27.3.13

Troika queixa-se do preço da luz, que subiu por sua culpa

Por Ana Suspiro, in iOnline

O aumento do IVA e a taxa especial sobre o consumo estavam no Memorando de ajuda a Portugal. Mas foi o governo que optou por aplicar a taxa máxima de IVA


Foi uma medida defendida no Memorando original de resgate a Portugal que mais contribuiu para o aumento do preço da energia - no entanto, o chefe da missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Portugal lamentou que os preços não estivessem a descer.

Em entrevista à Lusa, Abebe Selassie defendeu que “o principal objectivo para os preços da electricidade, das telecomunicações e de outros sectores não transaccionáveis é estarem em linha ou começarem a cair à medida que a concorrência aumenta ou a procura diminui. Até agora não o estamos a ver e isso é muito decepcionante. Se não responderem às condições económicas penso que definitivamente teremos de olhar para o que passa a revisitar as reformas”.

Os dados do Eurostat, órgão estatístico europeu, confirmam o diagnóstico da evolução dos preços. Entre o primeiro semestre de 2011 e igual período de 2012, o preço final da electricidade para consumidores domésticos aumentou 20% em Portugal. Foi a segunda maior subida na União Europeia, apenas ultrapassada pelo agravamento da factura em Chipre.

Porém, os números mostram também o outro lado desta realidade. Quando olhamos para a evolução dos preços antes de impostos, o agravamento do custo da electricidade para as famílias nacionais está entre os mais baixos da Europa, inferior a 10%, segundo dados do Eurostat que comparam os primeiros semestres de 2011 e 2011. A explicação reside no agravamento extraordinário dos impostos sobre a energia que Portugal aplicou em Outubro de 2011.

O aumento do IVA sobre a electricidade e o gás natural, que pagava a taxa mínima de 6%, foi uma das exigências da troika para o sector da energia. O Memorando impôs ainda a introdução em Portugal de um imposto especial sobre o consumo de gás e electricidade, uma disposição europeia que não era cumprida a nível nacional, e que apanhou também as empresas, embora com impacto menor.

Pelo menos no que toca às famílias - as empresas reembolsam o IVA -, a troika tem responsabilidades no agravamento da factura energética. Mas não será a única culpada. Para muitos, incluindo o PS, que negociou o Memorando, o aumento do IVA não obrigava a aplicar a taxa máxima. Na verdade, o PS defendia a passagem para a taxa intermédia do IVA de 13%. Porém, essa não foi a opção do governo, que em Outubro de 2011 já precisava de ir além da troika para assegurar o défice negociado para aquele ano. A subida do IVA levou a um agravamento da factura final ao consumidor de 17% a 18%, segundo Luís Pisco, da DECO, citado pela agência Lusa.

O efeito privatização da EDP O jurista aponta outra razão para a penalização dos preços, que, ainda que indirectamente, também resulta das imposições da troika: a privatização total da EDP, que Portugal aceitou realizar até ao final de 2011. A operação levou à necessidade de “manter a pílula dourada para os compradores”, o que implicou “não perder um conjunto de regalias em termos de subsidiação de energia, o que também veio a impedir uma redução dos custos de interesse geral”. Luís Pisco está a referir-se à redução das rendas excessivas da electricidade, outra exigência da troika, cujos resultados ficaram aquém do pretendido, sobretudo a redução dos encargos com os sobrecustos pagos à EDP.

O governo privilegiou o sucesso da privatização e o encaixe em prejuízo do combate às rendas excessivas. Sem esse efeito, não há margem para descer os preços, sobretudo quando o défice tarifário ainda vai crescer pelo menos até 2015.