22.3.08

A pobreza e a passividade

Gilberto Teixeira, in Jornal da Madeira

Vivemos numa tremenda desilusão que se arrasta de há meia dúzia de anos a esta parte. Isto não é de agora. Há muito sofisma, muito cenário negro, de crise verdadeira, que traz famílias angustiadas, infelizes e psicologicamente abatidas, perante a situação real e imutável, sem esperança, sem alegria de viver.

De repente, um cineasta amador também subsidiado do Governo Regional, diz que a Madeira “não tem massa critica” que isto é um caos de cimentização e de desenvolvimento, que há controlo laranja absoluto em tudo o que mexe, desde as árvores da montanha, passando pelas lapas agarradas ás pedras do mar da ilha, e acabando nas pessoas que dão corpo, alma e vida ás inúmeras associações civis que existem.

A pobreza fica para segundo plano, particularmente a de espírito. Num país em que os maiores jornais ditos de referência não vendem mais que 50 mil exemplares/dia, num país de dez milhões, em consonância com os desportivos que vendem o mesmo, por falta de hábitos de leitura, querem estes transformistas da comunicação, dar lições sobre as causas da passividade das pessoas.

Se não há dinheiro para comprar o pão ajustado ao consumo do agregado familiar, porque toda a gente vive afogada pelos impostos e taxas, com a responsabilidade de pagar a prestação da casa e do carro, da escola e dos livros para os filhos, da roupa que serve de agasalho, acudir ao pagamento da água, da luz, do gás, do telefone, do condomínio, como é que esta gente pode comprar jornais e ganhar hábitos de leitura?

Se a esmagadora maioria vive com salários que nem chegam aos mil euros mensais, e tem responsabilidades que não pode falhar, que roçam esse valor ou o ultrapassam, como pretender que haja promoção dos indivíduos, que tenham autonomia, que procurem participar mais activamente nas actividades cívicas, se determinados jornais são causadores de distorções e utilizam o autoritarismo e o despotismo, despedindo jornalistas que lhes são incómodos, porque isentos e briosos no exercício da sua profissão?

O poder de certos empresários da comunicação social está no papel impresso que vendem e, em mais nada. As pessoas estão alertadas para o que lêem, e não se deixam levar por certos indivíduos cujo comportamento na escrita, não corresponde ao comportamento na sociedade. Há liberdade de opinião e de critica, mas o consumidor não é parvo. O tempo do analfabetismo já passou.

Em todo o lado existem dependências de vários géneros. A Madeira não escapa a isso. Mas é descabido querer dizer que não há organização, planeamento, trabalho e liberdade de criação, com tanta gente a fazer pela vida, que não está fácil, com pessoas a serem postas á prova quotidianamente, vencendo desafios e escondendo humilhações. Já viram que aumentam os preços de todos os bens essenciais, e que, há anos que ninguém recebe um cêntimo de actualização salarial sobretudo da Administração Publica?

Há “massa critica” na Madeira. O que não há é medo. Ao contrário do que propalam estes enganosos comunicadores sociais, que vivem numa franja de luxo da sociedade, sem necessidades básicas, nem vontade de trabalhar. Às vezes fico com a sensação que alguns deles têm tiques de caciquismo. São coléricos (viu-se um deles de olhos esbugalhados na televisão) quando instados ou contrariados. Há quem tenha deles uma imagem de assanhados ditadores. Insuportáveis e convencidos. Desequilibrados emocionalmente e por isso mesmo detestáveis.

Mostram-se activos mas são especialmente dependentes. Autoritários e com necessidade de afirmação. A demagogia e a injustiça enchem-lhes a boca, mas quando foram chamados a prestar provas, a dar contributos, a esgrimir argumentos e a lançar as iniciativas que dizem não existir nos outros, falharam rotundamente e fugiram com o rabo enrolado entre as pernas.

Eles são um fiasco em tudo o que se metem, e só sabem dizer mal dos outros, da sua própria terra, de onde fugiram há anos, seriamente envergonhados. Foram em busca de aventura e tiveram ousadia, conseguindo lugares de destaque em áreas sensíveis, mas a realidade é que toda a obra feita, foi mediana, não teve impacto na sociedade, nem alegrou particularmente quem investiu uma fortuna, para depois ter de gramar um produto que não se distinguiu dos demais.

A ilusão igualitária de que são autores estes mordomos dos grandes senhores da comunicação social, não existe, é mais um fiasco que retirou direitos a muita gente sem lhes dar nada de alternativas. Não há da parte destes, agora resignados e classificados comentadores políticos de fraca visão, qualquer laivo de verdade naquilo que escrevem ou dizem, quando chamados ás televisões. Eles próprios, têm um ar cinzento e triste, umas reacções acriançadas. Adoram verbalizar vácuamente.
Vivemos numa tremenda desilusão que se arrasta de há meia dúzia de anos a esta parte. Isto não é de agora. Há muito sofisma, muito cenário negro, de crise verdadeira, que traz famílias angustiadas, infelizes e psicologicamente abatidas, perante a situação real e imutável, sem esperança, sem alegria de viver.

A pobreza e a passividade juntaram-se. Em parte devido a estes príncipes das pobres letras, que não excitam ninguém. Por quanto tempo?