20.3.08

Galegos acusam portugueses de "dumping social" na construção

Luisa Pinto, in Jornal Público

Trabalhadores portugueses recebem quase metade do salário dos espanhóis. Confederação galega promete acções de protesto na rua


Não tivesse a crise no sector da construção chegado à vizinha Espanha, e porventura as queixas dos trabalhadores galegos não se fariam ouvir do lado de cá da fronteira. Mas a crise já chegou, e todos esperam que ainda venha a fazer muitos estragos, por isso a contagem de espingardas já começou: ontem, o secretário nacional da Confederação Intersindical Galega para o sector da construção, Xoan Xosé Melón, ameaçou com "greves" e "manifestações públicas de protesto", caso governos portugueses e espanhóis não se ocupem a combater aquilo que chamam de "dumping laboral".

"Não temos nada contra os portugueses, só queremos que seja cumprida a legislação. A verdade é que os portugueses estão a fazer um autêntico dumping laboral, aceitando trabalhar em condições muito precárias, o que configura uma situação de concorrência desleal. E os grandes prejudicados são, naturalmente, os trabalhadores galegos, que se vêem preteridos", disse à agência Lusa Xoan Melón.

Esta preocupação não é exclusiva dos sindicatos galegos; os sindicatos portugueses já a denunciam "há anos", lembrou ao PÚBLICO o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Construção do Norte, Albano Ribeiro. "Pena é que só pense nisso quando os postos de trabalho começam a faltar. Até agora não se incomodaram por andarem em obras, lado a lado, com trabalhadores a ganharem quase metade do salário deles", argumentou Albano Ribeiro, frisando que "nós já andamos a denunciar essa situação há anos", acrescentou, ao PÚBLICO, alegando que os espanhóis ganham cerca de 12 euros por hora, enquanto que os portugueses auferem "entre sete a 7,5 euros". Os galegos fazem outras contas, mas a disparidade mantém-se: um trabalhador espanhol recebe nove euros, o português aufere "cinco ou seis" - mas não tem salário fixo, horário de trabalho, subsídios ou indemnizações.

E o que leva os trabalhadores portugueses a sujeitarem-se a essa discriminação: "Garantir um posto de trabalho" e um melhor salário, já que, contabiliza Albano Ribeiro, "mesmo a ganharem mal face aos espanhóis, sempre ganham melhor do que aqui. Em Portuggal, o salário de um trabalhador qualificado é de 518 euros. E o patronato, que espera para este ano crescimentos na ordem dos 2,5 por cento, não admitiu fazer aumentos salariais dessa grandeza", criticou o sindicalista.
Xoan Melón é o primeiro a admitir que foi a chegada da crise que os "obrigou" a esta tomada de posição: "Até aqui, havia trabalho para todos. Agora, a luta por um emprego vai ser cada vez mais feroz. Os patrões, naturalmente, o que querem é pagar salários o mais baixos possível. Se um português aceita trabalhar por menos do que está estipulado na lei trabalha mais de oito horas por dia, é mais um posto de trabalho que o galego vê fugir", sublinhou. Com Lusa

Actualmente serão cerca de 100 mil os trabalhadores da construção portugueses que estão a trabalhar em Espanha. Cerca de 80 a 90 mil, que lá estarão instalados durante a semana, ou a quinzena, e outros dez mil que atravessam a fronteira todos os dias. A estimativa é do Sindicato dos Trabalhadores da Construção do Norte. A Confederação Galega diz que só na Galiza há 14.482 portugueses inscritos na segurança social espanhola.