24.5.13

"Descriminalização não resolveu problema da droga. Isso não é possível"

Por Marta F. Reis, in iOnline


Congresso Internacional sobre Drogas&Dependências decorre até sábado no Instituto Superior de Ciências Educativas. Criminólogo Jorge Quintas ajuda no balanço

Lei n.º 30/2000 ou Lei de Descriminalização do Consumo de Drogas em Portugal: mais de dez anos volvidos sobre esta legislação inédita em Portugal, e referida a nível internacional como um caso de sucesso, o balanço em causa continua a não ser consensual. Até sábado decorre no Instituto Superior de Ciências Educativas (ISCE), em Lisboa, o primeiro Congresso Internacional sobre Drogas&Dependências, realizado em parceria com o Instituto Superior de Ciências Educativas. Manuel Pinto Coelho, médico e presidente da Associação para um Portugal Livre de Drogas (APLD), sempre foi uma das vozes mais críticas e tem considerado que os resultados são deploráveis. Preside agora ao congresso, em que a tónica está na defesa de estratégias de reabilitação mais inteligentes e que contrariem a banalização do consumo, que atribui, por exemplo, ao domínio da "terapia de substituição opiácea", que transmite "a falsa sensação de que não é possível a abstinência". Exemplo de insucesso, disse o médico à Lusa, é o facto de, em Portugal e na Europa, 70% dos toxicodependentes estarem com terapia de substituição.

O i falou com o criminólogo Jorge Quintas, que será um dos oradores deste congresso e que promete uma visão alternativa à que tem sido seguida no plano nacional de combate à toxicodependência e pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências. Este docente na Escola de Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade do Porto tem vindo a estudar os impactos da lei, que começou a ser aplicada em Julho de 2001. "Ao nível dos consumos na população adulta, não houve alterações significativas", disse ao i. Na população jovem, há aumentos, mas em linha com a Europa, e a maioria começou a sentir-se antes da lei, em 95/96. "Pode sempre ser visto de muitas maneiras, mas em termos práticos não houve um aumento brutal nos consumos, mas também não houve uma redução drástica."

Para o especialista, o assunto era e continua a ser complexo. "A descriminalização não resolveu o problema da droga. Isso não é possível. Não existe nenhuma experiência disso." A dependência de metadona, diz o investigador, é um exemplo das dificuldades. "É muito difícil consumidores como os que tínhamos em Portugal tornarem-se abstinentes, talvez só em comunidades terapêuticas. Mas essa é a solução para uma minoria."

Quintas apresentará os resultados mais recentes do seu projecto de investigação no sábado. Para já, revela que há mudanças óbvias, nomeadamente na aplicação da lei: esta parece funcionar melhor que a de 2003. Os consumidores deixaram de ser punidos criminalmente, mas até aí eram poucos os casos em que havia, por exemplo, pena de prisão. Mas as sanções - que passaram a ser aplicadas por comissões para a dissuasão da toxicodependência e podem ir de coimas à proibição de sair do país ou de exercer determinadas profissões - dispararam. "Antes da descriminalização tínhamos 1500 sanções por ano e hoje são cerca de 4 mil, numa abordagem preventiva. Isto significa que o sistema está mais atento. A descriminalização permitiu um maior acompanhamento do que alguma vez se conseguiu na justiça."