9.3.08

Novo partido quer contrato social de longa duração

Leonete Botelho e Paulo Magalhães, in Jornal Público

Não rejeita a hipótese de uma coligação com o PS, se isso for útil ao país. Um novo partido, o Movimento Esperança Portugal, está a nascer


Rui Marques, o primeiro e mais conhecido dos 60 fundadores do MEP, defende o regresso ao cerne da política, à definição da sociedade que queremos.

Para que serve um novo partido em Portugal?

A democracia não tem numerus clausus, são os portugueses que decidem. A diversidade é a força da democracia. Este projecto não nasce contra ninguém, nem com a ideia de que tem uma varinha mágica para resolver os problemas. Não temos um discurso de que está tudo mal, de que os políticos são corruptos, de que Portugal vai para pior. Pelo contrário. A nossa mensagem é que melhor é possível.

Parece um pouco abstracto...

Não é. O que faz, desde sempre, um homem ou mulher levantar-se e lutar por um futuro melhor é a sua esperança, a sua convicção de que é possível melhor. A força da esperança não é algo vago. Martin Luther King não foi um filósofo ou um teórico: foi um homem que organizou a luta pelos direitos civis dos negros nos EUA e foi sempre um protagonista da esperança. Era o "eu tenho um sonho" somado à capacidade de organizar, de contestar, de mobilizar, de ter intervenção política.

Fê-lo por oposição a algo que estava, mas o senhor diz que não faz oposição. Então faz o quê, concertação estratégica?

A nossa oposição será sempre a factos, a algo que consideramos estar mal, e com alternativas. Este modelo maniqueísta, de bons contra maus, de permanente ataque pessoal é uma visão que não corresponde à nossa experiência de vida. A política tem que mudar as suas regras. Desde logo nessa afirmação de que alguém é dono da verdade e é pouco dado à negociação, à concertação e criação de pontes.

Como é que se faz?

É fundamental a criação de um contrato social de longa duração, em que seja possível comprometer todos os actores em determinado trajecto. O diálogo é o traço dos fortes, só os fortes dialogam e não o contrário. Os fracos são autoritários. A única forma de uma comunidade avançar é, de forma participada por todos, cada um dos actores se apropriar das conquistas alcançadas e ir construindo em consenso as soluções para o futuro.

O Presidente da República usa precisamente esta filosofia, de sermos todos responsáveis pelo presente e pelo futuro... Falou com alguém da Presidência sobre o novo partido?

Estamos em absoluto acordo com o senhor Presidente da República. Mas não falei, não tinha de o fazer, até seria inadequado e incorrecto fazê-lo. Estamos num tempo inicial, de criação. Quando for um partido institucional, com certeza pedirá uma audiência ao chefe de Estado, ao Governo e aos restantes partidos para apresentar cumprimentos.

Quando é que se lembrou de fundar um partido?

É uma ideia que tem vindo a ser amadurecida desde o Verão. Olhando a realidade. Começando a pensar qual seria a minha próxima missão, depois do final do mandato. O empenhamento político foi surgindo para mim como responsabilidade de consciência. A política é uma área muito desertificada, com poucas pessoas disponíveis para servir num contexto difícil. Foi-se tornando claro para mim que eu tinha a obrigação de servir a causa pública e o bem comum na política.

Quando saiu do Alto Comissariado para a Imigração já tinha em mente a formação deste partido. Informou o Governo sobre as suas intenções?

Não tinha que informar. A minha relação com os membros do Governo, principalmente com o ministro da Presidência, com quem me articulava, era uma relação institucional normal. Esta matéria era distinta dessa relação.

Explicou o que ia fazer?

Expliquei o que era fundamental. Pedi a antecipação do fim do mandato porque estava em causa a definição de políticas de aplicação de fundos comunitários na imigração até 2013 e não devia ser eu a fazê-lo, em fim de mandato. Também não fazia sentido haver dois altos-comissários nas comemorações do ano do Diálogo Intercultural. A escolha de Rosário Farmhouse para o cargo é uma excelente escolha.

A este calendário não terá sido alheio o facto de estarmos a cerca de ano e meio de eleições. Já disse que pretende disputar as europeias...

Não tem nada a ver se está mais perto ou mais longe das eleições, se estivéssemos a quatro anos de eleições, a decisão era a mesma. As eleições europeias são as primeiras, são o primeiro teste ao partido. Mas são também um excelente espaço de afirmação da identidade do MEP. O projecto europeu tem tudo o que o MEP quer ser. Na sua origem é um projecto de solidariedade, de uma mesa com lugar para todos, de capacidade de criar pontes entre inimigos. França e Alemanha tinham acabado de sair de uma guerra! E foram capazes de apostar numa política da esperança.

Quem é que vai financiar as campanhas eleitorais? O Estado só financia os partidos com representação parlamentar...

Os portugueses. Eu concordo em absoluto com o sistema de financiamento público dos partidos políticos. E por isso vamos ter de apelar às pessoas que acreditam neste projecto, para que contribuam, não só com a sua assinatura para a formalização do partido junto do Tribunal Constitucional, mas também com apoio financeiro. Os portugueses são generosos. Ao longo da vida, sempre vi os portugueses contribuir, seja no barco para Timor, na Cais, seja em tudo o que acreditem, sempre os vi colaborar.

Mas não tem garantias de apoio de nenhum sector em particular?

Nenhuma garantia. Este projecto não nasce em função de garantias, nasce apenas de uma convicção: a afirmação de uma política da esperança. Por maiores que sejam as dificuldades, nós, portugueses, somos capazes de as enfrentar e resolver, se fizermos por isso. Acreditamos que melhor é possível e que é possível uma mesa com lugar para todos. E que o futuro está nas mãos de cada um de nós.

Diz que não é um filósofo, que tudo o que tem feito na vida tem sido muito pragmático, porque para lutar por causas tem de se ser muito pragmático. Compara este momento com 1992, quando decidiu lançar-se num barco em direcção a um Timor ocupado e oprimido para deitar flores nos túmulos dos mortos às mãos da Indonésia. "Diziam-me: "Timor independente é impossível". Eu tive a sorte de experimentar e ver impossíveis a acontecer".

As flores acabaram no mar, mas foi feita a ponte. Três Governos em seis anos não o impediram de desenvolver uma política de imigração que hoje é considerada a segunda melhor do mundo. Agora, diz que devolver a esperança aos portugueses é a sua próxima missão. L.B.