31.1.14

Instituições que lidam com crianças já são obrigadas a pedir registos criminais

Por Sílvia Caneco, in iOnline

Em 2012, PGR era contra base de dados. E Pinto Monteiro não dizia ser uma medida "perigosíssima"

A legislação já prevê um mecanismo para que instituições a trabalhar com menores consigam evitar contratar quem já cumpriu penas por crimes sexuais. A lei de 2009 que estabelece medidas de protecção de menores determina que, "no recrutamento para profissões, empregos, funções ou actividades, públicas ou privadas", cujo exercício "envolva contacto regular com menores, a entidade recrutadora está obrigada a pedir ao candidato a apresentação de certificado de registo criminal". Na prática, os infantários, por exemplo, não só têm direito a conhecer o cadastro daqueles que pretendem contratar, como são obrigados a pedi-lo.

Além dos polícias, juízes e magistrados do Ministério Público, também a Segurança Social, por exemplo, tem acesso aos certificados de registo criminal dos candidatos à adopção de uma criança. O registo de um cidadão condenado não é eterno, mas quanto maior a gravidade de um crime, mais tempo demorará a ter um cadastro limpo. No caso de uma pena de prisão por crimes contra a liberdade sexual, como a violação, a coacção sexual, o abuso sexual de pessoa incapaz ou de pessoa internada, será preciso contar 23 anos a partir do último dia da pena para que esse cadastro seja apagado. E isto, claro, se entretanto não tiver havido nova condenação.

Porém, ainda não ficou claro quem terá acesso à base de dados de predadores sexuais que a ministra da Justiça pretende criar, nem em que será diferente de um registo criminal. Paula Teixeira da Cruz deixou apenas claro que esse registo não ficará acessível a qualquer um, que se dirigirá, pelo menos, a polícias e a instituições que trabalham com crianças e que dessa base de dados apenas farão parte agressores sexuais já condenados. Ao que o i averiguou, o projecto ainda está numa fase embrionária, estando a ser estudada uma solução jurídica que não colida com a Constituição.

A intenção de criar um sistema de referenciação de pedófilos foi anunciada pela ministra em Junho de 2012 e causou desde logo polémica. Joana Marques Vidal, hoje procuradora- -geral da República (PGR) e então presidente da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), era contra o projecto. "Só admito a possibilidade de as polícias terem acesso à identificação, e em casos de especial gravidade ou de reincidência", afirmou ao "Expresso", rebatendo um estudo apresentado por Paula Teixeira da Cruz. "A ministra diz que há mais de 90% de reincidência neste tipo de crime, mas o único que conheço, que se refere à criminalidade sexual em geral, diz 20%." Pinto Monteiro, PGR naquela data, admitia que, se o tema tinha sido "objecto de reflexão em vários países", deveria "sê-lo também em Portugal". Esta quarta-feira, o tom mudou, com o ex-PGR a considerar a medida "popular" e "perigosíssima".