9.5.12

Há “uma agenda de género” na Assembleia da República

in Público on-line

Uma equipa de investigadores portugueses que estudou a actividade das deputadas parlamentares entre 1975 e 2002 encontrou “uma agenda de género” na Assembleia da República e “uma clivagem” entre lei e prática, resumiu a coordenadora do projecto.

Ana Cabrera, coordenadora do estudo “Política no feminino - políticas de género e estratégias de visibilidade das deputadas parlamentares”, cujos resultados são apresentados e debatidos hoje, na Assembleia da República, contou que “um dos objectivos” era colmatar a “pouca ou nenhuma investigação” que ligasse a representação feminina no Parlamento e a análise que a comunicação social tem feito da mesma.

Outro propósito era encontrar “uma agenda feminina da Assembleia”, identificando as iniciativas propostas pelas deputadas. “Acho que encontrámos, de facto. E isso o que é? É um conjunto de temas que dizem particularmente respeito às questões da mulher”, constata a investigadora do Centro de Investigação Media e Jornalismo, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Ana Cabrera hesita em usar a palavra “feminista”, porque essa “agenda” não tem sido só veiculada por mulheres, mas também por homens. “É uma agenda de género”, prefere.

O estudo analisa como as mulheres eram vistas na Assembleia e que actividades parlamentares desempenhavam, entre 1975 e 2002. “Enquanto na Constituinte, ou na primeira ou na segunda legislatura, as deputadas parlamentares dedicavam-se essencialmente às questões da educação e pouco mais, por aqueles assuntos que são tradicionalmente femininos, dez anos mais tarde esses já não são os assuntos que interessam às mulheres e elas percorrem todas as comissões”, compara.

No período estudado, a investigadora destaca “um momento fundamental”, em 1994, quando três deputadas organizam um “pseudo-acontecimento”, a constituição de um parlamento paritário, promovendo o debate sobre “a disparidade de representação que havia na Assembleia”.

No jornalismo, registou-se “uma grande evolução” entre 1975 e 2002, com maior atenção sobre a actividade parlamentar. Em 1975, os jornalistas estavam mais atentos “ao que se passava na rua” e da Assembleia faziam umas crónicas “mínimas”, nas quais comentar a situação das mulheres “era ainda mais ínfimo”.

Hoje, o discurso parlamentar nem sempre tem em conta a dimensão de género, reconhece a investigadora. “Ainda há muitos estereótipos. São situações que estão profundamente arreigadas na mentalidade de homens e de mulheres”, frisa.

Simultaneamente, adianta, persiste uma “clivagem” entre a lei e a prática, sendo a primeira “muito mais avançada do que aquilo quese faz”.

“Temos leis, no que respeita à igualdade de género, muito boas, muito para a frente, muito progressistas, mas depois as práticas sociais, as mentalidades não acompanham, nem podem acompanhar, essa mudança, porque ela tem sido rápida demais”, realça.

Os resultados da investigação, que envolveu nove pessoas, serão apresentados e debatidos hoje, numa conferência na Assembleia da República. A sessão de encerramento da conferência será presidida pela secretária de Estado da Igualdade, Teresa Morais.