Pedro Crisóstomo e Raquel Almeida Correia, in Público on-line
Norte perde verbas, mas mantém maior fatia do financiamento do FEDER. Centro, Açores e Madeira passam a receber menos. Lisboa, Algarve e Alentejo reforçam fundos.
A distribuição de verbas do novo programa de fundos comunitários vai tirar às regiões quase 590 milhões de euros, revela o acordo de parceria que foi apresentado nesta sexta-feira pelo Governo a Bruxelas. Ao abrigo do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), os programas operacionais a aplicar entre 2014 e 2020 baixam para 7236 milhões de euros, o que representa menos 7,53% em relação ao montante do actual Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN). Mas nem todas as regiões perdem financiamento.
Enquanto o Norte, o Centro, os Açores e a Madeira vêem o financiamento diminuir, Lisboa, Alentejo e Algarve passam a receber mais fundos em comparação com o actual quadro, segundo cálculos do PÚBLICO com base em dados oficiais da Comissão Europeia. O programa operacional (PO) regional de Lisboa, a segunda região que menos dinheiro recebe do FEDER, é aquela que passa a ter mais dinheiro face ao montante actual. Com um crescimento de 82,2%, o financiamento engorda 281 milhões — de 341,3 milhões para 622 milhões.
Os dados constam do “Acordo de Parceria 2014-2020”, que tem vindo a ser preparado pelo Governo nos últimos meses e que agrega as grandes linhas da estratégia de desenvolvimento regional para o quadro comunitário que se segue ao QREN 2007-2013 e ao qual o executivo deu o nome “Portugal 2020”.
Imediatamente a seguir à região de Lisboa está o Algarve, que ganha do FEDER mais 15,1% com a nova programação de fundos. Em vez de verbas de 194,6 milhões, passa a contar com 224 milhões, ou seja, mais 29 milhões de euros. O Alentejo, que até agora recebia 966,3 milhões de euros, tem um acréscimo de 6,6%, para 1030 milhões (mais 64 milhões).
Já a Madeira tem a maior queda percentual no financiamento, com um corte para quase metade. Uma diminuição de 48,4% faz baixar a verbas de 356,9 milhões de euros para 183,9 milhões, perdendo por ano 173 milhões. Os Açores, que até agora recebiam 1074 milhões, passam a contar com 767 milhões, um corte de 28,6%, equivalente a 307 milhões.
Na região Centro, a descida é de 11,5%, com a diferença a equivaler a 217 milhões de euros (de 1890 milhões para 1673 milhões). O Norte mantém-se como a região que mais fundos recebe do FEDER, mesmo com um corte de 265 milhões de euros. Enquanto no actual QREN a região tinha destinados 3002 milhões de euros, agora terá de contar com uma verba de 2737 milhões, menos 8,8%.
No documento apresentado nesta sexta-feira em Bruxelas, os programas operacionais das diferentes regiões não abrangem apenas o FEDER, embora este fundo seja, regra geral, a principal fonte de financiamento. Há ainda verbas que provêm do Fundo Social Europeu e, no caso dos programas das regiões autónomas, há ainda o mecanismo de apoio previsto para as regiões ultraperiféricas (RUP). Até ao momento, só foi possível comparar as verbas do FEDER face ao actual QREN.
O novo quadro comunitário de apoio tem estado na agenda mediática nas últimas semanas, não só pelo aproximar da apresentação do acordo de parceria, mas também pelos apelos que têm sido dirigidas ao Governo, especialmente por parte das autarquias. Esta semana, o presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, Manuel Machado, confirmou a existência de discussões com o executivo sobre o próximo QREN, mas considerou ainda há questões que “estão muito nebulosas” e “pouco claras”.
Os maiores protestos chegaram da Câmara Municipal do Porto, com o presidente Rui Moreira a reclamar uma “participação activa” na discussão dos fundos comunitários e a acusar o Governo de atrasos no processo, pelo facto de Bruxelas recusar “assinar o acordo de parceria proposto pelo Estado português”.
