Luísa Pinto, in Públio on-line
Até às 23h59 do passado domingo, e na véspera do último dia para os inquilinos sinalizarem junto dos senhorios a sua incapacidade de pagarem a renda habitacional referente ao mês de Abril, o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) recebeu 999 pedidos de empréstimo para o pagamento de rendas.
Num seminário transmitido online, organizado pela Associação de Empresas e Profissionais de Mediação Imobiliária (Apemip) a secretária de Estado da Habitação, Ana Pinho, quis deixar um “reconhecimento público” da capacidade de resposta que o organismo demonstrou, ao ter conseguido definir regulamentos e criar uma plataforma online num tão curto espaço de tempo.
Os regulamentos do IHRU foram a última peça do complexo edifício jurídico a ser lançada por determinação do Governo entre as medidas de apoio à estabilidade habitacional durante o combate à pandemia da covid-19. A portaria que os regulamenta foi publicada há pouco mais de duas semanas. E, de acordo com Iolanda Gávea, vice-presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), talvez seja “a desinformação e a falta de conhecimento por parte dos inquilinos” que pode explica porque é que o número de pedidos de apoio para o pagamento regular das rendas “seja, afinal, tão baixo”.
“Ter 900 ou mil pedidos é muito pouco para a imensidão de contratos e de famílias que ficaram com rendimentos diminuídos”, afirmou Iolanda Gávea ao PÚBLICO. Para a vice-presidente da ALP, os inquilinos tem toda a vantagem em aceder a esta linha de linha de financiamento, já que a forma como ela foi estruturada e regulamentada lhes permite uma carência de seis meses e condições de pagamento muito diluídas no tempo.
Na passada sexta-feira, o Ministério da Habitação referiu-se à entrada de quase 900 pedidos, sendo que apenas quatro deles eram referentes a proprietários. “Recordo que os proprietários também podem pedir este apoio, mas só depois de os inquilinos terem sinalizado esta intenção e apenas no caso de também terem quebras que os deixam com um rendimento inferior ao IAS [Indexante de Apoios Sociais, e que é de 438,81 euros]. Nunca será um apoio generalizado, como poder ser aos inquilinos “, avisou.
Também o presidente da Associação de Inquilinos Lisbonense (AIL), Romão Lavadinho, considera que o número de adesões é “demasiado baixo”, e justifica-o com falta de informação por parte dos potenciais beneficiários. “Nós estamos a fazer um esforço para divulgar os apoios que existem. Mas a verdade é que uma grande parte dos inquilinos não trabalha com novas tecnologias, nem computador tem”, recorda.
E manifesta a preocupação com o que vai acontecer depois do Estado de emergência. “Por agora, os despejos estão suspensos. Mas depois, quando esse período passar, e voltarem os tribunais, os processos, os despejos, temos medo do que pode vir a acontecer”, afirmou.
Esta segunda-feira, dia 27 de Abril, termina o prazo para os inquilinos poderem pedir apoio ao pagamento da renda referente a este mês. O número de pedidos poderá aumentar para o mês de Maio e o mês de Junho, porque o regime é aplicável às rendas vencidas nos meses em que vigore o estado de emergência, a partir de um de Abril, e no mês subsequente.
Foi por estar a pensar “na necessidade de as famílias terem tempo para se reestruturar, e para pagar as rendas em condições muito vantajosas e muito suaves”, que o Governo lançou estas medidas. O executivo está “preocupado que depois do estado de emergência as pessoas consigam manter as suas casas”, explicou Ana Pinho durante o webinar da Apemip.
Os inquilinos que comprovem perda de rendimentos superior a 20%, e estejam a enfrentar uma taxa de esforço para suportar a renda superior a 35%, poderão ter apoio do IHRU, sem juros, para pagar a renda. “Se uma família ficou com uma taxa de esforço de 50%, pode pedir apoio ao IHRU para aceder, sem juros, à verba necessária para pagar a renda a partir dos 35% que são permitidos. Isto é, recebera do IHRU o empréstimo dos 15% em falta”, exemplificou a governante.
E foi também no referido fórum online, com cerca de mil inscritos, quase todos eles mediadores, que a secretária de Estado da Habitação apelou aos esforços destes profissionais para lembrar os investidores que o arrendamento de longa duração e o acesso à habitação por parte da classe média é um investimento seguro e vantajoso.
“Os proprietários podem hoje confirmar, e pelas piores razões possíveis, que colocar os ovos todos no mesmo cesto não é uma boa estratégia de investimento. Percebo que o Alojamento Local fosse mais interessante pela rentabilidade que tinham. Mas a verdade é que aderir ao programa de arrendamento acessível, e colocar as casas 20% abaixo do mercado, lhes traz maior rentabilidade por causa das vantagens fiscais”, lembrou a secretária de Estado.
Os senhorios que aceitarem fazer contratos de arrendamento ao abrigo do Programa de Arrendamento Acessível (PAA) estão isentos de tributação ao nível de IRS ou IRC. O programa foi lançado em Junho de 2019 e em meados de Fevereiro tinha permitido o fecho de 177 contratos.
Durante o seminário, o presidente da Apemip, Luís Lima, referiu-se à transferência dos imóveis em Alojamento Local para o arrendamento de longa duração como a solução para os problemas de acesso à habitação da classe média.
Mas Ana Pinho desmentiu-o. “Não acho que vá ser a solução de todos os problemas, porque mesmo na hipótese muito remota de haver essa migração, e se todas as fracções que estão em alojamento local passassem para arrendamento tradicional, nós continuaríamos a ter um problema. Será sempre necessário ao Governo continuar a sua aposta de aumentar a oferta pública de habitação”, afirmou a secretária de Estado.