Há o que já mudou, o que está para mudar e o que tem de mudar: “Posso decidir ter um jardim ou transformar o meu closet, que até tem uma janela, num escritório, mas depois temos imigrantes que ocupam por turnos espaço no chão para dormir. É importante olhar para estes dois lados”, diz Alda Azevedo, demógrafa e investigadora, e uma das pessoas que o Expresso ouviu para perceber como a pandemia alterou a forma como encaramos as nossas casas. Há “novos empreendimentos com varandas da mesma dimensão da sala”, e haverá cada vez mais “construção em altura” para ter espaço para divisões maiores e parques junto à habitação. Tem de haver mais espaço exterior em casa e menos garagens, e as coberturas dos edifícios e os pisos térreos devem ser espaços comuns. Para que isto seja para todos ou tendencialmente para todos, e não apenas para quem pode pagar, é necessário apoio e investimento público
Nem as nossas casas estavam preparadas para a pandemia. Ora porque se revelaram demasiado pequenas, ora porque, tendo um tamanho até razoável, tinham divisões minúsculas onde mal cabia uma cama, quanto mais uma secretária para estudar ou trabalhar. Bom era ter um escritório, para as tarefas importantes mas também para descontrair, ler um livro, ouvir música ou simplesmente gozar o tédio em privado, que vale sempre a pena. Também não seria nada mal pensado ter um terraço para apanhar sol, já que não posso sair à rua, ou pelo menos uma varanda onde dê para enfiar uma cadeira.
Preocupações como estas ocuparam a cabeça das pessoas, ou de uma parte delas, durante os períodos de confinamento a que a pandemia obrigou. É pelo menos isso que mostram os vários inquéritos e estudos que foram realizados ao longo do último ano e meio, bem como as histórias e experiências pessoais partilhadas nos meios de comunicação social. Apercebemo-nos ainda mais de que as casas que temos não nos servem e houve quem tratasse de resolver logo isso, fazendo pequenas ou grandes alterações consoante o dinheiro no banco. Mas há uma dúvida: poderá haver, de facto, uma mudança nas habitações ou elas vão continuar a ser construídas e escolhidas mais ou menos como eram até aqui?
“Há novos empreendimentos em fase de projeto que já têm varandas com a mesma área da sala, em que a varanda é quase como uma extensão da área interior da sala.”
Nuno Sampaio, arquitecto e diretor executivo da Casa da Arquitectura, em Matosinhos, inclina-se, sem hesitar, para a primeira hipótese, até porque as alterações já são visíveis. “Há novos empreendimentos em fase de projeto que já têm varandas com a mesma área da sala, em que a varanda é quase como uma extensão da área interior da sala.” Foi a necessidade de estar quase permanentemente em casa que fez com que as pessoas se apercebessem da importância de ter um espaço exterior na habitação, mas não foi só nisso que repararam. “Os quartos, sendo utilizados sobretudo para dormir, costumam ter dimensões pequenas, sendo privilegiadas as salas maiores para o encontro da família, mas hoje estamos a ver que é ao contrário.” Agora, diz, querem-se quartos “com uma zona para dormir e outra onde possa ser colocada uma mesa para a criança estudar”, no caso das famílias ou pessoas com filhos. “Não dá para ter duas ou três crianças a estudar no escritório com os pais ao lado a trabalhar, como se percebeu durante a pandemia. Cada um precisa do seu espaço privado de trabalho.”
Outra transformação “grande” são as tais varandas, que “devem, efetivamente, ser áreas de permanência” — algo que, de resto, irá exigir alterações na legislação, sublinha o arquitecto. “É necessário que áreas exteriores da habitação, como são as varandas, não contem para o índice de construção.” Isto é, que não sejam consideradas áreas construídas em termos imobiliários, como acontece na maioria dos municípios. As coberturas dos edifícios “devem ser utilizadas não só para a instalação de painéis fotovoltaicos, como já acontece em alguns sítios, mas também como espaços de lazer por parte de todos os residentes da habitação”, e o mesmo ao nível do piso zero, igualmente projetado como um espaço comum. Segundo Nuno Sampaio, há outra “exigência” que será feita pelos habitantes, sobretudo os que residem nas grandes cidades: ter espaços verdes próximos de casa. “As pessoas vão querer passear o seu cão no jardim ao pé de casa, não no parque a quilómetros de distância. Querem essa proximidade, querem poder sentar-se lá fora, junto ao prédio, a fumar, a conversar. Querem que a rua funcione como um espaço de receção das próprias casas.”
