20.1.14

Dívidas. Comece a negociar cedo para evitar a insolvência

Por Sónia Peres Pinto, in iOnline

Quando as dívidas começam a acumular, o pior que pode fazer é "esperar para ver". Fale com os credores e estabeleça acordos de pagamento. Caso contrário, corre o risco de perder a casa ou outros bens que poderão ser vendidos

Mais de 15% das famílias inquiridas pela Associação de Defesa do Consumidor (Deco) - num inquérito a 2230 famílias - vive em dificuldades e uma em cada dez já não consegue pagar a casa (seja crédito, seja renda), os serviços essenciais e os cuidados médicos. Já cerca de dois quintos dos inquiridos gastam mais do que ganham, terminando o mês com um saldo negativo na ordem dos 300 euros. Feitas as contas, as famílias gastam uma média de 800 euros mensais com a casa, a alimentação, os serviços essenciais e os transportes.

Para evitar entrar numa situação de incumprimento, o melhor é começar a pensar em tornar as contas sustentáveis. Uma das alternativas passa por renegociar as condições dos contratos, caso contrário a solução que lhe resta é pedir insolvência (ver quadro ao lado).

créditos bancários. Renegociar o crédito é um dos primeiros passos a dar antes de entrar numa situação de incumprimento. Uma das hipóteses passa por reduzir o spread (margem financeira do banco), uma vez que, diminui o volume de juros a pagar. Esta tarefa nem sempre é fácil, já que a maioria das instituições financeiras nestes casos "obriga" à contratação de outros produtos (por exemplo, cartão de crédito, PPR), cujo custo pode anular a poupança conseguida.

Alargar o prazo também pode ser uma alternativa, assim como pedir um período de carência de juros e durante esse período não reduzir o montante em dívida. Outra solução poderá passar por pedir o diferimento de capital. Neste caso, amortiza menos todos os meses, mas terá de pagar o que falta, de uma só vez, no final do prazo. "Estas três soluções permitem diminuir os encargos mensais no imediato, mas implicam pagar mais pelo empréstimo, pelo que há que ponderar se é mesmo necessário", alerta a Deco, chamando ainda a atenção para o facto de o crédito à habitação ser o mais "sensível" já que em caso de incumprimento, a casa fica hipotecada. "Para tentar evitar a perda do lar, pode proceder à designação da prestação do crédito à habitação, isso significa que o pagamento desta prestação terá sempre prioridade em relação a outros".

Não se esqueça que até ao final de 2015, está em vigor o regime extraordinário de protecção de devedores de crédito à habitação para consumidores em situação económica muito difícil. Nestes casos, o banco tem de apresentar uma proposta de reestruturação da dívida ou medidas para extinguir uma parte ou a totalidade da dívida. É o caso, por exemplo, da dação em cumprimento (entrega do imóvel ao banco para amortizar o crédito), a venda do imóvel a um fundo de investimento para arrendamento e que prevê a permanência do antigo proprietário na qualidade de arrendatário ou a permuta por um valor de imóvel de valor inferior.

Mas nem tudo são facilidades. As condições de acesso a este programa são muito restritivas. "Nos primeiros seis meses de 2013, foram feitos cerca de 1320 pedidos, mas foram aceites menos de 250, segundo o Banco de Portugal", alerta a Deco.



renda da casa. Também aqui uma das soluções poderá passar por negociar as condições com o senhorio. "Estas podem passar por reduzir o valor da renda ou suspender provisoriamente o pagamento", diz a associação.

Não se esqueça que, a partir do segundo mês de atraso de renda, o proprietário pode iniciar o processo de despejo. É possível, no entanto, recorrer ao subsídio de renda, destinado a ajudar os arrendatários carenciados, cujo valor tenha sido aumentado em sequência da nova lei do arrendamento que entrou em vigor em Novembro de 2012.

serviços. Há determinados serviços considerados essenciais (como o abastecimento de água, gás, luz, entre outros) e, tal como acontece nas outras situações, a melhor opção é tentar resolver o problema "a bem" com o fornecedor. "Poderão ser estabelecidas parcelas mais pequenas ou um prazo mais alargado para pagar a dívida", afirma a entidade.

Mas conte com prazos. No caso das comunicações, se a factura não for paga dentro do prazo, o fornecedor deve enviar um aviso ao consumidor até 10 dias da data-limite para pagamento, a informar que tem mais 30 dias para pagar. Mas se a dívida continuar por liquidar, a operadora tem 10 dias para suspender o serviço. "Se o cliente pagar o serviço deve ser reposto até cinco dias. O mesmo acontece se as partes formalizarem um acordo de pagamento. Se nada fizer, o contrato cessa automaticamente e se estiver no período de fidelização tem de pagar as compensações devidas", diz.

Já no caso do fornecimento de água, gás e luz, os processos são mais simples. "Se o cliente não pagar a factura, a empresa tem de o advertir por escrito, só podendo suspender o serviço entre 10 a 20 dias depois da comunicação", acrescentando ainda que "as empresas podem cobrar juros de mora e taxas pelo corte e posterior activação do serviço após regularização das dívidas", conclui a Deco.

Insolvência. O último patamar

. A insolvência só deve ser usada em último recurso e quando todas as outras alternativas (nomeadamente a consolidação de créditos) se mostram ineficazes. Por exemplo, quando as dívidas são muitas, a entrega de casa ao banco, por si só, pode não resolver o problema. Por isso mesmo, se não tiver mais bens para penhorar a única solução é pedir a insolvência pessoal no tribunal

• Para que lhe sejam perdoadas as dívidas ao fim de cinco anos (excepto as relacionadas com o fisco) tem de requerer a “insolvência com a exoneração do passivo”, o que deve acontecer, o mais tardar, após seis meses de incumprimento. Decorrido o prazo fica livre das obrigações, até aí tem de viver com uma “mesada” que não pode exceder três vezes o salário mínimo: 1455 euros, uma vez que, durante este processo, todo o património é apreendido para pagar aos credores

• Outra via é apresentar um plano de pagamentos que seja aceite pelos credores. Todavia há regras: não pode ter dívidas laborais, nem ter sido proprietário de uma empresa nos três anos anteriores ao início do processo. Além disso, não pode ter mais de 20 credores, nem uma dívida superior a 300 mil euros

• Quando for declarado insolvente é afixado um edital no seu local de trabalho e no tribunal. A nova situação passa também a constar da Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal. No entanto, o cadastro é limpo após estar tudo regularizado