetivo, a Amnistia apelou igualmente aos países que considerem a regularização temporária de todos os migrantes (independentemente da fase do respetivo processo), que garantam que os pacotes de proteção e de estímulo económico sejam aplicados aos requerentes de asilo e refugiados, e que continuem a permitir, sempre que possível, a realocação.

Outro ponto defendido pela AI é a necessidade de descongestionar as estruturas migratórias de acolhimento e de detenção sobrelotadas e de realojar as pessoas em locais com condições sanitárias e dignas.

A ONG também defendeu que o direito à saúde das pessoas detidas pelos serviços de migração deve ser garantido e, caso isso não aconteça, essas pessoas devem ser libertadas.


Para sustentar e reforçar a necessidade destes apelos, a Amnistia apontou que, durante a atual pandemia, “muitos governos adotaram medidas motivadas pela discriminação e xenofobia”.

Entre as várias situações enumeradas, a organização relatou o cenário vivido no campo de refugiados de Vucjak, no noroeste da Bósnia-Herzegovina (junto à fronteira com a Croácia), onde “o fornecimento de água foi cortado pelas autoridades locais para forçar a mudança das pessoas”, ou no campo de Zaatari, na Jordânia, onde “os habitantes foram obrigados a ficar em confinamento e impossibilitados de trabalhar”, não tendo fontes de rendimento para fazer face às necessidades básicas.

A ONG também lembrou que na zona fronteiriça de Calais, em França, a distribuição de comida e água foi afetada e as restrições à liberdade de movimentos não permitiam, a quem ainda tinha tais possibilidades, a compra de alimentos.


A AI alertou ainda que vários governos “continuaram a deter desnecessariamente requerentes de asilo ou forçaram o regresso de pessoas sob o pretexto de conter a pandemia”, dando, entre outros casos, o exemplo dos Estados Unidos da América, onde “10 mil pessoas foram obrigadas a voltar para trás, durante as primeiras duas horas após a chegada a solo norte-americano, entre 20 de março e 8 de abril”.

“Os governos continuam a dizer que estamos juntos nisto. Isso não significa nada, a menos que protejam os milhões de pessoas em todo o mundo que estão a enfrentar esta pandemia longe das suas casas e dos seus entes queridos”, afirmou Iain Byrne.

E concluiu: “Qualquer governo que permita que os refugiados morram de fome ou de sede durante os bloqueios falhou lamentavelmente na luta contra esta crise”.




16.4.20

Crianças mordidas por ratazanas durante a noite, casas sem frigoríficos ou eletricidade: isto ainda acontece em Portugal

Marta Gonçalves, in Expresso

Relatório “Direitos Humanos na Europa”, da Amnistia Internacional, identifica graves atrasos económicos e sociais em Portugal (exemplo: o país falhou em proteger os inquilinos do despejo forçado), aponta melhorias em direitos civis, políticos e de liberdade de expressão e faz uma ressalva: “Falta transparência nas investigações à ação da polícia”

As pernas da criança estão feridas. Noutra é o rosto. Não são marcas deixadas por uma corrida ou por um jogo de bola entre miúdos do bairro. São dentadas de ratazanas que entram pelas casas onde vivem com as famílias. Moram no Bairro da Torre, a poucos quilómetros do centro de Lisboa e que começa logo depois do aeroporto, em Camarate.

“Há crianças que crescem ali e vivem ali sem eletricidade, sem condições básicas de higiene. São habitações sem quaisquer condições e, sobretudo agora neste momento de isolamento social, esse problema agrava-se ainda mais e é urgente dar uma solução a estas famílias”, diz ao Expresso Pedro A. Neto, diretor-executivo da Amnistia Internacional – Portugal. “No Bairro da Torre moram 37 famílias, muitas são de migrantes africanos e de etnia cigana que estão há muitos anos em Portugal.”

O direito a uma habitação condigna é daqueles em que “Portugal ainda tem muito caminho para caminhar” para chegar “onde é desejável”: que toda a gente tenha uma casa com o mínimo de condições. Esta quinta-feira a Amnistia Internacional publicou o relatório “Direitos Humanos na Europa”, que destaca os problemas em Portugal em assegurar o direito à habitação a toda a população.

Também no Bairro da Torre há muita casa sem eletricidade, algumas que não têm um frigorífico. “As pessoas que vivem na pobreza - e isto é muito claro agora em tempos de isolamento - não têm uma casa condigna, não têm acesso a coisas tão básicas como um frigorífico, essencial para as pessoa armazenarem e manterem alimentos. Até o acesso à educação não é igual para todos e, por isso, há aqui discriminação com base na condição económica”, sublinha Pedro A. Neto. “Em direitos civis, políticos e de liberdade expressão estamos a evoluir e estamos mais à frente do que países como a Hungria, Polónia ou Turquia. No entanto, em termos legislativos e em matéria de direitos económicos, sociais e culturais há muito por fazer.”

