Lígia Silveira, in Agência Ecclesia
O número de pessoas que vive no mundo no limiar da pobreza recuou entre 1981 e 2005, com fortes disparidades regionais, continuando a África Subsariana a sofrer mais, revela um estudo do Banco Mundial. O número de pobres baixou de 1,9 para 1,4 mil milhões num quarto de século, devendo, no entanto, manter-se superior a mil milhões em 2015.
Resultados que não surpreendem o Presidente da Rede Europeia Anti Pobreza / Portugal, o Pe. Agostinho Jardim Moreira, que relembra o compromisso da política mundial de “olhar África como destino de ajudas para combater a pobreza”.
“A vida em alguns povos asiáticos e na América latina tem vindo a melhorar, o que de forma geral, mostra este índice positivo, ainda que tenhamos uma larga margem de pessoas pobres nestes continentes”.
Segundo o estudo, a África Subsariana é a única grande região onde a pobreza se mantém estável em termos percentuais (50 por cento em 2005, contra 51 por cento em 1981) embora a mesma tenha aumentado em números absolutos (384 milhões de pessoas em 2005, contrariamente a 202 milhões em 1981).
O Pe. Agostinho explica que a fome, milhões de órfãos vítimas de sida, o subdesenvolvimento educacional e de saúde são factores que contribuem para perpetuar o ciclo de pobreza. “As pessoas morrem com falta de coisas banais no Ocidente”.
Na Ásia, a região com mais pobres é o Sul, registando 596 milhões de pessoas em 2005, contra 548 milhões em 1981. Na América Latina e nas Caraíbas, a pobreza recuou em percentagem (oito por cento em 2005, face a 12 por cento em 1981) mas manteve-se em termos absolutos (45 milhões em ambos os anos). Já na Europa de Leste e na Ásia Central, a carestia aumentou (cinco por cento ou 24 milhões em 2005, contra dois por cento ou sete milhões em 1981).
Em contrapartida, na África do Norte e no Médio-Oriente a pobreza diminuiu (cinco por cento ou 14 milhões em 2005, contrariamente a nove por cento ou 15 milhões em 1981).
“Dão-se migalhas aos pobres para que não se sintam tão diabos, mas a verdade é que não dão o que devem, nem fazem a justiça merecida”, denuncia o Pe. Agostinho Moreira.
A política mundial quer do Fundo Monetário Internacional quer também do Banco Mundial “estão viradas para olhar África e os países do terceiro mundo, como destinatárias de ajudas”. Mas as ajudas que não foram cumpridas, aponta o. Pe. Agostinho Jardim Moreira, relembrando que os países ricos não perdoaram a dívida aos países pobres e não cumpriram a promessa de contribuir com uma percentagem do Produto Interno Bruto para reduzir a pobreza.
Estatísticas publicitárias
O Presidente da REAPN afirma que estas estatísticas “são mais publicidade que outra coisa”. O Pe. Agostinho reconhece a veracidade “pois regista-se um melhoramento, mas o compromisso que os países ricos assumiram, não está a ser cumprido”.
“Pode ter melhorado um ou dois por cento, mas faltam ainda os 20% de pessoas que continuam a sofrer com a pobreza” e acrescenta que se “houvesse uma justiça equitativa o índice de pobreza teria reduzido mais”.
O Presidente da REAPN afirma que a falta de vontade política impede a erradicação da pobreza. “Investe-se mais em armamento do que na defesa das pessoas. Pensa-se mais em matar do que em dar a vida”, sublinha, “seja em que área for”.
O egoísmo das nações que conduz à hegemonia “quer manter os ideais de paternalismo e dependência”. O Pe. Agostinho aponta que os vários países produtores de alimentos “não podem estar na mão de alguns que controlam as políticas mundiais”. Os países pobres “têm sido sugados pelos países ricos”. Petróleo, diamantes, madeiras, agricultura e mão-de-obra “falam mais alto que a justiça mundial”. Um jogo “político e estratégico” que perpetua as dívidas dos países pobres que não quebram o ciclo de pobreza. “Um drama que só muda quando mudar o coração e o espírito de serviço com que se devem manter ao serviço dos outros”.
O Presidente da REAPN alerta para os perigos de “novos nacionalismos a que as políticas proteccionistas podem conduzir”. O Pe. Agostinho aponta que a identidade e a cultura são “preservadas na medida em que preservamos a dos outros”.
Ao falarmos de globalização “apontamos o bem que faz, mas na prática torna-se foco que exacerbados nacionalismos e gera desequilíbrios”. O Presidente da REAPN lembra que se “houvesse um conceito de justiça do ser humano eu não iria permitir que pessoas fossem alvo de escravatura para que alguém no Ocidente possa comparar algo mais barato”.
“A responsabilidade recai sobre os políticos que se tornam «joguetes» das políticas economicistas e globais. A democracia deixou de ser expressão do povo para passar a ser a expressão de domínio de alguns”.