Divisões maiores, varandas, terraços e outros espaços exteriores na habitação exigem mais área de construção, o que não é coisa que abunde em cidades como Lisboa e Porto, como já se sabe. É difícil não ver isto como um problema, mas Nuno Sampaio explica que começam a surgir soluções. “Hoje em dia, é mais fácil aceitar que podemos ter uma torre, isto é, construir em altura para libertar mais espaço de superfície e, simultaneamente, permitir que cada apartamento tenha uma área privada exterior. Isto está a acontecer.”
“DE REPENTE, OS CLIENTES COMEÇARAM A QUESTIONAR SE NÃO SERIA MELHOR TER DIVISÕES SEPARADAS”
No geral, todas estas mudanças estão já a acontecer, garante Filipa Namora, arquitecta e designer de interiores. “Vemos que os clientes olham para a casa de forma completamente diferente do que olhariam provavelmente há dois anos. Têm um olhar muito mais atento.” A preocupação com os espaços verdes e os espaços exteriores é “muito maior”, e a sala já não é utilizada como escritório ou como espaço para trabalhar, por exemplo. “Já não há tanto aquela coisa de ter um escritório que é muito bonito mas pode não ser útil. As pessoas olham para este espaço e já sabem de quantas gavetas e secretárias vão precisar. Pensam o ambiente em função da utilidade.”
Acordar e sair de casa também se tornou “muito importante”, o que significa que, havendo um espaço exterior na habitação, será utilizado como escritório, “quase como um anexo em que a pessoa tem privacidade e não tem o barulho de casa.” Isto, claro, se não morar num prédio. Quartos com casa de banho privada e roupeiro também são mais procurados hoje em dia, e as cozinhas, outrora ligadas à sala de estar e de jantar, sem paredes a separar estas divisões, já não parecem tão interessantes ou práticas. “De repente, os clientes começaram a questionar se seria viável manter esses espaços abertos e se não seria melhor ter divisões separadas”, considerando a necessidade que surgiu durante a pandemia de ter membros da família em isolamento, por estarem infetados com o vírus ou terem estado em contacto com alguém infetado. Mesmo nas garagens, acrescenta Filipa Namora, houve clientes “a sugerir colocar zonas de duche, para facilitar o processo de higienização”. Clientes que não moravam em prédios, claro.
Pela mesma razão, isto é, o medo do contágio pelo vírus ou a memória desse medo, houve quem pedisse “duas zonas de sala na mesma casa, cada uma com uma cozinha”. Cozinhas que, no geral, também começaram a ser vistas de outra maneira, considerando o tempo passado em casa e o encerramento dos restaurantes nas fases mais complicadas da pandemia. “As pessoas começaram a querer cozinhar mais e tivemos muitos pedidos de remodelação de cozinhas.” Durante a pandemia, explica, a atenção dos clientes esteve focada nos espaços exteriores da habitação, enquanto no pós-pandemia os pedidos têm sido, sobretudo, para “melhorar e alterar os espaços interiores, quase como uma resposta ao que as pessoas não tiveram durante o confinamento”.
Na decoração das casas também se notam alterações, seja ao nível das cores, seja ao nível do mobiliário, objetos e materiais de construção usados, que se querem “cada vez mais naturais” — ou que o pareçam pelo menos. As escolhas refletem aquilo a que Filipa Namora se refere como uma tentativa de “aproximação à natureza”. “Há uma necessidade de sentir que se está no exterior, em conexão com a natureza, mesmo não estando.” Daí os terraços, as varandas e, já agora, também as hortas - mesmo para quem morar num prédio, sublinha Filipa Namora. “Se calhar há muitas pessoas que não têm oportunidade de criar, por exemplo, um escritório no apartamento, se este for pequeno. Mas podem adquirir mais plantas ou até mudar um tapete que estava estragado. São pormenores pequeninos mas podem fazer a diferença. E aí deixamos de ter uma coisa de nicho para ter uma coisa mais vasta.”