De acordo com o relatório agora publicado, que ainda assim sublinha a importância da aprovação da Lei de Bases da Habitação em setembro do ano passado, Portugal “falhou” em proteger os inquilinos do despejo forçado. “Apesar de o Governo ter tomado medidas para tornar as rendas mais acessíveis, os mais vulneráveis continuam a ter dificuldades em aceder a habitação adequada e os moradores de bairros informais continuam em risco de terem as suas casas demolidas e de serem despejados à força sem acesso a procedimentos adequados”, lê-se no documento.

No Bairro da Torre já moraram muitas mais famílias, no entanto foram-lhes oferecidas soluções “dispersas”. “A comunidade do bairro desfaz-se”, sublinha. Também o caso do Bairro 6 de Maio, na Amadora, é destacado pelo responsável da Amnistia Internacional, onde também foram feitos despejos e onde escasseiam condições mínimas para morar.

“Conheci um senhor que trabalhou toda a vida na construção civil e nunca teve um salário suficiente que lhe permitisse sair daquela habitação fraca com a família e comprar ou arrendar uma casa com mais condições”, exemplifica Pedro A. Neto. “É uma pessoa que hoje está reformada, recebe pouco e, se for despejada dali, não vai ter condições. Precisa de alternativas. Estamos a falar de alguém que trabalhou arduamente toda a vida e, mesmo assim, não conseguiu sair das condições de pobreza em que vivia.”

Dizem as Nações Unidas que ter uma habitação é ter uma casa num local seguro, com acesso a serviços de saúde e educação sem o risco de ser expulso. E, de acordo com a Lei de Bases da Habitação, “todos têm direito à habitação, para si e para a sua família”, mas em Portugal há cerca de 26 mil pessoas que não o têm. O último levantamento do Governo, em 2018, dava conta que “persistem situações de grave carência habitacional”. “Há várias pessoas que vivem em habitação informal, em construções que não foram legalizadas - e consequentemente têm também dificuldade de acesso a eletricidade, saneamento e água corrente, por exemplo”, diz Pedro A. Neto.

“FALTA TRANSPARÊNCIA NAS INVESTIGAÇÕES À AÇÃO DA POLÍCIA”
Não é a primeira vez que é recomendado - também não é apenas iniciativa da Amnistia Internacional - e é um dos pontos destacados no relatório: a necessidade de Portugal criar um órgão totalmente independente que investigue, quando necessário, a atuação das forças da autoridade.

Paragem de autocarro onde Cláudia Simões e o polícia se envolveram em confronto
Paragem de autocarro onde Cláudia Simões e o polícia se envolveram em confronto

“São recorrentes os episódios e as polémicas que surgem na imprensa e nas redes sociais de suspeitas de uso excessivo da força por parte do Estado, aqui representado pela polícia”, diz Pedro A. Neto, recordando o caso da Cova da Moura em que oito agentes foram condenados pela detenção ilegal de seis afrodescendentes, e o caso de Cláudia Simões, a mulher que foi imobilizada e alegadamente agredida por um polícia numa paragem de autocarro na Amadora. “O uso da força é legítimo quando é para eliminar ameaças de violência pública. Ou seja, nem todo o usa da força é excessivo ou ilegítimo, algum é adequado.” Ainda assim, precisa de ser investigado, defende.

Atualmente, a polícia das polícias é a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), que é responsável, entre outras coisas, por investigar os casos suspeitos de abuso da autoridade. A instituição faz parte da tutela do Ministério da Administração Interna (MAI). “Há pouca transparência na forma como se faz Justiça nestes casos. As polícias têm os seus departamentos internos de inspeção, há também o IGAI, mas que estando dentro do MAI não é organicamente independente”, refere.

A sugestão é, portanto, “que em substituição ou em complemento do IGAI” seja criada uma organização “de facto externa e de facto independente” que conduza as investigações. “E isto é importante também para proteger os bons agentes, que merecem ver esclarecidos estes episódios dúbios e, ao mesmo tempo, para assegurar que a confiança dos cidadãos na Justiça e na perceção que têm dos agentes e instituições”, acrescenta Pedro A. Neto.

Qualquer jovem português, quando atinge a maioridade, recebe uma carta em que é convocado para o Dia da Defesa Nacional. Isto acontece com todos os que fazem 18 anos, até com aqueles que são portadores de deficiência ou com mobilidade reduzida e que, apesar da idade legal, o grau de dependência pode até ser equivalente ao de uma criança de dois anos.

