19.10.12

CES defende que consolidação pelo lado da despesa é uma “falsa alternativa”

Por Ana Rita Faria, in Público on-line

Observatório sobre Crises e Alternativas do CES critica os pressupostos do Orçamento do Estado (OE) de 2013, mas defende que cortar na despesa em vez de aumentar impostos também tem um impacto recessivo. Só há uma excepção: os juros da dívida pública.

O Observatório sobre Crises e Alternativas do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra divulgou hoje o terceiro número do seu Barómetro das Crises, onde analisa a proposta do OE para 2013.

Os economistas do CES começam por pôr em causa as previsões macroeconómicas do Executivo, que está a antecipar uma contracção de 1% no próximo ano. “O Orçamento é um exercício que não tem em consideração a experiência recente, nacional e internacional”, defende o CES, salientando que o esforço de redução do défice em causa, feito em contexto recessivo, “tem necessariamente como consequência o aprofundamento da recessão e o fracasso da própria execução orçamental”.

O observatório recorda que o “choque fiscal” anunciado no OE tem vindo a suscitar “vigorosas reacções de rejeição” e várias opiniões críticas que enfatizam a necessidade de reduzir o défice com cortes do lado da despesa. Uma alternativa que, diz o CES, não é válida, visto que as despesas com o pessoal e as prestações sociais correspondem a cerca de 70% da despesa total e a 33% do PIB.

Contudo, “qualquer corte na despesa nestas rubricas repercute directamente no rendimento disponível de um grande número de famílias tendo um efeito recessivo igual ao de um aumento de impostos”, escreve o CES. Além disso, o observatório considera que até mesmo o corte na despesa com consumos intermédios (que equivalem a 10% da despesa e 4,4% do PIB) equivalem a reduzir aquisições de bens e serviços a empresas, o que afecta negativamente o rendimento e o emprego.

O mesmo raciocínio é válido para as reduções das transferências para empresas do sector empresarial do Estado, que tem levado estas empresas a compensarem com o aumento das tarifas dos serviços.

Segundo o CES, há algumas despesas no OE susceptíveis de redução sem impacto recessivo, como é o caso das rendas das Parcerias Público-Privadas e outras concessões, e também de consumos intermédios, nomeadamente de bens importados, que não têm impacto recessivo interno.

“À excepção destes casos particulares”, escreve o observatório, “uma redução do défice com cortes do lado da despesa implicaria, além de um efeito recessivo, uma retracção e degradação da provisão pública em domínios cruciais como a saúde, o ensino e os transportes, acompanhada de um aumento dos custos de acesso a estes serviços”.

O CES defende, por isso, que “a consolidação pelo lado da despesa é não só recessiva, como regressiva. É uma falsa alternativa”. Só há uma rubrica da despesa à qual este raciocínio não se aplica: os juros da dívida pública.

Tal como o PÚBLICO noticia hoje, as despesas com juros vão atingir no próximo ano os 4,3% do PIB, o nível mais alto dos últimos 17 anos. O observatório realça que esta despesa é vista como a única que não pode ser objecto de cortes, mas defende que esse pressuposto é infundado. E defende que o Estado deveria avançar para uma negociação com os credores oficiais. “Não há saída para a situação de espiral recessiva para que a austeridade está a precipitar Portugal e grande parte da zona euro sem uma redução de um fardo da dívida que se tornou sufocante”, conclui.