Por Romana Borja-Santos, in Público on-line
Tal como já vinha a ser anunciado, o Ministério da Saúde vai promover a mobilidade da classe médica, com o objectivo de suprir as carências que existem em alguns centros de saúde e hospitais, sobretudo no interior do país e em zonas como o Algarve.
O ministério de Paulo Macedo vai, primeiro, tentar encontrar clínicos que se voluntariem para mudar de unidade de saúde, avança o Correio da Manhã na sua edição desta quinta-feira. Esgotada esta possibilidade, a tutela irá abrir concurso para os médicos que terminem o internato da especialidade mas apenas para as zonas onde existem falta de recursos. Só em último caso serão contratados clínicos à hora, através de empresas de prestação de serviços.
Na quinta-feira, durante uma audição da comissão parlamentar de Saúde, Paulo Macedo já tinha dado como exemplo o “excesso em Lisboa de oftalmologistas, psiquiatras e pneumologistas”, assim como de anestesistas noutras regiões. E referiu a abertura de dois concursos: um de imediato com 800 vagas e outro em Setembro com 600 lugares. Hospitais de Lisboa, Porto e Coimbra ficam de fora.
Das 800 vagas, cerca de 200 destinam-se à especialidade de medicina geral e familiar – uma das mais desfalcadas em todo o país. Desta última, o maior número de vagas foi aberto para a zona do Algarve (74), seguindo-se a Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo (37) e ARS do Norte (34). Foram ainda abertas 19 vagas para a especialidade de saúde pública. Das outras especialidades, os clínicos mais procurados são os de medicina interna (58), ginecologia e obstetrícia (50) e anestesiologia (48).
Faltam sobretudo médicos de família
De acordo com Inventário de Pessoal do Sector da Saúde divulgado em meados de Junho pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), o sector público da saúde conta com 25.451 médicos, dos quais 6728 ainda no internato. O documento permitiu também perceber que em Portugal há menos de um médico de família (0,7) por cada mil habitantes. Mas se for considerado o total de médicos há 2,4 médicos por mil habitantes, em ambos os casos números muito inferiores à média da OCDE (3,3).
O inventário dos profissionais de saúde a trabalhar no sector público era uma das exigências da denominada troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu).
Estes números contradizem algumas das declarações de Paulo Macedo, nomeadamente em Novembro de 2011, onde admitiu a falta de médicos de família mas onde disse existirem 1000 especialistas de outras áreas a mais. Diferenças que podem, contudo, ser justificadas pelas assimetrias nacionais. Aliás, nessa mesma altura, a tutela anunciou que os internos que fiquem em unidades mais pequenas ou no interior com falta de recursos poderão vir a receber mais de 750 euros desde que fiquem a trabalhar lá após a formação.
Assimetrias nacionais
Também em Outubro de 2011 um estudo da ACSS intitulado “Actuais e Futuras Necessidades Previsionais de Médicos no SNS” dava conta de duas áreas em que as insuficiências são claras e graves: faltam perto de mil médicos de família nos centros de saúde e mais de 600 especialistas em medicina interna nos hospitais públicos. Ao mesmo tempo, haverá especialidades com um número de clínicos acima do "desejável", como a cardiologia, a anestesiologia e a pneumologia, dizia o documento.
Com base nas estatísticas desse estudo e nos números considerados desejáveis, o trabalho da ACSS aponta para uma multiplicidade de discrepâncias e desigualdades regionais. Alguns exemplos: o Centro Hospitalar de Lisboa Norte tem 72 anestesiologistas, quando o "desejável" seriam apenas 32; ao mesmo tempo, o Hospital de Faro dispõe de 15, quando o ideal seriam 29.
Na oncologia médica, há muitas assimetrias. Em Lisboa as carências são generalizadas. O Centro Hospitalar de Lisboa Norte tem um oncologista, quando o ideal seriam nove; o de Lisboa Ocidental tem dois e devia ter nove; Gaia tem um e deveria ter seis, Viseu tem só um (e em formação). Pelo contrário, o Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga tem seis oncologistas, quando chegariam quatro e há pequenos hospitais que têm um oncologista, quando não precisariam de nenhum.