“Claro que isto não tem consequências práticas [porque não vão], é apenas muito triste. Mas muito triste é também os pais destas crianças e jovens não terem apoios sociais que lhes permitam tomar conta dos filhos”, diz o diretor-executivo da Amnistia em Portugal, salientando que esta ausência de resposta é uma herança “dos tempos da austeridade, em que os serviços da Administração Pública e da Segurança Social foram dos mais sacrificados” e que muitos não voltaram a ser repostos.

Os cuidados e apoios às crianças com deficiência são outros dos pontos negativos apontados pelo relatório, havendo “preocupação” de que não estejam a receber o que têm direito. Apesar da criação do estatuto de cuidador informal, a Amnistia defende que este “não é suficiente”. “É um princípio mas não chega”, considera Pedro A. Neto. “Há pais que, caso deixassem de trabalhar para se tornarem cuidadores informais, teriam este problema: o subsídio que lhes seria atribuído não seria tão alto como o salário que têm e mesmo assim o ordenado não é suficiente para pagar as despesas.”

Por fim, há as questões de género: embora o relatório saliente a evolução na legislação portuguesa no último ano, falta “deixar de pôr o ónus da culpa” na vítima de crimes sexuais, assim como definir melhor conceitos como violação, tendo em conta a Convenção de Istambul. “Ainda não é suficientemente claro o que é o consentimento.”

2.8.19

Amnistia volta a alertar para violações de direitos humanos na Guiné Equatorial

in Impala

A Amnistia Internacional (AI) voltou a alertar para violações dos direitos humanos na Guiné Equatorial, como torturas sobre opositores, detenções arbitrárias e execuções extrajudiciais, na véspera do 40.º aniversário da tomada do poder do atual Presidente.

Teodoro Obiang Nguema assumiu o poder na Guiné Equatorial em 03 de agosto de 1979, após um golpe de Estado militar contra o seu antecessor, o seu tio, Francisco Masie Nguema, que foi executado em setembro desse ano.
A antiga colónia espanhola aderiu à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em julho de 2014 mediante um roteiro que prevê a abolição da pena de morte.
Em abril passado, o chefe de Estado anunciou a intenção de submeter ao parlamento uma lei que acabe com a pena de morte na Guiné Equatorial, onde foram executados nove homens condenados por homicídio em janeiro de 2014, 13 dias antes do estabelecimento de uma moratória provisória sobre a pena de morte.

Segundo a AI, desde que Teodoro Obiang Nguema tomou o poder houve um “declínio preocupante” nos direitos humanos na Guiné Equatorial, devido a torturas, execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias e perseguições de ativistas políticos, defensores dos direitos humanos e jornalistas.

Violações que “têm sido bem documentadas pela Amnistia Internacional ao longo dos anos”, sublinha a organização em comunicado de imprensa.

A organização não-governamental de defesa dos direitos humanos assinala que “a polícia continua regularmente a torturar detidos para obter confissões”, não obstante uma lei em vigor desde novembro de 2006 proibir a tortura.

Muitas das vítimas, de acordo com a Amnistia Internacional, são opositores e ativistas políticos, incluindo, mais recentemente, Joaquín Elo Ayeto, membro do partido Convergência para a Democracia Social, que foi detido em fevereiro quando estava em casa e agredido na esquadra da polícia. Os agentes queriam que confessasse uma alegada conspiração para matar o Presidente Teodoro Obiang Nguema.

A AI refere que pelo menos seis detidos morreram depois de terem sido torturados. A lista de maus-tratos engloba abusos sexuais e agressões com armas, lâminas de barbear e choques elétricos.

No capítulo das execuções extrajudiciais, a AI destaca o caso de um maliano, Oumar Koné, que foi morto em 2012 por um militar ao recusar pagar um suborno num controlo de trânsito na cidade portuária de Bata.

A organização realça que nem as crianças são poupadas, com dezenas delas a serem detidas e agredidas, em fevereiro de 2015, em manifestações durante a competição de futebol Taça das Nações Africanas, em Malabo, capital da Guiné Equatorial.

As crianças foram detidas em casa ou nas ruas, longe do estádio, e levadas para a esquadra da polícia da cidade, onde receberam 20 a 30 vergastadas e estiveram presas em celas sobrelotadas, juntamente com adultos suspeitos de crimes.

Alguns dos menores foram libertados depois de os seus familiares terem pagado subornos à polícia.

No balanço que faz dos 40 anos da Presidência de Teodoro Obiang Nguema na Guiné Equatorial, a Amnistia Internacional salienta ainda, pela negativa, a falta de independência do sistema judiciário, apontando os julgamentos abusivos de defensores dos direitos humanos e dos críticos do regime.

