8.10.12

Crise trouxe novos pobres ao "velhinho" balneário de Alcântara

Paulo Lourenço, in Jornal de Notícias

Poupar na conta do gás ou da água, ou, simplesmente, já não dispor destes serviços em casa, porque foram cortados por falta de pagamento, ou apenas para ir buscar roupa, são razões que têm levado cada vez mais gente ao "velhinho" balneário público de Alcântara, em Lisboa.

João Pinto, 34 anos, pai de três filhos - e com o quarto a caminho - é o exemplo de um dos novos clientes, embora não para o banho diário. Ele e a mulher trabalhavam na indústria hoteleira, mas viram os seus contratos terminarem e foram atirados para o desemprego.

"Conheço muita gente nova que agora vem e que nunca cá vinha, porque as dificuldades são cada vez maiores. A mim, ajuda-me sobretudo em termos de roupa", conta ao JN.

O mesmo tipo de ajuda leva Nádia Fernandes, uma jovem surda muda que mora na Amadora mas é cliente habitual do balneário, a recorrer ao serviço. "Gosto muito, tratam-me muito bem, e é muito importante para arranjar roupa para os meus meninos", explica, entre gestos e escrita, ao JN esta mãe de três filhos, há muito no desemprego.

Numa freguesia de população muito idosa, a viver com muitas carências, abundam os pedidos de ajuda à Junta de Freguesia. E todos os serviços sociais são aproveitados, muitas vezes por gente que nunca imaginou a eles recorrer.

"Lidamos com novas formas de pobreza. Há casos de empresários em nome individual, cujo negócio faliu. Pessoas que não faziam descontos e agora nem têm direito a subsídio de desemprego", sublinha Isabel Leal de Faria, presidente da Junta de Freguesia de Alcântara.

É neste contexto que vão aparecendo novos utentes, muitos com qualificações e que não se conformam com ser ajudados sem dar nada em troca."São pessoas que quando recorrem à ajuda querem fazer algum tipo de serviço social. Não querem receber ajuda sem dar nada em troca", explica a autarca.

Entre estes casos aparecem aqueles que há meia dúzia de anos nunca pensaram recorrer ao balneário. "Há pessoas a quem a água foi cortada por falta de pagamento, ou mesmo quem ao vir aqui esteja a conseguir uma poupança de água e gás, o que é especialmente importante nos dias que correm", acrescenta Isabel Leal de Faria, que acentua os esforços que a própria Junta de Freguesia desenvolve todos os dias para manter este e outros serviços de apoio à população, quando há cada vez mais gente a pedir ajuda.

Amélia Caramelo, encarregada do espaço, não tem mãos a medir. "Há caras novas, gente mais jovem, que vem, sobretudo, à procura de roupa, muitas vezes de criança e bebé", destaca. E não faltam também casos de pobreza envergonhada.

"Há quem tenha vergonha de recorrer à ajuda. Vêm e dizem que estão a pedir para uma vizinha", observa, na convicção de que "as pessoas querem manter a sua dignidade"

Mas se as dificuldades trouxeram mais clientes, é justo realçar a maior solidariedade da população. "As pessoas oferecem mais roupa, muitas vezes nem esperam pela abertura do balneário, deixam-na em sacos á porta", descreve Amélia Caramelo.