No total, o novo QREN disponibilizará verbas comunitárias no valor de 21.182 milhões de euros, às quais acrescem cerca de 4000 milhões de euros provenientes do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural. A maior fatia dos fundos será destinada, tal como o PÚBLICO noticia nesta sexta-feira, às pequenas e médias empresas, seguindo-se os incentivos ao ensino e à formação ao longo da vida.
O regulamento estabelece que a Comissão Europeia tem três meses para analisar o acordo de parceria, a partir do momento em que é apresentado, e que este tem de ser adoptado no prazo de quatro meses após a entrega. Ou seja, o documento deverá entrar em vigor entre Maio e Abril, embora ainda seja necessário submeter a Bruxelas os pressupostos dos diferentes programas operacionais, que têm de estar no terreno no máximo até Janeiro de 2015.
Um acordo consensual, mas sem sinal da oposição
No documento entregue à Comissão Europeia, escreve-se que o acordo de parceria se baseou “num trabalho amplamente consensualizado tanto no Governo e na administração pública, como nas várias entidades da sociedade civil e no público em geral”. São elencadas, aliás, algumas das entidades envolvidas nos “trabalhos preparatórios” do novo quadro comunitário, como a Assembleia da República, a Concertação Social e a Associação Nacional de Municípios Portugueses. No entanto, não há uma única referência a interacções com partidos da oposição.
O Governo refere que “foram realizadas audições especialmente dedicadas à preparação do acordo de parceria” em sede de comissão parlamentar. E que foi conferido aos municípios “um papel privilegiado na auscultação institucional”. Faz ainda referência a “reuniões conjuntas periódicas para auscultação, discussão e apresentação das principais decisões” com os membros da Comissão Permanente da Concertação Sindical, que integra as principais associações patronais e as centrais sindicais CGTP e UGT.
No documento é também destacado o contributo do comité de especialistas, criado para debater as opções estratégicas do novo quadro comunitário que vigorará até 2020. Desse grupo fazem parte personalidades como o sociólogo António Barreto e os economistas Augusto Mateus e Daniel Bessa. E, por fim, é referido um período de “auscultação ao público”, entre Junho e Agosto de 2013, durante o qual “foram recebidos 145 contributos de organizações sindicais, empresariais, entidades da sociedade civil, representantes de sectores económicos, municípios e cidadãos individuais”.
Ao longo deste capítulo, destinado a explicar os princípios do acordo de parceira, não há, porém, uma única referência aos partidos da oposição. Uma ausência que ganha relevância pelo facto de, nos últimos dias, se ter aberto uma guerra entre o PS e o Governo por causa da preparação do novo quadro comunitário de apoio.
Os socialistas deram contribuições para as versões do acordo que o executivo enviou a Bruxelas nos últimos meses, mas não terão recebido feedback dos resultados das negociações. Além disso, a penúltima versão do documento seguiu para a Comissão Europeia a 16 de Janeiro, o mesmo dia em que o Governo a enviou ao PS, sem que pedisse a contribuição do maior partido da oposição para o documento final.
Fonte da direcção socialista garantiu esta semana que “o PS desconhece as reacções da Comissão Europeia sobre os documentos do Governo relativos aos fundos comunitários (2014- 2020) e apenas teve conhecimento da última versão da proposta do Governo no mesmo dia em que foi enviada para Bruxelas. Esclarece-se que nunca houve nenhuma negociação do PS com o Governo sobre fundos comunitários nem há qualquer trabalho conjunto.”
Em entrevista ao PÚBLICO, que será publicada no próximo domingo, o ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional assegurou que “o PS foi consultado relativamente às diferentes versões e contribuiu para várias dessas versões”, tendo para isso participado em reuniões com o Governo.
O governante recusou liminarmente as críticas dos socialistas por não terem sido consultados para o acordo de parceria que entregou nesta sexta-feira em Bruxelas. Mas não quer entrar em pormenores sobre o tipo de informação que o executivo disponibilizou à equipa socialista. “Não quero acreditar que essas afirmações que ouvi sejam uma fonte oficial do PS. Eu e o Governo mantivemos contactos regulares sob grande reserva, tal como o PS nos solicitou”, referiu Poiares Maduro. Com Isabel Arriaga e Cunha, Maria Lopes e Miguel Gaspar