“O ESTACIONAMENTO À SUPERFÍCIE TENDERÁ A DESAPARECER DAS CIDADES NO FUTURO”
Para Nuno Sampaio, o que também tem de ser “naturalmente repensado” é a utilização do automóvel, até porque isso terá implicações ao nível da habitação, diz. “Não faz sentido pensarmos que podemos continuar a ter um modelo de cidade onde cada um utiliza um carro.” A média de utilização do automóvel é de “1,2 pessoas por automóvel, o que é baixíssimo”. “Se as pessoas não têm espaço para uma sala maior ou uma varanda maiores, como podem ter espaço para um lugar na garagem que está quase sempre desocupado porque só guardam o carro à noite? Isto é um desperdício que não podemos ter nas habitações.”
Além disso, diz, é uma “idiotice em termos energéticos pegar num automóvel que pesa 700 kg para transportar uma pessoa que pesa 60.” Também na rua e no espaço público tem de haver uma “oferta diferenciada”, porque “as pessoas querem muito mais cafés com esplanadas, como se viu durante a pandemia”. O que significa, acrescenta, que o estacionamento à superfície é algo que “tenderá igualmente a desaparecer das cidades no futuro”. “O espaço público é um recurso tão, tão escasso, que não é possível ser ocupado por carros. São necessários passeios mais largos e espaços mais amplos, mais abertos, porque as pessoas também já não querem estar tão próximas na rua.” E as vias de circulação devem estar reservadas aos transportes públicos e “novos meios como bicicletas elétricas e veículos de uma ou duas rodas”. De resto, Nuno Sampaio não acha que nada disto seja uma novidade. “A pandemia não veio criar coisas completamente novas nem acho que o fará no futuro. A transformação já estava a acontecer, simplesmente foi acelerada.”
“AINDA É CEDO PARA PERCEBER A MAGNITUDE DAS ALTERAÇÕES NAS PREFERÊNCIAS HABITACIONAIS”
Alda Azevedo, demógrafa e investigadora no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa que tem desenvolvido estudos sobre habitação e população, concorda que poderá ter havido uma alteração das “nossas preferências” relativamente à habitação, considerando o longo período em que estivemos confinados em casa, mas considera que ainda é cedo para saber se tudo isto é para ficar. “Neste momento, ainda não sabemos se estes efeitos vão perdurar no tempo ou se vão, pelo contrário, desvanecer-se.” Ainda é cedo, acrescenta, “para perceber a magnitude das alterações nas preferências habitacionais das pessoas, isto é, se vamos ter, efetivamente, tendências alteradas, ou se há aqui um padrão que é específico de um período de crise”. “As crises têm efeitos de curto prazo e efeitos de longo prazo. E os de curto prazo não se traduzem necessariamente em alterações a longo prazo.” Também neste aspecto, o “pós-pandemia é uma incógnita”, e quase tudo depende do futuro do teletrabalho, acrescenta. “Isso será determinante para a reavaliação que temos estado a fazer no último ano e meio sobre o que preferimos, por exemplo, em termos de espaços disponíveis na habitação e as funções e características desses espaços, e do próprio mobiliário e equipamentos.”
“Neste momento, ainda não sabemos se estes efeitos vão perdurar no tempo ou se vão, pelo contrário, desvanecer-se.”
Ainda assim, há coisas que sabemos. A função da habitação, que é “garantir um abrigo em condições de segurança, conforto e privacidade”, continuará a ser “exatamente a mesma”. “Essas necessidades são bastante consensuais. É consensual a forma como hierarquizamos a localização da casa, o número de quartos disponíveis dentro da casa, e a existência ou não de escritório e espaço exterior.” Tudo isso depende da “utilização que damos e prevemos dar à casa”, mas também depende dos custos e “de quanto custam as nossas preferências”.
