12.5.12

Bruxelas prevê mais 92 mil desempregados do que previa há 6 meses

Por Bruno Faria Lopes, in iOnline

O mercado de trabalho português está a cair a um ritmo muito mais intenso do que qualquer instituição – europeia ou nacional – conseguiu prever. A Comissão Europeia reviu ontem em alta a taxa de desemprego este ano para um novo recorde de 15,5%, depois de há apenas seis meses ter feito uma revisão para 13,6%. A diferença significa que no espaço de um semestre Bruxelas passou a esperar cerca de 92 mil desempregados adicionais em Portugal. A magnitude da revisão estendeu-se ao próximo ano – projecção de 15,1% face à anterior de 13,7% – e é encarada por Bruxelas e pelo governo como o principal risco do programa de ajustamento a que Portugal está sujeito.

“A taxa de desemprego aumentou para 15% em Fevereiro e vai subir mais este ano”, lê-se no capítulo dedicado a Portugal no boletim. Mais à frente no documento, a Comissão alerta que “a deterioração substancial da situação no mercado de trabalho” é um dos riscos que se está a materializar e que ameaça o cumprimento da meta para o défice orçamental. Mesmo com o agravamento do desemprego, Bruxelas insiste que a meta orçamental de 4,5% do PIB continua “válida” e diz esperar uma “consolidação mais apertada” das contas (ver texto ao lado).

O governo não tem, para já, uma explicação para o comportamento do desemprego. O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, anunciou esta semana que o governo está a analisar os dados do mercado de trabalho com o FMI e o Banco de Portugal para perceber a magnitude e as razões do afundamento maior do que o esperado. O resultado será publicado em Junho, com a quarta avaliação do programa da troika, e o governo já começou a abrir caminho para rever em alta as suas próprias previsões (14,5% para 2012 e 14,1% em 2013). A previsão de 12,7% em 2016 começa a parecer uma miragem, o que sugere que a situação continuará negra mesmo depois da esperada retoma da economia.

O disparo na taxa de desemprego aconteceu no último trimestre do ano passado, que registou a maior variação de sempre nas séries do Instituto Nacional de Estatística (INE). Em teoria, o ritmo do colapso do mercado de trabalho parece dissonante do ciclo económico. O desemprego reage tipicamente com um atraso de três a seis meses às flutuações económicas e em 2011 a recessão até acabou por ser menor do que o esperado.

Na realidade, contudo, o desemprego não está a reagir com atraso ao ciclo económico. “Uma das grandes diferenças desta crise está nas expectativas nas empresas: o choque na economia está a ser encarado como permanente, em vez de transitório como é habitual, o que leva a maior destruição de empregos”, explica um economista de uma instituição pública, que preferiu o anonimato.

A somar há outros factores importantes, como a segmentação do mercado de trabalho (entre precários e permanentes) e a incerteza sobre o desfecho da crise do euro (ver caixas). A troika e o governo parecem também não ter contado com a fragilidade profunda das empresas portuguesas, dependentes de crédito bancário (que está a ser cortado, como realça a Comissão), do Estado (que está a reduzir despesa e a adiar pagamentos) e do mercado interno (em queda).

O primeiro-ministro reagiu ontem aos números, afirmando que “o desemprego pode representar uma oportunidade” e que “não tem de ser um estigma”

Salários caem 12% em quatro anos. A pressão do desemprego recorde é em sim mesma uma força no sentido da redução de salários. A “desvalorização interna” – eufemismo em economês para redução de salários e de preços – é um dos objectivos da troika e do governo para relançar a competitividade externa de Portugal. As previsões da Comissão Europeia parecem confirmar este caminho: este ano e no próximo o nível salarial real (contando com a erosão da inflação) médio em Portugal caírá 5,6% Ao todo, entre 2010 e 2013, Bruxelas espera que os salários reais dos portugueses caiam em média 9,6%, um processo que deverá continuar em 2014 e que, como já noticiou o i, representará um recuo de uma década no nível salarial em Portugal.