Um grupo de 112 pessoas foi condenado num julgamento, na cidade de Bata, por alegada tentativa de golpe de Estado em dezembro de 2017, mas a sentença tinha irregularidades processuais, segundo a AI.
Apesar de um tribunal ter ordenado em abril último a libertação imediata de um opositor político do Benim, Bertin Koovi, o homem continua detido pela polícia em Bata.

A AI avisa que “o número de vítimas das violações de direitos humanos na Guiné Equatorial continuará a aumentar” se as autoridades do país “não adotarem passos significativos para aplicar a lei” e “acabar com a repressão”.

18.3.19

Ativista iraniana que surgiu em «Taxi» de Jafar Panahi condenada a prisão e 148 chicotadas

Publicado por Hugo Gomes & Jorge Pereira, in C7nema

A advogada dos direitos humanos Nasrin Sotoudeh, que se tem dedicado nos últimos anos a defender mulheres que protestam contra as leis que obrigam a usar o Hijab, foi sentenciada a 33 anos de prisão pelo governo iraniano.

Sotoudeh representou diversos ativistas e políticos da oposição iraniana que foram presos após as eleições presidenciais iranianas de junho de 2009, bem como prisioneiros condenados à morte por crimes cometidos quando eram menores de idade. Detida pela primeira vez em setembro de 2010, acusada de “difusão de propaganda anti-governo” e "conspirar para prejudicar a segurança do Estado ", Sotoudeh foi confinada a uma cela solitária na Prisão de Evin. Em janeiro de 2011, as autoridades iranianas condenaram Sotoudeh a 11 anos de prisão, além de impedi-la de exercer advocacia e de deixar o país por 20 anos. Posteriormente, um tribunal reduziu a pena de prisão de Sotoudeh para seis anos e a sua proibição de trabalhar como advogada por dez anos.

Vencedora, conjuntamente com Jafar Panahi, do Prémio Sakharov do Parlamento Europeu em 2012, ela viria a ser libertada em 2013. A segunda detenção chegou em junho passado, e para além dos 33 anos a que foi condenada agora, Sotoudeh viu ainda ser acrescentada a pena de 148 chicotadas.

A Amnistia Internacional já se pronunciou sobre o caso, considerando repugnante “prender um defensor dos direitos humanos por atividades pacíficas”, apontando que o “juiz do caso de Nasrin Sotoudeh usou a sua discrição para garantir que ela permanecesse presa por mais do que o exigido pela lei iraniana. Um ultraje e uma injusta sentença ”. A organização lançou uma petição pedindo a libertação de Sotoudeh.

Recordamos que Nasrin Sotoudeh teve uma aparição especial no galardoado com o Urso de Ouro, Taxi, de Jafar Panahi, cineasta condenado em 2010 a 6 anos de cadeia e proibido de filmar durante 20 anos pelo governo, mas que mesmo assim dirigiu secretamente quatro filmes, incluindo o referido e ainda uma obra que concorreu ano passado pela Palma de Ouro em Cannes (3 Faces, a estrear brevemente em Portugal).

22.2.18

Africanos e ciganos vivem em condições degradantes em Portugal, denuncia a Amnistia

Patrícia Fonseca, in Visão on-line

No seu relatório anual sobre o respeito pelos Direitos Humanos no mundo, divulgado esta quinta-feira, a Amnistia Internacional aponta ainda o dedo a Portugal no que diz respeito à integração de refugiados e à violência contra as mulheres

As demolições vão avançando no Bairro 6 de Maio, na Amadora, apesar dos protestos dos moradores, em luta contra a Câmara Municipal há dois anos. Das três mil pessoas que viviam no bairro, restam hoje poucas dezenas. Mas se antes viviam nas suas pequenas casas abarracadas, hoje resistem no meio de escombros, montes de lixo e rios de esgoto, com a água e a luz cortadas. Muitos têm dado o peito às retro-escavadoras, conseguindo adiar o inevitável - mas esta é uma guerra com um vencedor há muito anunciado.

O problema, queixam-se os moradores do bairro (na sua maioria de origem africana), é que o município não lhes apresenta alternativas. Apenas afixam um papel na porta dizendo que a casa vai ser demolida. "Estas pessoas não podem continuar a viver nestas condições nem podem ficar sem-abrigo", considera a Amnistia Internacional no seu relatório anual, divulgado esta quinta-feira, 22 de fevereiro, e a que a VISÃO teve acesso.

Nas três páginas dedicadas a Portugal - o relatório analisa a situação em 159 países - referem-se ainda as más condições de vida das comunidades ciganas, nomeadamente em Torres Vedras, apelando-se a novos programas governamentais que permitam o realojamento destes cidadãos.

