Henrique Raposo, in Expresso
O encerramento de creches e escolas foi o grande erro da quarentena. Foi uma reacção baseada num pânico sem base factual e desviou o foco do verdadeiro problema: os lares de idosos. As crianças e jovens estão fora de perigo e alguns estudos até sugerem que nem sequer são grandes transmissores do vírus. O perigo não está na relação entre crianças, está entre crianças e avós ou entre crianças e educadoras/professoras/funcionárias mais velhas e/ou com graves problemas médicos.
A par desta posição de princípio e que assume uma dose (ultracontrolada) de risco (não há registo de crianças mortas), gostava de salientar outro tema: creches e escolas fechadas determinam o pesadelo económico de milhares de famílias, sobretudo as mais pobres. Há fome em Portugal neste momento. Os mais pobres estão a sofrer a sério, um sofrimento que coloca a troika ao nível de um retiro espiritual. Foi tudo demasiado brusco. Não passaram a trabalhar menos. Deixaram de trabalhar. Como dizia há dias o João Vieira Pereira, aposto que os autores das petições que querem proibir a abertura de escolas e creches são pessoas com certos privilégios, podem trabalhar a partir de casa, têm casas boas com computadores, até podem prescindir de trabalhar para estar com os filhos.
Vejam se entendem, por favor: os mais pobres não se podem dar ao luxo do #ficaremcasa; sem os filhos nas creches e escolas, não conseguem viver. Os pobres já não vivem no dia a dia normal, sobrevivem. O #ficaremcasa nem sequer os deixa sobreviver. E isto é ainda mais evidente nas mulheres. As casadas são as grandes sacrificadas no trabalho doméstico (que aumenta) e no trabalho profissional (que fica para trás). E as grandes vítimas da quarentena são as mães solteiras ou divorciadas e os seus filhos. Abram os olhos. Abram as creches e escolas.