por Pedro Mesquita, in RR
Depois do mar, a Renascença olha para o sector da indústria, em dificuldades por falta de crédito e quebra no poder de compra.
Sem tempo para esperar pela "reindustrialização" anunciada por Álvaro Santos Pereira, há patrões e empregados a lutar, todos os dias, pela sobrevivência das suas empresas. A Renascença foi ao terreno verificar o que pensam os empresários e os conselhos que dão ao Governo.
Na fábrica de calçado Macosmi, em S. Martinho do Campo, no concelho de Santo Tirso, o trabalho é repetitivo, mas José Ferreira, que cose numa das máquinas, agarra-o como pode, pois sabe que o futuro da empresa também depende do seu esforço.
"Acho que passa por toda a gente, pelo Governo, empresários, por nós próprios". José faz a sua parte: "Trabalho, ajudo a empresa, se for preciso dar horas extra, venho trabalhar".
No escritório, o sócio-gerente da empresa José Machado só pensa em como dar a volta à crise. Tem pistas: reinventar o conceito de sapatos e botas, conquistar novos mercados: "99,9% é para exportação", atira.
A Macosmi quer crescer no mercado nacional, mas não é fácil. "O povo português tem muitas dificuldades. Não tem dinheiro para pagar 200, 300 euros por um par de sapatos", constata o empresário.
Mas o que será, afinal, a "reindustrialização" pretendida pelo ministro da Economia? José Machado não vai ficar sentado à espera: "Nós já fazemos essa reindustrialização, já investimos em contraciclo. Mesmo vendo que o mercado está difícil, continuamos a apostar na indústria. Nós acreditamos na indústria", afirma.
Claro que o Governo e a banca podem ajudar. O que é necessário? "Crédito, crédito concedido às empresas. É impossível reindustrializar sem apoio, sem dinheiro", vinca. "É preciso comprar maquinaria", exemplifica.
Aposta noutros mercados
A Jomape, no Marco de Canavezes, trabalha com arames. Produz redes electrosoldadas para a construção. O problema é que o país travou a fundo. Há que procurar outros mercados, explica o director da empresa, Bruno Pinto.
"Cá em Portugal está cada vez mais complicado. Vemos empresas a fechar, nossas vizinhas, nossos clientes. Por isso, a nossa aposta tem que ser cada vez mais no mercado externo", reflecte.
O Governo pode dar uma ajuda através de "linhas específicas de apoio à exportação", sugere. Mas, fundamental será baixar os impostos – e não apenas o IRC. "É mesmo em todos: nos impostos às empresas, mas também às pessoas singulares, porque com este nível de impostos ninguém tem rendimento disponível".
E a reindustrialização? "Não estou a ver a luz ao fundo do túnel. Vai andar-se aqui a discutir durante muito tempo mas, na prática, vai-se fazer muito pouco", prevê.
Investir sempre
Numa outra fábrica, a Inarbel, desta vez do sector têxtil, a maior empregadora do concelho de Marco de Canavezes, com 200 trabalhadores. Os teares de última geração traduzem o investimento contínuo que faz.
"Essa capacidade que os donos da empresa sempre tiveram de, em vez de investirem em Ferraris, investirem na própria empresa fez com que a empresa sempre estivesse um pouco à frente", considera João Conde, responsável comercial da Inarbel.
O produto da empresa é macio, mas o tom é mais áspero quando a agulha vira para a anunciada reindustrialização: "[Vejo isso] com uma enorme desconfiança porque, se o ministro da Economia diz uma coisa, o das Finanças diz outra", lamenta o responsável.
Entendam-se, pede, até porque as barreiras são muitas. Faltam "linhas de crédito para ajudar as empresas a investir" e é obrigatório "rever a carga fiscal", sublinha.
João Conde deixa o conselho: para se decidir, o Governo deve conhecer o país real. "Seria bom que um ministro viesse passar um dia ou dois a uma empresa para ver como se trabalha, qual é a realidade das coisas. Só a partir daí poderão tomar decisões acertadas", sustenta.
A Inarbel faz o trabalho de casa, investe em tecnologia de ponta, na qualidade dos produtos e procura novos mercados.