Entre as alterações que podem ter criado raízes, diz a também professora no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, está a relação com as pessoas com o bairro e mesmo com os vizinhos. “Começámos a viver mais à escala do bairro. Adquirimos novos hábitos, como os passeios higiénicos, que levaram a uma aproximação ao bairro, até porque também havia restrições de circulação. Esta aproximação permitiu-nos conhecer espaços públicos que não conhecíamos e valorizar o comércio local.” Algumas destas rotinas que se criaram, diz, “poderão vir a tornar-se permanentes ou substituir as anteriores”. “Nesse sentido, dificilmente as coisas vão voltar a ser como eram.”
Mas nada é assim tão linear. “Esta perspetiva aplica-se a um determinado tipo de bairro, o bairro que tem espaços públicos de que se possa desfrutar, bem como serviços e o comércio local de que precisamos no dia a dia.” E, claro, nem todos os bairros são assim, “e nem todos oferecem a mesma qualidade de vida”. “É importante fazer essa distinção”. Quantos aos vizinhos, sim, passou a haver mais “solidariedade”, e no caso de pessoas mais velhas “até passou a existir uma maior corresponsabilização pelo seu bem-estar”. “Não sei se vamos transportar isto para o futuro. Mas, e creio que não será lírico dizê-lo, se houve relações de solidariedade e até amizade que se estreitaram no contexto da pandemia, essas relações estão criadas, e não vão desaparecer completamente, nem mesmo quando voltarmos à correria do nosso quotidiano.” Se passei a saber o nome da vizinha, exemplifica a investigadora, “vou continuar a saber o seu nome e já não digo só bom dia ou boa tarde quando me cruzo com ela no hall do prédio, mas também pergunto como está e como estão os seus filhos. Custa-me crer que isto se venha a perder.”
“TALVEZ SEJA INGÉNUO ACHAR QUE HÁ NOVAS DESIGUALDADES”
Alda Azevedo fala no custo das nossas preferências habitacionais, porque “há uma diferença entre aquilo que são as nossas preferências e a capacidade financeira que temos para as podermos concretizar.” E a maioria poderá não ter essa capacidade. “Não nos podemos esquecer que a experiência de confinamento foi diferente para aqueles que não têm casa ou vivem em habitações precárias, como barracas ou casas sobrelotadas, e o mesmo acontecerá no pós-confinamento.” Para a “maioria destas pessoas”, acrescenta, “a relação com a casa e os seus residentes é distinta”, uma vez que “não estão sequer garantidas as condições para que a casa possa cumprir as tais funções de abrigo e segurança, quanto mais as de conforto e privacidade”.
“Esse é, se calhar, o lado menos sexy da relação entre pandemia e habitação, mas não pode ser esquecido”, sublinha. Ou seja, os imigrantes que trabalham em terrenos agrícolas em Odemira e vivem em habitações com condições precárias, sem espaço, têm que ver os seus problemas mitigados. “Vivemos numa sociedade muito desigual e, portanto, as prioridades e a forma como foi vivida a pandemia é diferente consoante as condições habitacionais de cada família. Posso decidir ter um jardim ou transformar o meu ‘closet’, que até tem uma janela, num escritório, mas depois temos imigrantes que ocupam por turnos espaço no chão para dormir. É importante olhar para estes dois lados.” Nem todos podem ter preferências.
Alda Azevedo fala no custo das nossas preferências habitacionais, porque “há uma diferença entre aquilo que são as nossas preferências e a capacidade financeira que temos para as podermos concretizar.” E a maioria poderá não ter essa capacidade. “Não nos podemos esquecer que a experiência de confinamento foi diferente para aqueles que não têm casa ou vivem em habitações precárias, como barracas ou casas sobrelotadas, e o mesmo acontecerá no pós-confinamento.” Para a “maioria destas pessoas”, acrescenta, “a relação com a casa e os seus residentes é distinta”, uma vez que “não estão sequer garantidas as condições para que a casa possa cumprir as tais funções de abrigo e segurança, quanto mais as de conforto e privacidade”.