É igualmente referido que Portugal recebeu menos refugiados da Grécia e Itália do que se tinha comprometido internacionalmente - em 2017 chegaram 1 518 pessoas, cerca de metade da quota prevista -, e é também digno de nota o facto de 720 destes refugiados já ter abandonado Portugal, entretanto.

O caso dos juizes do Porto que, em outubro passado, num julgamento de um homem que raptara e espancara a mulher consideraram "atenuante" o facto de ela o ter traído com outro homem, o que atingiria a honra e a dignidade do marido, não escapou também à análise da organização não-governamental, sempre atenta aos números da violência doméstica em Portugal. Esse é um problema que já era focado no relatório do ano passado, tal como a violência policial ou o racismo contra as comunidades ciganas.

Numa nota positiva, refere-se a acusação de 18 polícias da Amadora pelo abuso de poder e tortura de seis cidadãos de origem africana, a apresentação, por parte do governo, de uma proposta de lei que garantirá uma maior proteção dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, pessoas transgénero e intersexuais (LGBTI), e a aprovação no Parlamento, em agosto, de nova legislação com penas mais duras para o incitamento ao ódio, à violência e outras condutas discriminatórias.

3.8.17

Migrações: Amnistia critica UE por recorrer à Líbia para controlar fluxos

in Diário de Notícias

A Amnistia Internacional denunciou hoje que a União Europeia está a fazer uma perigosa evolução na sua política mediterrânica, ao pedir a ajuda da Líbia para reduzir o número de migrantes que procuram alcançar o Velho Continente.

Este grupo de defesa dos direitos humanos sustentou, em relatório divulgado hoje, que a estratégia europeia de treinar a guarda costeira líbia para salvar migrantes em embarcações de ocasião é "irrefletida".

A Amnistia entende que ao recorrer à Líbia, um pais em estado caótico que está a ser o ponto de partida para a viagem arriscada em direção à Europa, a União Europeia está a colocar migrantes desesperados em risco.

A organização detalhou que enfrentam o risco de morrerem no mar ou sofrerem graves abusos dos seus direitos humanos, quando forem devolvidos à Líbia.

O relatório especificou que este ano já morreram maia de dois mil migrantes do Mediterrâneo, enquanto 73.380 conseguiram alcançar a Itália.

14.2.17

UE e os Estados-membros devem trabalhar juntos para acolher os refugiados - Amnistia


in RTP on-line


Um relatório da Amnistia Internacional (AI) divulgado hoje recomenda à União Europeia (UE) e aos seus Estados-membros que trabalhem em conjunto, no sentido de acolherem noutros países os refugiados atualmente nas ilhas gregas.

Outra recomendação da AI é apoiar financeiramente "de imediato e de forma adequada" a Grécia, um apoio que deve ser também logístico e técnico, para garantir um acolhimento digno das pessoas que chegam às ilhas helénicas, assim como um expedito processo dos pedidos de asilo.

A organização não-governamental internacional recomenda a intensificação da relocalização dos requerentes de asilo, atualmente na Grécia, aumentando o número de lugares disponíveis para a deslocalização em cada país, e permitir o acesso a este regime para aqueles que têm chegado à Europa, após a conclusão do acordo UE-Turquia, combinando rapidamente com pedidos de realojamento.

Outra recomendação é o estabelecimento de esquemas de reagrupamento familiar acessíveis, para garantir a reunião rápida dos refugiados e migrantes que estejam na Grécia aos familiares próximos, que residam noutros países europeus, concedendo vistos humanitários para os requerentes de asilo com "necessidade imediatas de cuidados especiais".

"Os Direitos Humanos dos migrantes são essenciais para a negociação e aplicação de quaisquer acordos de cooperação de migração com países não pertencentes à UE, incluindo os acordos de readmissão, a cooperação técnica com a Polícia, Guarda de Fronteira, Guarda Costeira, ou outros instrumentos de "soft law", como parcerias para a mobilidade", afirma a AI.

A AI recomenda que seja avaliado o impacto dos Direitos Humanos quando se coopera com países terceiros no âmbito das políticas de migração, e a Comissão Europeia deve "desenvolver mecanismos que permitem o escrutínio público da cooperação com países terceiros, incluindo por meio de relatórios públicos", como sobre o progresso da implementação da Declaração UE-Turquia, como recomendado pelo Provedor de Justiça Europeu, no passado dia 18 de janeiro.

"Respeitar as decisões do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, mantendo a suspensa as transferências de requerentes de asilo da Grécia ao abrigo do Regulamento Dublin e assumir a responsabilidade pelos requerentes de asilo", e "apoiar a Turquia no desenvolvimento de um sistema de asilo e um quadro jurídico que cumpre plenamente as obrigações internacionais da Turquia em relação aos refugiados, independentemente da nacionalidade", são outras das recomendações da AI.

