Alexandre Panda, in JN
Segurança Social e outras autoridades têm levantamento em curso. Associação alerta para riscos acrescidos dos utentes.
Há 35 mil idosos a viver em 3500 lares ilegais em Portugal, onde correm riscos acrescidos de contaminação, segundo um estudo de uma associação do setor. Nestas instalações, clandestinas por natureza e procuradas pelos preços baixos que praticam, não há planos de contingência, nem pessoal com formação ou equipamentos adequados. A Segurança Social reconhece que o problema é preocupante e tem em curso uma operação, com outras instituições, para identificar estes lares.
O primeiro caso de Covid-19 num lar ilegal, que fez soar os alarmes das autoridades para esta bomba-relógio escondida, surgiu no início do mês, em Vila Nova da Barquinha. Numa casa de acolhimento informal, as autoridades encontraram nove idosos. Um deles testou positivo quando teve de ser assistido num hospital. Sem alvará, sem acordos com a Segurança Social e sem fiscalização periódica, são estruturas que raramente possuem equipamentos, pessoal e infraestruturas que permitam minimizar os riscos de contágio para uma população muito vulnerável.
"As casas clandestinas são normalmente um risco ainda pior, porque são estruturas muito incipientes, com pouco conhecimento técnico, sem formação e com poucos meios pessoal e equipamento. É um perigo muito maior do que os lares em situação legal", explica João Ferreira de Almeida, presidente da Associação de Apoio Domiciliário, de Lares e Casas de Repouso de Idosos (ALI). É da responsabilidade desta associação a única estimativa existente sobre a dimensão do fenómeno em Portugal. Os números são assustadores, apontando para a existência de 3500 lares ilegais, albergando 35 mil idosos.
A Segurança Social, em resposta ao JN, refere apenas que "sendo por definição uma atividade ilegal, não existe conhecimento do total de equipamentos ilegais a funcionar". "A Segurança Social tem conhecimento dos casos em que intervém/fiscaliza. Não temos qualquer estudo que nos permita avançar com estimativas", acrescenta.
PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA
Para a ALI, as casas clandestinas podem rapidamente "tornar-se um grave problema de saúde pública". "Ninguém sabe o que pode acontecer. É um risco muito grande, não só para quem lá vive ou trabalha, mas também pela possibilidade de disseminação. Sem controlo do vírus. Enquanto os nossos sócios conhecem as medidas cautelares e os procedimentos mais corretos, não sei que informação chega a essas casas", explica o dirigente.
Questionado pelo JN sobre se haverá lares ilegais a esconder das autoridades de saúde eventuais sintomas dos seus utentes, para não perder o negócio e evitarem consequências judiciais, Ferreira de Almeida diz que isso seria "uma tremenda irresponsabilidade".
A Segurança Social, à qual compete a fiscalização dos lares, garante que está a trabalhar "com as demais autoridades, como câmaras municipais, Proteção Civil, Emergência, entre outras, de forma a salvaguardar a proteção dos idosos, dos trabalhadores e restante comunidade". Entre as suas tarefas prioritárias, neste setor, está a identificação de todos os equipamentos, desde logo aqueles de que tem conhecimento por denúncias. "Adicionalmente, será solicitado aos parceiros da Comissão Nacional de Proteção Civil, designadamente autarquias, a identificação destas estruturas para comunicação aos parceiros da Saúde e forças de segurança", acrescenta a Segurança Social.
PREÇO BAIXO É O PRINCIPAL ATRATIVO
Idosos e familiares procuram casas clandestinas porque não encontram vagas em equipamentos legais pertencentes a redes de solidariedade social e com preços inferiores aos lares privados. Nas casas clandestinas, as mensalidades oscilam entre 500 e 600 euros, enquanto no privado ultrapassam os 1200. O valor é justificado pelos requisitos que os lares têm de observar para obter licenças de funcionamento. "Têm que ser necessariamente altas para que possamos cumprir todos os requisitos obrigatórios. As casas clandestinas funcionam com metade do pessoal, sem enfermagem, nem camas articuladas, nem colchões adequados" afirma Ferreira de Almeida, da ALI.