2.4.20

Proximidade em tempo de isolamento

Emanuel Câmara, Jornal da Madeira

Por muito que nos esforcemos e que mantenhamos a calma e a serenidade, essenciais em cenários como aquele a que atualmente assistimos, os tempos que se vivem são difíceis e exigem do nosso psicológico grande capacidade de resistência.

Por estes dias, para salvaguardar a nossa vida e a nossa saúde, ou não fossem eles os bens mais preciosos, vemo-nos privados de gestos banais e de tal forma entranhados no nosso quotidiano que à maioria de nós, há seis meses atrás, não nos passava pela cabeça que tal reviravolta pudesse suceder.

Em menos de nada, por imperiosa necessidade, vemo-nos mergulhados no silêncio e no isolamento, cenário paradoxal num concelho como o Porto Moniz onde, nos últimos anos, de forma dedicada, tem sido levado a cabo um trabalho sério, expresso num leque de atividades promotoras do envelhecimento ativo e cujos frutos já eram bem visíveis.

A população idosa do concelho do Porto Moniz estava fora de casa e convivia mais do que nunca, mas porque a sua saúde está em primeiro lugar nem hesitamos quando chegou a hora de aconselharmos os nossos séniores a se manterem em casa, e diga-se que a maioria tem cumprido tal pedido de forma exemplar.

Estamos desejosos por voltarmos a ver os nossos idosos nas ruas do nosso concelho e de sorriso no rosto. Estamos desejosos por voltarmos a abraçá-los e a recebermos as suas constantes manifestações de reconhecimento e agradecimento pelo trabalho que fazemos, tão simplesmente, por sabermos ser esse o nosso dever.

As novas tecnologias, que nos últimos anos nos separaram uns dos outros, invertem agora a sua função e são o meio privilegiado para mantermos contacto, embora sem a proximidade física.

Por incrível que pareça, sinto que o isolamento nos deixou, em alguns aspetos, muito mais próximos. Paramos para dar valor às coisas pequenas e para percebermos que nada é um dado adquirido. Fomos obrigados a parar e isso mostra-nos que a correria da vida, muitas vezes, nos impede de termos tempo para o que realmente importa.

As crianças e os jovens estão em casa, longe do tão saudável ambiente escolar, é certo, mas próximos dos seus pais, alguns mais próximos do que alguma vez estiveram.

Os nossos idosos estão em casa, mas continuamos em contacto com eles, sentem-nos presentes porque sabem que estamos e estaremos lá para o que precisarem. Nem poderia ser de outra maneira.

As ruas estão vazias, mas sabemos que há muitos que continuam a trabalhar para que nada falte a todos e quem sabe não seja este o tempo certo para que nos saia mais vezes da boca, de forma sincera e abnegada, um “Obrigado” dirigido a todos os profissionais de saúde, aos bombeiros, às forças de segurança, aos que viabilizam o funcionamento de farmácias e estabelecimentos de venda de bens alimentares, aos funcionários municipais que continuam a garantir os serviços básicos e que nos permitem que continuemos a ter conforto nas nossas casas.

Não nos esqueçamos, contudo, que a melhor forma de agradecermos a quem continua a trabalhar por e para nós é mostrarmos respeito pelo seu trabalho, e isso, nesta altura, apenas se manifesta de uma forma: ficando em casa.

As ruas estão vazias, mas é importante que continuemos de coração cheio, aguardando os dias em que tudo voltará ao normal, sabendo-se de antemão que muita coisa deixará de ser da mesma forma que era antes de nos vermos mergulhados nesta realidade avassaladora que nos desafia a todos, sem exceção.