Marisa Soares, in Público on-line
Inquérito da Deco revela que muitos familiares de idosos recorreram a "cunhas" para ter vaga. Nos lares, as queixas vão para a falta de actividades físicas e de lazer.
Esperam, quase desesperam, e mesmo quando conseguem vaga não faltam razões de queixa: é este o retrato traçado pela Deco sobre as condições de acesso dos idosos aos lares portugueses. Em média, um em cada dez idosos espera um ano por vaga e 5 % aguarda mais de três anos.
Um inquérito feito a 690 familiares de idosos a viver em lares, cujos resultados são publicados na edição de Abril da revista da Deco Teste Saúde, revela que são muitas as dificuldades para conseguir vaga nas instituições, a começar pelo preço: cerca de dois terços tem um rendimento mensal inferior ao custo da residência, que ronda os 770 euros em média.
A oferta escassa é outro entrave. Segundo a Deco, que cita dados da Confederação Nacional da Instituições de Solidariedade – representante de quase 2700 instituições -, actualmente há cerca de dez mil pessoas à espera de vaga num lar de idosos. A oferta, que deverá aumentar nos próximos anos graças aos investimentos co-financiados pelo Estado e por fundos comunitários, ainda não chega para a procura.
Para contornar esses obstáculos, muitos recorrem a “cunhas”: 56% dos inquiridos admitiram ter contactado “as pessoas certas” para conseguir vaga. Alguns mentiram sobre o estado de saúde do idoso, dizendo que era mais grave do que na realidade, outros ofereceram mesmo dinheiro aos funcionários das instituições. 30% apenas reclamaram junto do lar.
Quanto aos familiares que optaram por esperar, 8% pediram mesmo a demissão ou uma licença no trabalho. Quase 40% admitiram ter de fazer sacrifícios para tomar conta do idoso. Para cerca de um terço dos participantes no inquérito, a solução foi contratar uma pessoa ou um serviço privado, com todos os custos associados. Apenas 14% das pessoas conseguiram ajuda de serviços públicos ao domicílio.
O estudo da Deco revela ainda que um em cada dez inquiridos deixou os seus familiares idosos internados num hospital mais tempo do que seria necessário, até conseguirem vaga num lar. A associação de defesa do consumidor recomenda, por isso, ao Governo que alargue a Rede de Cuidados Continuados, com equipas de apoio domiciliário.
Outras queixas dos inquiridos são, por exemplo, a falta de transparência nas condições de acesso aos lares, sobretudo nos públicos e público-privados. Cerca de 30% referiu que não havia regras específicas para a entrada no lar, nem sequer lista de espera. Em apenas 36% dos casos os idosos foram chamados por ordem de inscrição –os restantes foram selecionados tendo em conta o seu estado de saúde.
Uma vez em lares, os idosos queixam-se do facto de não poderem fazer exercício físico (47%), da falta de actividades de lazer (44%), da ausência de apoio psicológico (42%) e da falta de profissionais em número suficiente (37%). Cerca de um terço diz não ter cuidados médicos.
Quatro em cada dez inquiridos disseram ter tido algum problema relevante no lar. O mais frequente é o desaparecimento de bens pessoais (25%) - na maioria dos casos, os objectos não voltaram a aparecer -, seguido dos maus-tratos verbais (18%) e físicos (6%) por parte dos funcionários.
Este inquérito foi respondido por 640 pessoas, entre os 50 e os 65 anos, sendo que sete em cada dez inquiridos são filhos dos idosos.