in Público on-line
Estão a aumentar as queixas de assédio e pressões psicológicas feitas por empresas de recuperação de crédito, denuncia a Deco, a associação de defesa dos consumidores. Há pessoas que chegam a despedir-se dos seus empregos. É preciso regulamentar o sector, diz a Deco. A Associação Portuguesa de Empresas de Recuperação de Crédito (APERC) confirma que tem recebido queixas.
“As pessoas queixam-se que lhes telefonam para o local de trabalho, para os superiores hierárquicos, para familiares, vizinhos. É uma pressão constante. As pessoas sabem que estão em incumprimento o que as deixa debilitadas, vulneráveis”, conta Natália Nunes, do gabinete de apoio ao sobre-endividado da Deco.
Muitas das queixas contra empresas de recuperação de crédito ultrapassam tudo o que é “admissível do ponto de vista legal e ético”, acrescenta, adiantando que em média recebe oito reclamações por dia, mas que o número já chegou às 30.
Segundo dados da associação, entre Janeiro e Outubro foram recebidas 83 reclamações escritas relativas a cobranças agressivas, sendo que um em cada cinco sobre-endividados foram abordados no local de trabalho.
Os números indicam também que 10,8% dos contactos para efectuar cobrança foram feitos a terceiros (como familiares ou vizinhos), enquanto 68,7% foram contactados diretamente.
A quase totalidade (98%) dos créditos em dívida que levam a estas situações foram feitos junto de entidades de crédito, sendo apenas 2% respeitantes a contratos realizados com instituições bancárias.
No que diz respeito ao tipo de crédito contratado e que deu origem à cobrança, quase dois terços (61,4%) diz respeito a crédito pessoal, um terço (34,9%) a cartão de crédito, 2,4% a contrato automóvel e 1,2% a crédito à habitação.
O problema é potenciado pelas dificuldades económicas que impedem as pessoas de pagar as suas dívidas, mas é, segundo Natália Nunes, uma situação antiga.
“O problema é que não há uma legislação sobre esta área. Temos a APERC que é a única no setor, mas em bom rigor não há um regime jurídico aplicável a este sector”, salienta.
De acordo com Natália Nunes, a APERC defende, à semelhança da Deco, uma regulamentação urgente para as empresas de recuperação de crédito porque com o agravamento da crise e o aumento do crédito malparado há cada vez mais empresas do género a surgir no mercado.
Uma necessidade que a Deco diz ter mesmo chamado a atenção da troika no Verão passado, mas que ficou sem resposta até agora.
Natália Nunes garante que a Deco tem dado a conhecer estas situações ao Banco de Portugal, mas aconselha as pessoas a apresentar uma queixa-crime às autoridades em situações extremas.
Existem cerca de 60 empresas de recuperação de crédito
António Gaspar, presidente da Associação de Empresas de Recuperação de Crédito (APERC) confirma que tem recebido muitas queixas de pessoas que se dizem perseguidas por elementos de entidades do sector, mas afasta que essa prática seja generalizada.
O responsável reconhece que existem cada vez mais empresas de recuperação de crédito que dão má imagem ao sector, alertando para a necessidade urgente de uma regulamentação. “Na sociedade portuguesa, tudo o que é mau espalha-se a uma velocidade vertiginosa. As pessoas e a sociedade no seu todo olham só para o que está mal. É verdade que existem empresas no mercado que ameaçam de forma velada ou não os cidadãos e que usam um diálogo e um modus operandi que nós não aceitamos”, revela.
Segundo António Gaspar existem empresas de recuperação de crédito que são “marginais”, na sua maioria unipessoais (cujo dono é só um e um familiar), que actuam numa franja de mercado específica e que não têm regras nem códigos de ética.
“As empresas que usam as más práticas acabam por ser conhecidas negativamente e dão ao setor uma imagem que não é a melhor. Nós [actualmente existem 29 associados da APERC] consideramos que prestamos um serviço de excelência e cumprimos um código ético e deontológico”, disse.