21.3.13

O salto para o sonho

por Joana Carvalho Fernandes, em França, in RR

O retrato é feito pelo INE: o número de emigrantes portugueses aumentou 85% entre 2010 e 2011. Os dados oficiais mostram ainda que o país perdeu quase 17 mil jovens entre os 20 e os 34 anos. Tatiana Gonçalves, Hugo Macedo e João Gaspar passaram a fazer parte desta estatística, porque andam à procura de um sonho.

Tatiana Gonçalves saiu de Lisboa com uma licenciatura em jornalismo, que pagou com um trabalho em "part-time", e depois de ter feito vários estágios não remunerados. Foi para França, mas não porque o Governo mandou os portugueses emigrar. Foi a pressa do sonho que lhe fez as malas.

A oportunidade em Paris, numa televisão na internet para a comunidade portuguesa em França, foi um acaso que lhe virou a vida do avesso. Tatiana vive há quase um ano numa cidade "maravilhosa", trabalha como jornalista – o que chegou a parecer-lhe "nunca vir a ser possível" –, mas também passa cada dia a fazer "contas de coração".

"Não se pode confundir Paris de férias e Paris a trabalhar. Esta é uma cidade que consome imenso, é uma cidade com muita gente, muito trânsito. As pessoas são muito impessoais. Ando há meses a tentar pôr tudo isso numa balança para perceber se sou mais feliz aqui ou se sou mais feliz em Lisboa", diz.

Por agora, conseguir trabalhar em jornalismo e ter mais algum dinheiro do que o que tinha em Portugal pesam o suficiente para mantê-la em Paris. Se em Portugal o cenário mudar, ela muda-se.

"Um completo desinvestimento"
Hugo Macedo nasceu em Guimarães e estudou em Braga. Vive desde Abril do ano passado na Cidade Internacional Universitária de Paris, na zona sul da cidade, porque, depois de ter terminado um doutoramento em informática, não tinha emprego nem perspectivas de oportunidades em Portugal. Em França, trabalha num projecto de investigação sobre vírus informáticos.

"Vim também pela minha vontade de conhecer mais, de ser independente, de aprender mais, coisas para as quais em Portugal, neste momento, também não havia grandes oportunidades. Há toda uma conjuntura e um conjunto de pessoas que te dizem que se não estás bem podes ir embora."

Hugo considera que deixou um país "onde não há um rumo" nem "vontade de investir", onde só se fecham portas. "Portugal, neste momento, está submerso numa história de enterro. Há uma história de fecho da porta, de completo desinvestimento. Chegar a França e reparar que há uma luta por um investimento nas pessoas foi o maior contraste", diz, lembrando que França "não tem o Fundo Monetário Internacional e a 'troika' às costas".

Se pensa em regressar? Sim, pensa, sim, tem vontade. Mas com uma condição. "Se houver um projecto que desafie, eu volto. Mas se vamos voltar a Portugal para vivermos de cabeça em baixo, não vale a pena."

A dimensão do sonho
João Gaspar é de Almada. Chegou a Paris em Junho, com uma licenciatura em sociologia, e depois de o último de vários trabalhos precários ter chegado ao fim. Via "alguns amigos completamente estagnados" e pensou que não queria "ficar assim". Resolveu sair de Portugal.

Hoje trabalha em Paris como tradutor. Em alguns meses, França deu-lhe mais do que o que Portugal lhe deu nos últimos anos: "Tenho um trabalho qualificado, consigo pagar uma casa, consigo sobreviver", conta. Ainda assim, sublinha que Paris tem que lhe dar "um pouco mais" para convencê-lo a ficar muito mais tempo.

Este "pouco mais" que exige para ficar em França não o pede a Portugal. Tal como para Tatiana Gonçalves e para Hugo Macedo, o que "não é suficiente" em França "já era o suficiente" onde nasceram.

"Se pudesse voltava. Sem dúvida", diz João. Porque Paris foi, para os três, um salto para o sonho, mas não é o sonho inteiro.