23.7.21

Aldeia das Tipuanas. Toda a liberdade que um lar tradicional não dá

Liliana Carona, in RR

Dezoito idosos vivem de forma completamente autónoma, com apoio de retaguarda, na Aldeia das Tipuanas, um projeto social e inclusivo da Associação “Os Pioneiros” de Mourisca do Vouga, concelho de Águeda. Em vésperas de se assinalar o primeiro Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, a Renascença foi conhecer um projeto diferente.
À entrada da Aldeia das Tipuanas, uma árvore de crescimento rápido dos climas tropicais que deu nome àquele lugar de liberdade e de idosos independentes, dentro das limitações de cada um.

Para Silvério Miranda, de 62 anos, o sabor da liberdade é feito de pequenas coisas, como poder ouvir música alto e bom som. É ele também o responsável pelos moinhos que abundam no local, feitos de embalagens que iriam para o lixo. “Até ver não tenho razão de queixa, tenho sempre o rádio ligado até às 4h00 da manhã”, diz com um sorriso estampado no rosto.

O projeto das casinhas autónomas, desenvolvido pela Associação “Os Pioneiros”, surgiu há cerca de oito anos. Alexandra Alves, 48 anos, é a diretora técnica da associação fundada em 1986 e que presta apoio à terceira idade com um centro de convívio, centro de dia, serviço de apoio domiciliário, lar e a aldeia sénior (casinhas autónomas).

“Parece uma aldeia em ponto pequenino, onde se criam todas as dinâmicas de uma aldeia normal, as redes de vizinhança”, diz Alexandra Alves, enquanto aponta para as dez moradias, todas ocupadas e com lista de espera.

“Há muita procura porque, cada vez mais, a saída dos mais novos para o litoral deixa as zonas interiores vazias e as pessoas de idade, mas com alguma autonomia e com capacidade de decidir sobre o seu dia a dia, começam a sofrer de solidão e aqui estão autónomas, mas têm um apoio de retaguarda”, observa a diretora técnica.

“Como vimos, um utente vai de chave na mão, vai sair de carro. Tem autonomia para decidir o seu dia a e a sua rotina, mas contam com uma estrutura de retaguarda, enquanto que nos lares que nós conhecemos não estariam integrados, os nossos lares, são cada vez mais uma estrutura muito semelhante a uma unidade de cuidados paliativos, continuados”, lamenta a responsável.

Preços variam conforme os rendimentos

A resposta das casinhas não tem qualquer tipo de acordo com a Segurança Social, funciona unicamente às custas da associação, onde, sublinha Alexandra Alves, “calculam-se as rendas das casas em função dos rendimentos das pessoas que para cá vêm, de forma a ser uma aldeia inclusiva, com preços que rondam entre os 120 e os 800 euros, dependendo se querem partilhar casa ou não. Pode estar um casal, duas mulheres ou só uma pessoa”, explica.

Henrique Almeida, 81 anos, vai sair de carro. Desde o dia 15 de janeiro que o antigo operário fabril vive na Aldeia das Tipuanas.

“Para já, este é dos melhores lares que há, acho que não há outro igual”, comenta. Independentes, mas com apoio de retaguarda. Susana Tomás, 43 anos, técnica de serviço social e coordenadora das casinhas autónomas, não perde de vista os 18 utentes.

“Alguns precisam de apoio na alimentação, na higiene da casa, na própria higiene, eles contratualizam o tipo de serviço que precisam, o tratamento da roupa por exemplo, há senhoras que querem tratar da roupa delas, ou fazer a própria comida”, esclarece Susana, acrescentando que o projeto “é uma continuidade da sua anterior casa, permite-lhes fazer uma transferência de uma forma suave”, defende.

Ali, numa espécie de pequena aldeia, não falta piscina nem jardins verdejantes. António Alves, um soldador metalúrgico de 82 anos, encontrou há oito anos o ambiente perfeito para dar asas à criatividade.

“Faço quadros para pendurar na parede, com cápsulas de café, cortiça, tenho mais de 500 feitos e também crucifixos, tenho os trabalhos todos no tablet”, mostra, enaltecendo o apoio prestado na aldeia.

“Faz de conta que estamos em nossa casa, estamos completamente independentes. Toda a liberdade, quando preciso de alguma coisa, peço, desde cortiça, bogalhos, arame”, conclui António, na varanda de uma casinha ladrilhada, a trabalhar em mais uma peça de arte.

Na casinha ao lado está a vizinha Georgina Bastos, 78 anos. A costureira tem saudades de casa, mas sabe que ali tem todo o apoio de que precisa.

“O meu filho não me deixa estar sozinha em casa, diz que é perigoso, mas esta casa é limpinha, praticamente nova, e temos de nos adaptar. É jeitosinha pronto, tem o lavatório, casa de banho completa, temos o que é indispensável para viver”, considera Georgina.

Os preços por casinha rondam entre os 120 e os 800 euros, conforme o rendimento dos moradores, mas com a garantia de terem uma casa portuguesa e com ginástica ao ar livre, ao som da Amália Rodrigues.