Outra recomendação é a de "prestar assistência financeira significativa, previsível e flexível, bem como suporte técnico e operacional à Turquia e certificar os refugiados para usufruam dos direitos económicos e sociais, acesso à saúde, educação e mercado de trabalho".

Segundo a organização internacional, é recomendável a concretização de um programa de realojamento em grande escala na Turquia e providenciar rotas seguras e legais para os refugiados de modo a alcançarem os países da EU através da Turquia, assim como emitir vistos humanitários, promover o reagrupamento familiar, dar vistos de estudante, como forma de proteger os que necessitam de proteção internacional, e gerir a migração de forma ordenada e atempadamente.







Amnistia diz haver refugiados em “perigosas e repugnantes condições de vida"

in TVI24

Para a organização humanitária, a responsabilidade é do acordo celebrado entre a União Europeia e Turquia. Milhares de refugiados estão em perigo

O acordo assinado pela União Europeia (UE) e a Turquia deixou milhares de refugiados e migrantes em “perigosas e repugnantes condições de vida” e não deve ser replicado com outros países, afirmou a Amnistia Internacional num relatório agora divulgado, intitulado “Uma rota para o desespero: Impacto dos Direitos Humanos do Acordo UE-Turquia".

Um ano volvido sobre o acordo assinado entre a UE e Ancara, a Amnistia Internacional afirma que esse entendimento diplomático deixou “milhares de pessoas expostas a repugnantes e inseguras condições nas ilhas gregas”, havendo uma “flagrante violação dos seus direitos e da lei internacional”.

O Acordo UE-Turquia tem sido um desastre para os milhares que ficaram ‘encalhados’ nas ilhas gregas num perigoso e desesperante limbo”, afirma a diretora-adjunta da Amnistia Internacional para Europa, Gauri van Gulik, em comunicado .

A responsável considera que “não é honesta” a forma como os líderes europeus se referem ao acordo, que apontam como um sucesso, “fechando os olhos ao insuportável alto custo para aqueles que sofrem as suas consequências”.

A premissa central do acordo de fazer regressar à Turquia, cada cidadão irregular chegado às ilhas gregas, baseia-se no pressuposto de que a Turquia é segura para os requerentes de asilo”, todavia a Amnistia Internacional demonstra que alguns requerentes foram enviados de volta para a Turquia, “sem lhe ter sido dada oportunidade de pedir asilo ou apresentar recurso, numa clara violação do direito internacional”.

Por enquanto, a Turquia ainda não é um país seguro, a UE deve trabalhar com as autoridades gregas para transferir com urgência os requerentes de asilo para a Grécia continental e os governos europeus deveriam dar-lhes acesso a uma deslocalização para outros países”, afirma Gauri van Gulik.

"Morrer de frio às portas da Europa"
No comunicado, a Amnistia Internacional sustenta que "ninguém deveria morrer de frio às portas da Europa".

Os líderes que afirmam que o Acordo UE-Turquia pode ser um modelo para outros países como a Líbia, Sudão ou o Níger, devem em primeiro lugar olhar para as consequências horríveis e ser avisado que de tal situação nunca deverá ser repetida", refere-se.

Afirma a Amnistia que quando o Acordo entrou em vigor, todos os refugiados e migrantes foram automaticamente colocados em “centros de detenção”, e embora já não estejam num regime de detenção estrito, não podem, todavia, deixar as ilhas. Como tal “são forçados a viver miseravelmente em acampamentos superlotados, com falta de água quente, falta de higiene, má nutrição, e inadequados cuidados médicos”.

"Casas de banho comuns"
Para a AI, as condições nas ilhas gregas “não são apenas degradantes, mas colocam em causa o bem-estar físico e as vidas de refugiados, requerentes de asilo e migrantes".

Às más condições de acolhimento nas ilhas helénicas são agravadas pelo “medo dos moradores pela sua própria segurança”.

As condições precárias nos campos, afirma a Aministia Internacional, a incerteza com que os refugiados e migrantes olham o seu futuro e as preocupantes relações com as populações locais, contribuem significativamente para as tensões que degeneraram em violência ocasional.

A Aministia dá ainda conta de refugiados que foram vítimas de ataques motivados pelo ódio no campo de Souda, na ilha de Chios e sublinha que os refugiados e migrantes, especialmente as mulheres, são alvo de assédio sexual, verbal ou fisicamente, e de violência doméstica, criticando o facto de, em muitos campos, as casas de banho serem comuns aos dois sexos.

