31.8.21

Governo só vai mexer no 1.º e 2.º escalões do abono de família

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

A subida do abono foi apresentada como uma medida de luta contra a pobreza infantil. Beneficiará, por isso, as crianças que vivem nos agregados com os dois escalões de rendimento mais baixos.

O primeiro-ministro, António Costa, anunciou a medida no domingo, no encerramento do 23.º Congresso do PS: “Iremos alargar as medidas de combate à pobreza ao longo dos próximos dois anos a todas as crianças, independentemente da sua idade.”


O abono, destinado a compensar os encargos familiares com o sustento e educação das crianças e jovens, está organizada em quatro escalões de rendimento. O valor atribuído tem em conta o tipo de família, o tamanho da fratria, a idade das crianças.




Está no primeiro escalão quem vive numa situação de pobreza extrema, contando com um rendimento de referência igual ou inferior a 3071,67 euros por ano. No segundo escalão cabe quem está numa situação de pobreza, vivendo com 3071,67 a 6143,34 euros por ano.

Nesse primeiro escalão, o abono fica-se pelos 149,85 euros até aos 36 meses; 49,95 entre os 36 e os 72 meses e 37,46 a partir daí. No segundo escalão, o abono é de 123,69 até aos 36 meses, 41,23 entre os 36 e os 72 meses e 30,93 a partir daí.

“As crianças entre os 3 e os 6 anos que estiverem em condição de pobreza, de pobreza extrema, e que hoje só recebem entre 41 e 50 euros, nos próximos dois anos chegarão aos 100 euros”, disse Costa. “E as que têm mais de 6 anos passam dos 37 ou 31 para 50 euros.”

No seu discurso, o primeiro-ministro qualificou a pobreza infantil de “chaga inaceitável numa sociedade decente”. E assumiu o compromisso de “erradicar a pobreza infantil no país”.

“Quem está disposto a esperar cinco gerações para que as 130 mil crianças que estão ainda em situação de pobreza extrema possam estar numa família que atingiu o rendimento mediano?”, questionou. “Quem está disponível para esperar várias gerações para que as crianças em risco de pobreza, cerca de 300 mil, possam libertar-se desta situação?”

Aproveitou para lembrar as mudanças introduzidas na anterior legislatura. “Desde 2015, iniciamos uma medida de reforço significativo do abono para todas as crianças em condição de extrema pobreza ou em risco de pobreza até aos três anos. Com esta medida, saíram da situação de pobreza mais de 75 mil crianças até 2019”, afirmou. “Em 2019, após transferência 159 mil crianças deixavam estar em situação de pobreza. Se estas medidas deram certo sabemos que temos de as reforçar para erradicar a pobreza infantil”, disse ainda.

O inquérito ao rendimento das famílias, que vai sendo feito pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), mostra a evolução desse indicador. A taxa de risco de pobreza infantil atingiu um pico em 2013 (25,6%) e desde então baixou progressivamente até 2018: 24,8%, 22,4%, 20,7%, 19,0%, 18,9%. Em 2019, situou-se nos 19.1%, bem acima da taxa geral (16,2).

A presença das crianças num agregado familiar representa um risco de pobreza acrescido, sobretudo nas famílias monoparentais (25,5%) ou numerosas (39,8%). Em 2019, o risco de pobreza para os agregados sem crianças dependentes era 15,4% e dos agregados com crianças dependentes 17,0%.

Os últimos dados do Instituto de Segurança Social, referentes ao mês de Julho, apontam para 1.087.199 crianças titulares de abono. Eram 534.442 raparigas e 552.757 rapazes. Entre estes, 91.328 com bonificação por deficiência. Entre estes, 12.141 com subsídio para educação especial.

Os dados mensais não permitem perceber quantas crianças pertencem aos dois primeiros escalões, mas a Segurança Social confirma que rondam meio milhão. As outras estão no terceiro (97,31 euros até aos três anos, 32,44 entre os três e os seis, 28 a partir daí) e no quarto escalão (58,39 nos primeiros três anos, 19,46 entre os três e os seis e zero a partir daí).

Em qualquer escalão há uma majoração para famílias monoparentais. E outra para famílias numerosas.

Esta medida é complementada com uma dedução fiscal de 900 euros para todas as famílias com crianças até seis anos. E uma garantia fiscal de 600 euros a partir do segundo filho para as que não ganham o suficiente para pagar IRS.