“Esse é, se calhar, o lado menos sexy da relação entre pandemia e habitação, mas não pode ser esquecido”, sublinha. Ou seja, os imigrantes que trabalham em terrenos agrícolas em Odemira e vivem em habitações com condições precárias, sem espaço, têm que ver os seus problemas mitigados. “Vivemos numa sociedade muito desigual e, portanto, as prioridades e a forma como foi vivida a pandemia é diferente consoante as condições habitacionais de cada família. Posso decidir ter um jardim ou transformar o meu ‘closet’, que até tem uma janela, num escritório, mas depois temos imigrantes que ocupam por turnos espaço no chão para dormir. É importante olhar para estes dois lados.” Nem todos podem ter preferências.
Se cada um irá alterar a sua casa ou escolher uma nova consoante o dinheiro que tem, isso significa que haverá ainda mais desigualdade na habitação? Alda Azevedo não vê a questão assim. “As desigualdades que podem vir a ser acentuadas com a pandemia já existem, e vão estar mais relacionadas com a crise económica. Talvez seja ingénuo achar que há novas desigualdades.” Quem tem menos rendimentos, diz, “vai continuar a precisar de mais um quarto ou de uma solução para a humidade que têm em casa”, e que tem mais “pode realmente pensar, por exemplo, em renovar o jardim para receber mais amigos em casa”. “As desigualdades na habitação são uma consequência das desigualdades de rendimento. E são os custos da habitação que determinam as condições em que vivemos, o que tem consequências, claro, ao nível da saúde física e mental.”
Nuno Sampaio também não compra a ideia da desigualdade, mas por outras razões. “É óbvio que quem tem mais liberdade e se adapta melhor às transformações são as pessoas com mais rendimentos, mas não acho que estas transformações possam introduzir mais discrepâncias. Acredito, sinceramente, que a iniciativa pública pode corrigir algumas distorções.” Algo que, acrescenta, já estava a acontecer antes da pandemia. “A iniciativa privada, a visão completamente neoliberal que prevaleceu até há alguns anos, não resolvem, por si só, a cidade. Temos de ter uma oferta pública de arrendamento que permita diminuir as assimetrias que existem.” E teremos, visto que, para já, tudo o que temos são sobretudo promessas? “Terá de acontecer. Vão ser feitas exigências nesse sentido. A nossa exigência sobre a habitação é cada vez maior em termos de construção, quer do ponto de vista energético, quer ao nível do isolamento térmico.” Claro que estas exigências têm um preço, encarecendo os custos da habitação, mas o arquitecto não vê isso como um impedimento. “Como é que consigo regular o não aumento do preço da habitação? Se gasto mais em varandas, tenho de gastar menos em garagens.” Nesse aspecto, Alda Azevedo concorda: “a mudança pode ser transversal, dependendo do apoio público que as pessoas tiveram”.
Nuno Sampaio também não compra a ideia da desigualdade, mas por outras razões. “É óbvio que quem tem mais liberdade e se adapta melhor às transformações são as pessoas com mais rendimentos, mas não acho que estas transformações possam introduzir mais discrepâncias. Acredito, sinceramente, que a iniciativa pública pode corrigir algumas distorções.” Algo que, acrescenta, já estava a acontecer antes da pandemia. “A iniciativa privada, a visão completamente neoliberal que prevaleceu até há alguns anos, não resolvem, por si só, a cidade. Temos de ter uma oferta pública de arrendamento que permita diminuir as assimetrias que existem.” E teremos, visto que, para já, tudo o que temos são sobretudo promessas? “Terá de acontecer. Vão ser feitas exigências nesse sentido. A nossa exigência sobre a habitação é cada vez maior em termos de construção, quer do ponto de vista energético, quer ao nível do isolamento térmico.” Claro que estas exigências têm um preço, encarecendo os custos da habitação, mas o arquitecto não vê isso como um impedimento. “Como é que consigo regular o não aumento do preço da habitação? Se gasto mais em varandas, tenho de gastar menos em garagens.” Nesse aspecto, Alda Azevedo concorda: “a mudança pode ser transversal, dependendo do apoio público que as pessoas tiveram”.