1.2.17

Nações Unidas e a Amnistia internacional suspeitam de crimes contra a humanidade

in TSF

Desde outubro que a situação da minoria Rohingya na Birmânia se tem agravado. 66 mil pessoas foram obrigadas a fugir. Aung San Suu Kyi é acusada de passividade perante as ações dos militares.

A situação começou a agravar-se no dia 9 de outubro quando nove agentes morreram durante ataques contra postos da polícia no estado de Rakhine, no oeste da Birmânia.

A jornalista Margarida Serra conversou com Laura Haigh

É aí que residem os Rohingya, uma minoria étnica e religiosa que as autoridades classificam como não cidadãos. A TSF conversou com Laura Haigh, da Amnistia Internacional, que estava na Birmânia quando a última vaga de violência contra os Rohingya começou e fala dos excessos praticados.

14.6.16

Aumentam os crimes de violência xenófoba

Rita Salcedas, in "Jornal de Notícias"

Em dois anos, de 2013 a 2015, os crimes de ódio alastraram por toda a Alemanha. A escalada de violência tem motivos racistas e coincide com o aumento do fluxo migratório para a Europa. As falhas nas respostas das autoridades alemãs ao fenómeno expõem a necessidade de reforçar a proteção das vítimas e de abrir inquéritos independentes a possíveis preconceitos existentes nas agências de segurança, alerta a Amnistia internacional (AI), em relatório publicado ontem.

A investigação, intitulada "Viver na insegurança: a Alemanha está a falhar em relação às vítimas de violência racista", relata ainda o fracasso das investigações à vaga de homicídios cometidos pelo grupo de extrema-direita Nationalsozialistischer Untergrund (NSU).

No ano passado, houve 16 vezes mais crimes contra centros de acolhimento do que em 2013, num aumento de 63 para 1031. Os crimes racistas violentos contra minorias étnicas, raciais e religiosas subiram 87%, de 693 registados há três anos para 1295 em 2015.

AI, muitas vítimas afirmaram que vivem imersas no medo e que já não se sentem seguras na Alemanha. Ciwan é curdo e foi atacado em Dresden em setembro de 2015.
"Todos os meus amigos ficaram com medo depois de eu ter sido atacado. Fugi da guerra na Síria e não preciso de ter de enfrentar esta tensão na Alemanha. Só gostava de poder trabalhar, ter uma vida boa, como tinha antes da guerra." Combate ao racismo institucional Mas o fracasso das autoridades alemãs na investigação e condenação dos crimes raciais não é de agora.

antecedendo a chegada de cerca de um milhão de refugiados ao país em 2015. "Muitas deficiências judiciais foram expostas nas investigações aos homicídios cometidos, de 2000 a 2007, pelo NSU", diz a AI.

Segundo o relatório, três membros do NSU terão assassinado dez pessoas em seis regiões. Nove vítimas eram de descendência turca e grega e a outra um agente da Polícia. Além de vários assaltos, o mesmo grupo terá sido o responsável por dois ataques bombistas em Colónia, em 2001 e 2004.

Mais recente é o caso de Abdurrahman. Agredido por nove homens em 2013, quando fechava a sua loja de kebabs, o turco contaria, depois, que os agentes que acorreram ao local entregaram aos atacantes uma das provas usadas na agressão, uma bomba de ar.

Em ambos os casos, as investigações não resultaram na identificação de motivação racista dos ataques, nem prosseguiram na análise de pistas que apontavam nesse sentido. Em simultâneo, familiares das vítimas reportaram sentiremse pressionados pela polícia.

"Ao longo de todos estes anos.
nunca nos trataram como vítimas.
Fomos sempre tratados como suspeitos, pela Polícia ou pelos políticos, como se escondêssemos algo. Ninguém nos pediu a opinião, nem nos ouviu", recordou Yvonne Boulgarides, viúva de um serralheiro que foi assassinado por membros do NSU, na sua loja em Munique, em 2005.

1.6.16

Drama dos refugiados é a grande preocupação em matéria de Direitos Humanos

In "TVI 24"

No dia em que a Amnistia Internacional celebra 55 anos, o novo diretor da secção portuguesa da organização fala das grandes preocupações em matéria de Direitos Humanos

Amnistia divulga política de proteção de direitos dos trabalhadores sexuais

In "Mundo ao Minuto"

A Amnistia Internacional divulgou hoje a sua política de proteção dos trabalhadores sexuais de abusos e violações de direitos humanos, em que faz vários apelos aos Governos para garantirem a sua segurança e o fim da discriminação.

"Os trabalhadores sexuais correm um elevado risco de todo um leque de abusos e violações dos direitos humanos, entre os quais violação, violência, extorsão e discriminação. Demasiadas vezes não recebem qualquer, ou muito pouca, proteção da lei ou meios de reparação", disse Tawanda Mutasah, diretor da Amnistia Internacional (AI) para o Direito e a Política, em comunicado enviado à Lusa.

