in Diário de Notícias
O diretor do Observatório de Luta Contra a Pobreza na cidade de Lisboa, Sérgio Aires, diz que não se sabe quantos pobres vivem na capital portuguesa, porque, considera, "nunca houve vontade política" para calcular a pobreza a este nível territorial.
"Não conhecemos a taxa de pobreza nas cidades. Não sabemos quantos pobres há em Lisboa", disse à Lusa Sérgio Aires, defendendo que, "do ponto de vista técnico, era perfeitamente possível chegar a uma solução de cálculo, mas, do ponto de vista político, parece nunca ter havido vontade para fazê-lo, nem ao nível nacional nem europeu".
E mesmo à escala nacional, explicou, os dados sobre a pobreza "devem ser vistos apenas como indicações". Hoje, diz, "vivemos uma situação caricata". Apesar do que revelam sobre a situação social do país os dados do desemprego e os dados do acesso ao subsídio de desemprego -- a taxa é de 17,7% e as prestações de desemprego chegam apenas a 44% dos desempregados -- a taxa de risco de pobreza em Portugal está a diminuir.
"Isto acontece porque a definição oficial de pobreza mede-se tendo em consideração o rendimento mediano do país. Assim, se o rendimento mediano baixa, como vem a acontecer em Portugal, em consequência da diminuição ou estagnação dos salários, também baixa o limiar de pobreza contido na definição oficial de pobreza", explicou.
Desta forma, acrescentou, "reduz-se o número de pobres em função do empobrecimento geral do país".
De acordo com dados do Instituto da Segurança Social, entre 2006 e 2012, o número de famílias beneficiárias do Rendimento Social de Inserção (RSI) no distrito de Lisboa quase triplicou, passando de 13 mil para 31 mil.
Contudo, entre 2010 e 2012 houve uma quebra no número de famílias beneficiárias desta prestação social: de quase 37 mil em 2010, desce-se para 33 mil em 2011 e para 31 mil em 2012. Esta mudança foi acompanhada da descida do valor médio da prestação por agregado: de 239 euros em 2006, desceu para 215 euros em 2012.
No total, o número de beneficiários do RSI no distrito de Lisboa passou de 35 mil em 2006 para 80 mil em 2012, e também aqui se registou uma redução do número de beneficiários entre 2010 e 2012: de 94 mil beneficiários do RSI em Lisboa em 2010, passou-se para 85 mil em 2011 e para 80 mil em 2012.
Para Sérgio Aires, a evolução geral dos indicadores desta prestação não pode, "necessariamente, nesta conjuntura, significar menos necessidade". O sociólogo considera que esta evolução traduz, essencialmente, as mudanças nas regras de acesso à medida.
No caso das insolvências de empresas -- que também ajudam a ter uma ideia sobre a pobreza na capital -- mais do que duplicaram entre 2009 e abril de 2013, de acordo com dados sistematizados pelo Observatório de Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa.
Enquanto em 2009 houve 94 empresas no concelho de Lisboa a declararem insolvência, esse número subiu para 165 em 2012 e no final de abril de 2013 era já de 199 empresas.
Também o número de insolvências de pessoas singulares no concelho de Lisboa teve um aumento muito significativo: de 151 indivíduos a declarar insolvência em 2009, o número passou para 1275 em 2011, e foi de 2374 em 2012.
Para o sociólogo, este é um indicador económico "com uma leitura direta" em relação à pobreza: "O nosso tecido empresarial é caracterizado por muitas empresas de pequena dimensão e familiares. É óbvio que estes episódios desencadeiam pobreza", afirmou.
E às vezes, acrescentou, isso nem acontece de forma direta. "Acontece porque os pais socorrem os filhos. Porque esta 'geração à rasca' está a ser ajudada pelos pais e pelos avós, que colocam o seu bem-estar em risco para ajudar a família".