"A nossa política define como é que os Governos hão de fazer mais para proteger as pessoas que fazem trabalho sexual de violações e abusos", acrescentou, explicando que a nova política "é o culminar de extensas consultas à escala mundial, uma atenta revisão de provas materiais e de normas internacionais de direitos humanos e investigação direta, realizada ao longo de mais de dois anos".

O responsável sublinhou que a adoção formal e a publicação desta política surgem na sequência "de uma decisão democrática tomada pelo movimento global da Amnistia Internacional em agosto de 2015".

"A política lança vários apelos aos Governos, entre os quais para assegurarem a proteção contra danos, exploração e coerção; a participação dos trabalhadores sexuais no desenvolvimento de leis que envolvem as suas vidas e a sua segurança; o fim da discriminação e o acesso a opções de educação e emprego para todos", lê-se no comunicado.

A organização de defesa dos direitos humanos recomenda também "a descriminalização do trabalho sexual consensual, incluindo as leis que proíbem atividades associadas, como compra, solicitação e organização geral do trabalho sexual", com base em "provas de que tais leis trazem muitas vezes mais insegurança aos trabalhadores sexuais e fornecem impunidade aos abusadores, sendo os trabalhadores sexuais frequentemente penalizados por relatarem o crime à polícia".

Segundo a AI, "as leis do trabalho sexual deviam centrar-se em proteger as pessoas de exploração e abusos, em vez de tentarem proibir a existência de trabalho sexual e penalizarem os trabalhadores" do setor.

Esta política reforça a posição da AI de que "o trabalho forçado, a exploração sexual de crianças e o trafico de seres humanos são abusos odiosos dos direitos humanos que requerem ação concertada e devem ser, nos termos do direito internacional, criminalizados em todos os países".

"Queremos que as leis se concentrem para tornar as vidas dos trabalhadores do sexo mais seguras e melhorar a relação que têm com a polícia para resolver o muito real problema da exploração", frisou Tawanda Mutasah.

"Queremos que os Governos garantam que ninguém é coagido a vender sexo ou é impedido de abandonar o trabalho sexual se assim o decidir", concluiu o responsável da Amnistia Internacional.

24.5.16

Refugiados: os povos mais disponíveis e os menos acolhedores

In "Económico"

Lista dos povos que mostram maior vontade de acolher refugiados foi divulgada pela organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional. Veja aqui o ranking.

Chineses, alemães e britânicos estão no topo a lista dos povos que mostram maior vontade de acolher refugiados, de acordo com a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional.

Russos, Indonésios e tailandeses são considerados os menos acolhedores dos 27 países analisados no Índice de Acolhimento de Refugiados (Refugees Welcome Index), que mede os níveis de aceitação pública dos refugiados.

O índice coloca os países numa escala baseada na disponibilidade, manifestada pelos seus cidadãos, para receber refugiados nas suas casas, bairros, cidades ou vilas e países.

Na China, país classificado como o mais acolhedor, 46% das pessoas disse estar disponível para receber refugiados em sua casa.

Em segundo lugar ficou o Reino Unido, com 29% a manifestarem essa disponibilidade. Já na Alemanha, um em cada dez cidadãos afirmou que aceitaria refugiados em sua casa, 56% acolheria no seu bairro e 96% no país.

Na Rússia, país com a pior classificação, 61% disse rejeitar que os refugiados tenham acesso ao seu país.

O índice da Amnistia incluiu inquéritos a mais de 27 mil pessoas e foi realizado pela empresa GlobeScan.

1ª cimeira humanitária mundial

Rita M. Soares, in "Antena 1"

António Costa vai defender na Turquia uma política europeia coordenada em vez do fecho de fronteiras. O primeiro-ministro é um dos muitos responsáveis de governo de todo o mundo que se juntam na 1ª cimeira humanitária mundial.
Declarações de António Guterres; Pedro Neto, da Amnistia Internacional.

Chineses são os mais disponíveis para acolher refugiados -- Índice da Amnistia

In "Correio da Manhã"

Chineses, alemães e britânicos estão no topo a lista dos povos que mostram maior vontade de acolher refugiados, de acordo com a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional. Russos, Indonésios e tailandeses são considerados os menos acolhedores dos 27 países analisados no Índice de Acolhimento de Refugiados (Refugees Welcome Index), que mede os níveis de aceitação pública dos refugiados. O índice coloca os países numa escala baseada na disponibilidade, manifestada pelos seus cidadãos, para receber refugiados nas suas casas, bairros, cidades ou vilas e países.